Lêini discursa na Rússia
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Redação

Na data em que Lênin completaria 137 anos, publicamos este artigo que resume a vida do principal dirigente da Revolução Russa. Uma vida dedicada à revolução socialista e mundial.

Vladimir Ilich Ulianov nasceu em 22 de abril de 1870 e faleceu em 21 de janeiro de 1924. Lênin fazia parte de toda uma geração de jovens russos e europeus do final do século XIX que dedicaram sua vida à revolução socialista. Por sua devoção militante à vitória do proletariado conjugada com uma excepcional formação teórica marxista e visão estratégica, viria a cumprir um papel decisivo nos principais embates políticos que marcariam a história do início do século XX.

Lênin era filho de uma família pequeno-burguesa da província de Simbrinski. Seu irmão mais velho, Alexander Ulianov, então com 21 anos (1887), estava entre os quinze jovens acusados criminalmente por participarem de uma conspiração para assassinar o czar Alexander III e por ser flagrado com uma dinamite dentro de um dicionário de medicina, junto com mais quatro estudantes, foi sentenciado à pena de morte. Sua irmã Ana também foi condenada à prisão domiciliar por ter sido acusada de participação secundária na conspiração.

Até o final dos anos de 1880 as ações exemplaristas de terror patrocinadas principalmente pelo grupo “Vontade do Povo”, visando derrotar a monarquia, eram vistas como heróicas. Este grupo que havia conseguido assassinar o czar Alexandre II e tinha como lema “Um Alexandre após o outro”, estava praticamente desbaratado.

Eram tempos de crise e repressão. As dificuldades de sobrevivência no campo forçavam uma maior migração para as cidades. O proletariado crescia e começava a realizar lutas. Os círculos marxistas se multiplicavam de forma descoordenada em várias cidades do país, com destaque para Petrogrado, e havia efervescência política nas Universidades.

George Plekhanov, que era uma das principais figuras intelectuais da social-democracia russa e dirigente de um desses pequenos grupos marxistas chamado “Grupo da Emancipação do Trabalho”, fundado em 1883, foi decisivo para formação de Lênin. Plekhanov foi a principal referência para Vladimir até o II Congresso do Partido Operário Social Democrata Russo-POSDR onde surgiram duas correntes devido às divergências sobre a concepção de partido: os bolcheviques, dirigidos por Lênin e os mencheviques, dirigidos por Plekhanov e Martov.

Lênin participou do grupo “União e Luta pela Emancipação da Classe Operária” de Petrogrado e militou ativamente junto com Martov não mais somente dos círculos de leitura, mas atuou junto a fábricas operárias importantes em protestos e greves. Por tais atividades foi preso, julgado e deportado para Sibéria. Nesta época também conheceu a professora e também militante Nádia Krupskaia que viria a ser sua companheira de vida.

O jornal e a concepção de partido
Na prisão, escreveu “O Desenvolvimento do Capitalismo na Rússia”, obra considerada um clássico da economia, indica a ascensão do capitalismo no país e a necessidade de se apoiar na classe operária para derrotar a monarquia, em oposição aos populistas, que pregavam a supremacia das comunas rurais como via para se alcançar o socialismo.

O Partido Operário Social Democrata Russo-POSDR, depois de várias tentativas foi finalmente fundado em 1898, em um congresso com apenas nove delegados, mas teve dias depois oito dos delegados e a direção presos pela repressão. De fato até a realização do II Congresso, o partido ainda não existia, o Primeiro Congresso havia votado a edição de um jornal como uma das tarefas prioritárias, mas a resolução passou dois anos sem ser cumprida. A militância de Lênin neste período teve como propósito central a unificação dos grupos marxistas em um só partido e para isso via como instrumento principal a edição do jornal que pudesse coordenar as atividades dos revolucionários.

Quando saiu da prisão Vladimir dedicou-se a organizar o clandestino Iskra (A Centelha) e viajou ao exterior para viabilizar essa difícil tarefa. Depois de passar por várias cidades e coordenar uma rede de correspondentes e colaboradores financeiros simpatizantes, junto com outros dirigentes exilados, entre eles estavam Martov, Vera Zasulich e depois, o mais jovem deles Leon Bronstein. O periódico distribuído pelas redes clandestinas de militantes, teve importante repercussão na Rússia, logo viria a ser o principal organizador das polêmicas para a realização do II Congresso do POSDR.

Os iskristas fizeram maioria neste histórico congresso, mas entre eles haviam divergências que com o tempo iriam crescer cada vez mais. As posições de Lênin expressas em seu texto “Que Fazer?” versavam principalmente sobre a concepção do partido, defendia um partido de novo tipo, com militantes profissionais centralizados pela organização. Um partido para a tomada do poder político pela via da insurreição que deveria ter nos seus estatutos não somente a adesão programática, mas o critério da contribuição financeira e da participação regular em alguma organização do partido para discutir e centralizar a atividade militante.

As teses leninistas que foram aprovadas no Congresso por uma pequena maioria, ficaram conhecidas como bolcheviques e as posições derrotadas dirigidas pelos principais e mais antigos dirigentes, entre eles Plekhanov e Martov, com o apoio de Trotsky, ficaram conhecidas como mencheviques. Lênin é eleito para o conselho de redação, que na prática seria a direção do partido, mas aí fica em minoria e logo depois renuncia e se dedica a construir sua própria fração com a fundação de outro jornal, apoiado por Máximo Gorki, o periódico Avante.

A primeira insurreição e os realinhamentos da Social Democracia
Diante do aumento do desemprego, das greves, das revoltas camponesas, ocorre em janeiro de 1905, somente em janeiro deste ano acontecem mais greves que em toda a década passada. Uma marcha, rumo ao palácio imperial, reivindicando pão com a participação de 140 mil pessoas, que foi organizada pelo padre Gapon é massacrada. Em Abril, ocorre em Londres o 3º Congresso do POSDR, onde os bolcheviques são maioria e Lênin é eleito presidente do Congresso.

Há um debate mais estratégico no 3º Congresso sobre o caráter da revolução e o papel das classes sociais. Vladimir sistematiza suas posições em “Duas Táticas da Social Democracia na Revolução Democrática” cujo rol estratégico e independente é conferido ao proletariado em aliança prioritária com o campesinato na revolução que teria um caráter democrático-burguesa. Em junho a acontece a famosa insurreição dos marinheiros do encouraçado Potenkin. Em dezembro, a insurreição é esmagada com assassinatos e prisões, há uma resistência heróica e armada do proletariado principalmente em Petrogrado e Moscou, mas não consegue derrotar as forças da repressão.

Em 1906 os bolcheviques já contam com aproximadamente 13 mil militantes. Em abril deste ano ocorre o 4º Congresso do partido e os mencheviques fazem maioria e as duas frações são reunificadas num mesmo Comitê Central juntamente com outros grupos socialistas. O partido participa de forma unificada das eleições da Duma, o parlamento controlado pelo Czar. Abre-se um período de refluxo com o decréscimo das greves ano a ano até 1910. Em maio de 1907, realiza-se o 5º Congresso em Londres, os bolcheviques já contam com 46 mil filiados, mas entre os velhos quadros, novamente exílios, deportações e clandestinidade. Lênin publica em 1909, “Materialismo e Empiriocriticismo” onde aborda a relação entre filosofia e política.

Entre 1907 e 1910, produto do período de refluxo do movimento operário, ocorre deserções, desorganizações, dispersões, cresce o fracionamento interno do POSDR, e dentro das próprias correntes ocorrem realinhamentos, divergências, rupturas e infiltrações de agentes secretos da polícia secreta do Czar. Em janeiro de 1912, diante da crise do partido, Lênin convoca sob sua direção uma conferência e a proclama como o verdadeiro partido, elegendo uma direção majoritariamente bolchevique e de mencheviques aliados.

O internacionalismo
A II Internacional agia como mediadora dos conflitos internos dos socialistas russos e sempre buscava a unificação do partido, mas em 1914, o próprio Congresso Internacional não se realizou. A Internacional se desmoronou produto da deflagração da I Guerra e da capitulação dos principais partidos e a esmagadora maioria dos antigos dirigentes internacionais ao apoiarem suas respectivas burguesias nacionais no conflito bélico, proclamando a defesa da pátria.

O deflagrar da Guerra e a rendição da velha geração social-democrata da II Internacional, herdeira mais próxima de Marx e Engels, provoca uma reorganização internacional das organizações e partidos socialistas. Lênin desenvolve aqui também um papel chave para enfrentar aos seus velhos dirigentes como Plekhanov e Kautsky, denunciá-los como traidores chauvinistas e realizar uma campanha internacional para transformar a Guerra Imperialista em Guerra Revolucionária contra as burguesias nacionais.

Em setembro de 1915, em Zimmerwald, na Suíça, reúne-se numa Conferência Internacional, 38 delegados de 11 países para organizar uma alternativa diante da falência da II Internacional. Essa reunião, da qual participaram Martov e Trotsky, conhecida como Conferência de Zimmerwald, lançou um Manifesto aos trabalhadores do mundo convocando a luta revolucionária contra as burguesias e a fraternidade entre os irmãos de classe.

Em 1916, Lênin publica “O Imperialismo, fase superior do capitalismo”, uma das mais populares contribuições de Lênin à teoria marxista, essa obra foi produto de uma minuciosa pesquisa e também tinha como objetivo organizar a luta política contra os líderes da II Internacional demonstrando que à decadência do capitalismo à escala mundial somente poderia ser respondida com a revolução socialista internacional.

Mas a batalha de Lênin pelo internacionalismo proletário não se encerra aí, depois de tomar o poder na Rússia Soviética assume como principal tarefa não somente defender a Revolução, mas expandi-la como parte dessa luta. Os bolcheviques compreendem a Revolução Russa desde o princípio como parte da Revolução Européia e mundial. Para tal, era necessário uma organização que respondesse à tarefa, e assim foi fundada, em 1919, a III Internacional ou Internacional Comunista da qual Vladimir faria parte de sua direção.

A luta pelo poder
Em fevereiro de 1917, a Revolução Russa inicia sua segunda fase, o Czar é deposto, reconstroem-se os sovietes e forma-se um governo provisório. As massas operárias e camponesas vitoriosas com a insurreição semi-espotânea, com o apoio de contingentes de soldados esperam a paz, querem terra e superar a fome que assola o país. O governo provisório com o apoio direto dos mencheviques e dos socialistas revolucionários, também respira com a então linha conciliadora dos bolcheviques.

Lênin desde o exterior se enfurece com a linha de não enfrentar o Governo Provisório, que tem o populista Kerensky à cabeça e não toma nenhuma das medidas reivindicadas pelos trabalhadores, soldados e camponeses. Consegue chegar a Petrogrado no final de março, com as “Teses de Abril” abre uma polêmica para mudar os rumos do partido e mais uma vez empenha toda a sua autoridade para ganhar a luta política que seria a decisiva de toda sua vida, a luta para que os trabalhadores tomassem o poder e construíssem a revolução. Daí se desenvolve a bandeira de “Todo o poder aos Sovietes”.

Entre abril e outubro desenvolve-se uma longa jornada de enfrentamentos políticos internos e nas organizações operárias. Trotsky volta também do exílio e assume a direção do Soviete de Petrogrado. Desde maio, por ter acordo em toda a estratégia de luta pelo poder, assumida pelos bolcheviques, a organização Interdistrital da qual faz parte desenvolve um processo de fusão com os bolcheviques. Em julho, ocorre o VI Congresso, denominado Congresso de Unificação, representando 170 mil militantes. A influência dos bolcheviques vai crescendo cada vez mais nos sovietes. Neste período, derrota-se a tentativa do golpe direitista do general Kornilov. Lênin vai para o exílio mais uma vez por medida de segurança, já que o governo provisório acusa-o de agente do governo alemão. Neste período escreve “O Estado e a Revolução”, em que polemiza com os anarquistas e os reformistas os desafios da construção do Estado proletário diante da revolução e da existência do aparato estatal da burguesia.

Após a luta interna para que o partido bolchevique assumisse a luta contra o governo provisório, Lênin desenvolve a partir de setembro outra luta interna para que se prepare a tomada do poder em seus aspectos políticos e militares. Após duras polêmicas e crises internas Lênin ganha o debate e a direção do partido começa os preparativos para o assalto ao poder. No dia 25 de outubro começa a seção do Congresso dos Sovietes de toda a Rússia com 650 delegados e aí se vota, com o apoio dos socialistas revolucionários de esquerda, o Poder dos Sovietes. Neste período vários pontos estratégicos da cidade já haviam sido tomados, entre eles o Palácio de Inverno. Para o novo Comitê Executivo do II Congresso dos Sovietes foi eleito entre os bolcheviques Lênin, Trotsky, Zinoviev, Kamenev, Ríkov, Noguín, Kolontai, Riazanóv, Lunacharsky, Murálov, Stutchka, Antonov-Ovseienko, Krilenko e Sklinansky.

A partir deste dia se inicia uma nova fase da revolução, com novos desafios e enfrentamentos contra a burguesia nacional, as correntes operárias nacionais e internacionais que se opõem à revolução, as diversas frações internas do partido, contra o imperialismo e seus 14 exércitos, e além de tudo os problemas internos do país que serão gerados com a crise econômica, a guerra civil e a derrota da revolução na Europa.

Lênin morreu aos 54 anos, debilitado fisicamente também devido aos atentados terroristas que sofreu. Antes de falecer fez os seus últimos discursos no dia 31 de outubro no Comitê Executivo dos Sovietes e no 4º Congresso da Internacional Comunista, em 19 de novembro de 1923. Lênin antes de falecer não pode travar sua última batalha, a luta contra a burocratização do Estado Soviético, proposição que fizera a Trotsky, já que havia percebido as deformações burocráticas de uma nova camada social que estava se apossando do Estado e governando-o em proveito próprio e cujo principal representante era Josef Stalin.

PARA SABER MAIS SOBRE LÊNIN:
BANDEIRA, Moniz. Lênin: vida e obra. Paz e Terra.

BROUE, Pierre. El Partido Bolchevique. Editora José Luis e Rosa Sundermann.

GENRO, Tarso Fernando.Lênin: coração e mente. Expressão Popular.

SERVICE, Robert. Lênin: a biografia definitiva. DIFEL.

TROTSKY, Leon. A vida de Lênin (Sua juventude). Global Editora.