Depois de muito tempo adormecido, ele finalmente despertou. O movimento estudantil entra novamente em cena e polariza a conjuntura nacional com ações radicalizadas e livres das amarras da UNE governista

Desde o início do ano, as mobilizações por assistência estudantil nas universidades federais e na Unicamp, além da retomada da luta pelo passe-livre no Rio de Janeiro, já apontavam a dinâmica da nova realidade que viria. Era inevitável que cedo ou tarde os estudantes brasileiros, mesmo que de forma inicial, percorressem o mesmo caminho dos seus colegas chilenos, mexicanos e franceses e partissem para a ofensiva.

Houve a poderosa campanha publicitária do Ministério da Educação em torno de suas políticas sociais de caráter populista, como o ProUni, e o alarde da expansão do ensino superior através do famigerado ensino à distância. Tanta propaganda não foi suficiente para acobertar o estado de penúria e sucateamento das instituições de ensino superior.

Dias de luta
No momento em que fechávamos esta edição, a ocupação na maior universidade pública do país já durava mais de 40 dias. A USP teve sua rotina acadêmica interrompida e substituída por uma cultura de resistência, em que a livre produção de conhecimento se expressa nas assembléias, plenárias, apresentações de teatro e recitais de poesia. Na direção da mobilização se destacam ativistas independentes, militantes da Conlute, do PSTU e do PSOL.

A profundidade do processo conseguiu colocar o atual governador e ex-presidente da UNE, José Serra (PSDB), contra a parede. Ocorreu a partir de então uma onda de mobilizações por todo o país.

Referência nacional
Na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), estudantes e trabalhadores rurais sem terra também ocuparam a reitoria e conquistaram a construção de uma escola técnica agrícola com cotas de 50% para os movimentos sociais do campo, ampliação do restaurante universitário, creche gratuita para os filhos dos estudantes, entre outras vitórias.

As universidades federais do Rio Grande do Sul, Maranhão, Pará, Santa Maria e Mato Grosso também apostaram na radicalização para reivindicar suas demandas locais e prestar solidariedade ao movimento da USP.

A manobra da UNE
Com o objetivo de tomar para si a visibilidade conquistada pelo movimento independente, a UNE marcou para 6 de junho um dia nacional de ocupação de reitorias para exigir a criação de um “plano nacional de assistência estudantil”, defender a “autonomia universitária” e exigir o investimento de “10% do PIB em educação”.
O tiro saiu pela culatra. Apesar do esforço e investimento do Planalto para assegurar a representatividade da UNE perante os estudantes, o dia foi um fiasco. Mesmo utilizando bandeiras históricas, a UNE foi incapaz de mover sequer sua própria militância.

Não dá mais para esconder que a privatização dos restaurantes universitários e o estado de penúria das moradias estudantis são causados pelos sucessivos cortes do orçamento da educação, que já ultrapassam mais de R$ 1 bilhão durante o governo Lula. Não dá para negar que a autonomia universitária é totalmente comprometida com o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), defendido pela UNE. Por fim, nem mesmo o PCdoB pode acreditar que o investimento de 10% do PIB em educação é possível sem deixar de pagar a dívida externa. Ou seja, as bandeiras históricas não podem mais ser empunhadas pelos governistas. Em suas mãos cabe somente sua aliança de casamento com o governo Lula.

O governismo desesperado da UNE é conhecido por todos e se choca com os estudantes em luta. Gustavo Petta, apelidado carinhosamente de “Pettinha” por Lula, foi literalmente expulso pelos estudantes da UFAL, ao tentar negociar nos bastidores com a reitoria a retirada dos ocupantes.

O questionamento da UNE ganhou proporções nunca antes vistas. Não foi à toa que o Encontro das Universidades Estaduais Paulistas, ocorrido no mesmo dia 6 de junho e que contou com a participação de mais de 700 estudantes de todo o estado, aprovou por esmagadora maioria que a “UNE não fala em nome dos estudantes em luta”.
Como se não bastasse, o site da UNE exibiu uma falsificação escandalosa, tipicamente stalinista, afirmando que o dia 6 teria sido um sucesso.

Seguir na luta
Uma semana nacional de ocupação de reitorias em defesa da universidade pública, de 11 a 15 de junho, foi proposta pela Conlute e aprovada pelo Fórum das Executivas e Federações de Curso (FENEX) e pela Frente de Luta Contra a Reforma Universitária. O objetivo é levar para o restante do país o exemplo da ocupação da USP e cercá-la de solidariedade.

Dando prosseguimento ao calendário, a assembléia da USP convocou uma plenária nacional para o dia 16 de junho. A data também foi aprovada pelo Encontro das Universidades Estaduais Paulistas e conta com a adesão de centenas de entidades e coletivos estudantis.

Apesar da proximidade das férias, o cenário para o segundo semestre é ainda mais promissor. Já são 43 universidades federais com os servidores técnico-administrativos parados, contra a restrição ao direito de greve, pela incorporação das gratificações, pela paridade entre ativos e aposentados e contra a transformação dos hospitais universitários em fundações estatais.

O recado foi dado pela ocupação da USP: quanto maiores forem os ataques dos governos estaduais e federal, maior será a resposta do movimento estudantil. Está decretada a guerra contra os inimigos da educação!

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