Bernardo Cerdeira, de São Paulo (SP)

A esquerda governista afirma que há um golpe institucional em curso, articulado pela maioria do Congresso, do Judiciário, da Polícia Federal e dos meios de comunicação. Por isso, se mobilizou em torno de slogans como “Não vai ter golpe!” e “Em defesa da democracia” que, de fato, se resumiam num só: “Fica Dilma!”. Quase toda a esquerda brasileira se alinhou neste campo, com poucas exceções, entre as quais está o PSTU. Nosso partido afirma que, pelo contrário, há dois campos burgueses em luta, ambos utilizando os métodos sujos dessa corrupta democracia burguesa.

Basta ver quais foram os métodos de luta do governo e do PT para tentar evitar o tal golpe: a utilização da máquina estatal para distribuição de ministérios, cargos e todo o tipo de favores. A principal política do campo governista para enfrentar um suposto golpe foi, e continua sendo, a de utilizar os métodos de corrupção do Estado burguês. A mobilização foi diminuindo e sendo colocada em segundo plano. Greve geral? Enfrentar os golpistas parando o país? Nem pensar, dizem Lula e Dilma.

Contudo, a prova definitiva de que não existia nenhum golpe e sim um enfrentamento entre burgueses foi a política do governo para os supostos golpistas caso conseguisse evitar o impeachment na Câmara. Dilma propôs simplesmente a unidade nacional com os setores golpistas. Ou seja, não há nenhuma barreira intransponível entre um setor que defende a democracia e um setor golpista, mas sim uma disputa pelo poder.

Até pouco tempo atrás, o PMDB era o maior aliado do PT. Temer era o vice-presidente que consolidava esta aliança. PSD, PP e PTB eram da base de sustentação do governo. Segundo o PT, nenhum era golpista ou de direita. O que aconteceu é que, diante da crise econômica, o governo perdeu apoio social, pois vem atacando os trabalhadores. Assim, não consegue mais enganar e “domesticar” as massas para que essas aceitem as medidas desfavoráveis. Por isso, o PT não tem mais serventia para a burguesia. Essa é a explicação de por que motivo os partidos burgueses abandonam o governo. Ratos abandonam navios antes que afundem.

A Esquerda que o PT gosta

A esquerda atrelada ao governo

Por que organizações de esquerda que até pouco tempo atrás eram oposição ao governo Dilma passaram a sustentá-lo, ainda que de forma envergonhada sob o manto da defesa da democracia?

Durante 12 anos, o PT teve fortes aliados entre os empresários e grandes partidos burgueses como o PMDB. Naquele período, desprezava e até evitava o apoio de setores de esquerda críticos aos seus governos. Na verdade, podia se dar ao luxo de tê-los como oposição.

Quando os setores e partidos burgueses o abandonaram, e o governo começou a afundar, qualquer apoio passou a ser importante. Principalmente a esquerda e os movimentos sociais que não estavam no governo e, portanto, não estavam diretamente contaminados com o esquema de corrupção. Por isso, o PT, a CUT e a UNE lançaram a ideia da Frente Brasil Popular, e o MTST impulsionou a Frente Povo sem Medo. É a forma de tentar sustentar o governo e construir uma alternativa eleitoral que acomode a todos e limpe a imagem enlameada do PT.

 

Povo não se deixou enganar

Quem faz o jogo da direita?

Como sempre acontece, os convertidos a uma nova religião têm de provar sua adesão às novas convicções. Também na política, os novos convertidos à defesa explícita do governo são os mais ativos nos ataques ao PSTU. Acusam-nos de fazer o jogo da direita e estar ao lado dos golpistas.

O curioso é que, até agora, quem dirige o Estado burguês há 13 anos é a coligação do PT com os partidos de direita como PMDB, PP, PSD e outros. Foram os responsáveis pelos ataques aos trabalhadores desde a reforma da Previdência, em 2003, ao seguro-desemprego e ao PIS no ano passado; pela corrupção na Petrobras e pela privatização do pré-sal; pela Lei Antiterrorista e pela atuação da Força de Segurança Nacional nas greves e mobilizações; favoreceram banqueiros e empresários com juros altíssimos, isenções fiscais e desonerações. Quer dizer que agora passaram a ser um governo de esquerda, ou progressista que deve ser defendido?

Ao contrário da esquerda governista, a maioria dos trabalhadores e do povo não se deixou enganar pela farsa do golpe ou da suposta ameaça à democracia. Estão contra o governo Dilma e se sentem enganados pelo PT e por Lula porque identificam, corretamente, que esse governo os enganou.

Por outro lado, isso não significa que apoiem os partidos e os políticos que promoveram o impeachment. O repúdio ao espetáculo dos deputados durante a votação na Câmara é geral. Há uma desconfiança nos políticos de direita que não permite, por exemplo, que os candidatos do PSDB cresçam nas pesquisas de opinião. Por isso, cada vez é mais aceita a nossa posição pelo “Fora todos” e por “Eleições gerais, já”.

Quem faz o jogo da direita são aqueles que apoiam Dilma. Ao defenderem um governo repudiado, com razão, pela maioria dos trabalhadores, não oferecem uma alternativa de esquerda ao governo e deixam a direita ocupar o campo na oposição.

Lutar contra um golpe inexistente é uma farsa inventada para defender o “Fica Dilma”, ou seja, para apoiar este governo que, até pouco tempo, o PSOL, o PCB e o MRT criticavam duramente.

Estranha oposição de esquerda

O papel do PSOL

Entre a esquerda governista, o PSOL cumpriu o papel ativo na defesa do governo. Este não é um movimento novo. Vem pelo menos desde o segundo turno da eleição de 2014, quando seus parlamentares apoiaram Dilma contra Aécio. Depois, o PSOL integrou as várias iniciativas que, como a Frente Povo sem Medo, diziam não apoiar o governo, mas lutar contra um golpe. No último período, a defesa do governo passou a ser clara.

Na própria nota em que explicam por que votaram contra o impeachment, a direção do PSOL diz que sempre foi oposição de esquerda à Dilma. Como exemplo, explicam que só votaram com o governo 47% das vezes e, portanto, votaram mais (53%) contra o governo. Estranha oposição de esquerda, que vota quase metade das vezes a favor do governo! Com uma oposição assim, qualquer governo se sente tranquilo.

Para explicar sua posição contra o impeachment, o PSOL se apega à Constituição e à defesa do Estado de Direito, dizendo que Dilma não cometeu crimes de responsabilidade. A mesma defesa apresentada pelo governo e pelo PT. Ora, isso é um argumento típico das manobras jurídicas de advogados que defendem políticos corruptos. O governo Dilma cometeu, sim, muitos crimes contra os trabalhadores e o povo, que já enumeramos neste mesmo artigo.

Nós, do PSTU, somos contra o impeachment, não porque o governo não tenha cometido crimes, mas porque esse instrumento é uma maneira de a classe dominante substituir o fusível queimado (no caso, o governo Dilma) que não funciona mais por outro (o de Temer), tão ou mais corrupto que o anterior e que vai continuar atacando nossos direitos.

Além disso, uma verdadeira oposição de esquerda socialista não defende o Estado de Direito. Muito menos a Constituição totalmente reacionária que temos. Em geral, o Estado de Direito e o chamado regime democrático são verdadeiras ditaduras da burguesia disfarçadas pelo direito de escolher, a cada quatro anos, os governantes que vão explorar o povo.

Esse mesmo Estado de Direito permite que os trabalhadores votem, mas viola seus direitos democráticos todos os dias. A polícia aplica, na prática, a pena de morte, assassinando, todos os anos, mais de cinco mil pessoas, a maioria negros e pobres. Camponeses, indígenas e quilombolas perdem suas terras e vidas todos os dias. Nas empresas, continua a existir uma ditadura patronal que demite trabalhadores ao menor sinal de tentativa de organização sindical. Portanto, o Estado de Direito é uma farsa que procura encobrir uma ditadura burguesa.

Nós defendemos, sim, as liberdades democráticas dos trabalhadores se estiverem ameaçadas. Mas nunca defendemos este suposto direito constitucional de um governo ficar quatro anos no poder fazendo todo tipo de violências contra o povo.

Por isso, o PSTU defende que os trabalhadores coloquem para fora este governo e todos os políticos corruptos por meio de mobilizações e de uma greve geral, exigindo novas eleições gerais. Isso é profundamente democrática porque expressa um sentimento crescente entre a maioria da população. Defendemos que os trabalhadores sigam além e lutem por um governo socialista dos trabalhadores apoiado em Conselhos Populares. A luta contra o governo e contra a alternativa de direita é um passo fundamental nesta direção.