As festividades similares ao Carnaval têm origem ocidental, na antiguidade greco-romana, quando se realizavam festas populares vinculadas a conquistas e colheitas, bem como rituais de culto aos deuses pagãos. Eram regadas a vinho, danças, quebra dos tabus sexuais e relaxamento temporário das relações de poder com os escravos.
Na Idade Média, o catolicismo, que ao longo dos séculos foi assimilando e convertendo os costumes camponeses e as celebrações pagãs ao seu calendário, vinculou-o ao período que antecede a Quaresma. A partir da quarta-feira de cinzas, sugere as penitências com vistas à Semana Santa. Nesse sentido, a palavra carnaval vem do latim carnisvalles, significa “adeus à carne” ou, num sentido geral, adeus aos prazeres da carne.

O significado histórico e universal do Carnaval nos remete a brincadeiras, danças livres, quebra dos padrões morais sexuais e até mesmo da crítica política anárquica e jocosa. Daí, a figura do Rei Momo, que simboliza a zombaria do governante tradicional, e do “mela-mela” ou da “pipoca”, feito com farinha de trigo, água, tintas e ovos, que ainda hoje se pratica nas pequenas cidades e na periferia das grandes cidades.

Os portugueses introduziram o carnaval ou, como era chamado na época, o “Entrudo”, no Brasil. O Entrudo, no entanto, estava mais associado às brincadeiras populares e ao mela-mela de rua ou aos comportados mela-melas familiares que ocorriam nas famílias das classes médias e altas que não brincavam o carnaval popular de rua.
Diversas foram as tentativas de proibição do Entrudo, mas a partir do século 20, com a oficialização e organização da festa pelo poder público e pelos grandes clubes e blocos, o Carnaval se consolidou como uma festa de rua e de massas. Os grandes bailes, ao estilo francês, continuaram a existir paralelamente às festas de rua. Até hoje, somente quem pode pagar os altos valores dos ingressos ou adquirir caras fantasias frequenta festas fechadas.

A oficialização do carnaval e o frevo pernambucano
Três grandes manifestações culturais, com suas expressões na dança, na música e na estética, se converteram nos símbolos mais expressivos do carnaval brasileiro: o samba, o axé baiano e o frevo pernambucano. O carnaval pernambucano se caracteriza pela sua multiculturalidade e resistência às diversas tentativas de padronização. Centenas de agrupamentos se apresentam num espetáculo público, espontâneo, de ritmos, cores e danças. Assim, existem os maracatus rurais e urbanos, os afoxés, os caboclinhos, os blocos, as troças, os ursos, os bois, as cirandas, os cocos, os sambas e os frevos.

Recife e Olinda são os grandes centros da festa que leva milhões de pessoas às ruas, desde a quinta-feira até a quarta-feira de cinzas. Os sindicatos e os partidos possuem blocos, os principais bairros e os times de futebol também. Os clubes apresentam suas fantasias e os bonecos gigantes. Destaquemos, aqui, apenas alguns grupos mais reconhecidos: o Galo da Madrugada, o Homem da Meia Noite, Enquanto Isso na Sala da Justiça, O Bacalhau do Batata, O Ceroulas, O Cabeça de Touro, A Porta, Eu Acho é Pouco, Nós Sofre mas Nós Goza, Bicho Maluco Beleza, Nem Sempre Lily Toca Flauta, os maracatus Leão Coroado (fundado em 1863) e Elefante (fundado em 1800); os afoxés Ylê de Egbá, AlafinOyo e Oxum Pandá; os nostálgicos blocos líricos como o Bloco da Saudade, Bloco das Flores e Bloco das Ilusões; e os tradicionais intérpretes do frevo-canção, nos shows dos diversos polos carnavalescos.

O frevo possui uma distinção, pois é um gênero musical e de dança genuinamente pernambucano. Tem caráter urbano e altamente sincrético. Sofreu influência, desde o seu nascedouro, no início do século 20, nos bairros do centro recifense de São José e Santo Antônio, da cadência rítmica e eletrizante das bandas musicais militares com seus metais estridentes, dos passos da capoeira e dos clubes operários.

A massificação do frevo está relacionada com a massificação do carnaval, já que os carnavais aristocráticos das elites da época eram restritos aos salões de máscaras ao estilo europeu. O tomar das ruas pelos clubes operários e populares, pela população negra recém liberta e pelas baixas classes médias, no período de Carnaval, teve também simbologia de rebeldia das classes oprimidas da época.

O frevo se popularizou mais a partir dos anos 1930, com o impulso das gravações dos discos e das transmissões radiofônicas. Com o tempo, variou em expressões musicais e também nos passos de dança, não perdendo o seu caráter contagiante, romântico e nostálgico. Existe o frevo-de-rua (instrumental); o frevo-de-bloco, executado por orquestras de pau e corda, com letras cantadas por corais femininos; e o frevo-canção, cantado em solo, acompanhado por orquestras e instrumentos elétricos.

O carnaval do Recife e de Olinda, junto com o de Salvador e Rio de Janeiro, são as maiores festas populares do país e agregam, também, as contradições sociais intrínsecas às grandes metrópoles brasileiras, a exemplo do difícil acesso ao transporte público, da pouca infraestrutura para os eventos, da violência, do sexo-turismo, entre outras. Mas isso não tira o brilho da criatividade popular que, a despeito dos seus governantes, fazem a festa valer a pena.

Post author David Cavalcante, de Recife (PE)
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