Temporada de balanços mostra redução do lucro dos bancos e bolsas de todo o mundo despencam. Capital especulativo abandona o BrasilCrescem cada vez mais os sinais de uma recessão na maior economia do planeta. O ano de 2008 começou com o temor de que a desaceleração da economia norte-americana se precipitasse em uma recessão já neste ano. O desemprego nos Estados Unidos atingiu 5% em dezembro do ano passado, a maior taxa em dois anos. A alta do petróleo, a inflação e a queda no consumo formam o quadro geral do país, desmentindo os analistas que viam somente uma crise financeira pontual no mercado de crédito imobiliário “subprime”.

Após uma série de revisões, o governo norte-americano estima para 2008 um crescimento de apenas 2,7% do PIB. Já o Banco Mundial prevê 2,2% e a estimativa do banco Goldman Sachs é ainda mais realista. Para o banco, o crescimento deve se limitar a 0,8%, sendo negativo no 2º e 3º trimestre do ano. Para os EUA, dois trimestres consecutivos de crescimento negativo já caracterizam uma recessão.

A avalanche de dados negativos já superou a discussão se haverá ou não uma recessão na economia do império. Discute-se agora quando ela chegará, se é que já não chegou. “A economia está á beira da recessão, se já não fomos engolidos por uma”, afirmou o economista Mark Zandi, da agência Moody´s, ao jornal New York Times.

Prejuízos
A expectativa de recessão se agrava ainda mais com a rodada de anúncios dos resultados das principais instituições financeiras do planeta. O Citibank divulgou no último dia 15 um prejuízo de US$ 9,3 bilhões no quarto trimestre de 2007, o primeiro resultado negativo do banco criado em 1998. O grupo que controla o banco, o Citigroup, estuda uma reestruturação para conter a crise, impondo medidas como a demissão imediata de 4 mil funcionários. Além disso, o banco recorre a investimentos de Abu Dhabi, Kuait, Coréia do Sul e Cingapura para se segurar.

O anúncio do rombo derrubou as bolsas do mundo inteiro, preparando o coração dos investidores para a divulgação dos próximos resultados financeiros dos grandes bancos. E eles prometem não ficar atrás. O banco Merril Linch divulgou no dia 17 um prejuízo de US$ 8,6 bilhões, referente ao quarto trimestre do ano passado. O valor é praticamente o mesmo do lucro da instituição do mesmo período do ano anterior. A instituição, assim como o Citigroup, tenta se ancorar em investimentos da Coréia e do Japão.

Como se esse cenário já não fosse ruim o suficiente para o mercado financeiro, o próprio FMI avalia que os prejuízos são bem maiores que os anunciados. Para o fundo, os bancos maquiam suas contas a fim de esconder ou amenizar os rombos. O presidente do FED (Federal Reserve), o Banco Central dos EUA, Ben Bernanke, estuda mais um pacote de “estímulos financeiros” para conter a crise. Porém, apesar dos principais bancos centrais terem injetado bilhões nos bancos desde o início da turbulência financeira, a crise não se debela.

A farsa do “crescimento sustentável” do Brasil
Ao contrário do que apregoam os representantes do governo, o Brasil não será uma ilha de prosperidade em meio à recessão norte-americana. Com uma economia dependente e atrelada aos interesses do mercado internacional, o país sentirá os efeitos da crise.

De acordo com o discurso do governo, o Brasil não só não seria prejudicado, como se tornaria uma espécie de refúgio para os investidores internacionais. No entanto, o que se viu nesses primeiros dias do ano foi justamente o contrário. Só nas duas primeiras semanas de 2008, o país teve um déficit de US$ 2,1 bilhões no balanço de pagamentos, ou seja, saíram mais de US$ 2 bilhões do que entraram só em 15 dias.

Só na Bolsa de Valores de São Paulo, a Bovespa, a debandada de investidores representou uma saída de cerca de R$ 1,88 bilhão do país só nestes dias. Ou seja, depois de anos de uma ortodoxa política neoliberal e o indicativo do governo de que essa política só tende a se aprofundar, vide a manutenção da meta de superávit primário (economia para pagar os juros da dívida pública), o Brasil revela-se mais vulnerável que nunca.

Além disso, a balança comercial do país (a diferença de tudo o que o país vende do que compra) depende da exportação de produtos primários, as chamadas commodities, como produtos agrícolas e minérios. Com a recessão norte-americana, a procura por esses produtos despencará.

Outra teoria dá conta que o bloco emergente, o Bric (Brasil, Índia e China), substituiria o papel desempenhado hoje pelos EUA, impulsionando o crescimento da economia mundial. No entanto, essa versão desconsidera que tais países servem hoje apenas como apêndices da economia norte-americana, constituindo a China e a Índia uma gigantesca reserva de mão-do-obra barata para as multinacionais e plataforma de exportação para o mercado norte-americano.

Envio de capital
Não é só pela fuga de investidores que a crise afeta o Brasil. Um exemplo ocorreu em dezembro, quando a General Motors do país reduziu seu capital em R$ 469 milhões, enviando o dinheiro à matriz para tapar o rombo provocado pela queda de vendas da empresa nos EUA. O vice-presidente mundial da GM, Go Andersson, visitou o Brasil em dezembro para, em suas próprias palavras, “agradecer o esforço dos fornecedores no crescimento da empresa”. Ou seja, o lucro da multinacional arrancado através da exploração de trabalhadores brasileiros vai cobrir os prejuízos da empresa no mercado norte-americano.

Tal tendência deve se aprofundar quando a recessão atingir em cheio o conjunto dos setores da economia, ampliando a pressão para a aceleração das reformas pelo governo Lula, como a trabalhista e a previdenciária.

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