As fortes chuvas que caíram no Litoral Norte de São Paulo neste final de semana de Carnaval deixaram um rastro de morte e destruição. Até agora foram contabilizadas 46 mortes, sendo 45 só na cidade de São Sebastião, além de 2500 famílias desabrigadas e 40 pessoas desaparecidas. A população enfrenta ainda o drama do desabastecimento de água e a falta de energia elétrica.
A chuva que caiu na região foi recorde no país, superando o recorde anterior na cidade de Petrópolis (RJ), em 2022, expressão das mudanças climáticas e do aquecimento global que provocam, cada vez mais, eventos climáticos extremos. Por outro lado, as dezenas de mortes não são fruto de um fenômeno “natural”, mas resultado direto do descaso de sucessivos governos, nas suas três esferas.
Para começar, o orçamento do Governo Federal para a prevenção e recuperação de acidentes é o menor em 14 anos. Quanto mais tragédias ocorrem, ano a ano, absolutamente previsíveis e evitáveis, menos dinheiro se gasta a área. Em 2023, foram disponibilizados R$ 1,77 bilhão para o enfrentamento a tragédias do tipo, segundo levantamento da ONG Contas Abertas. Para efeito de comparação, em 2013 eram R$ 11,6 bilhões, em valores atualizados. Em 2014, esse valor caiu para R$ 7,2 bilhões, para R$ 4,4 bi em 2015, e assim sucessivamente.
A cada ano, as mesmas cenas se repetem, mas em profusão cada vez maior. Famílias inteiras soterradas, em sua imensa maioria pobres empurrados para áreas de risco pela especulação imobiliária. Além dos alagamentos e dos milhares de desabrigados que perdem o pouco que tem. E os mesmos discursos hipócritas dos governantes que, quando muito, sobrevoam as áreas atingidas, fingem solidariedade com os atingidos e prometem mudanças. Tudo para que, no próximo ano, a tragédia se repita.
A cadeia de descaso vai do Governo Federal até os estados e municípios, com a ausência de obras de contenção de enchentes, de saneamento, de uma Defesa Civil operante, etc. Ao contrário, os governos agem em prol da especulação imobiliária, como o atual secretário do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), Guilherme Afif. O empresário tenta há anos construir um condomínio de 50 mansões na Praia da Baleia, uma das regiões mais valorizadas de São Sebastião, em plena área nativa da Mata Atlântica.
O descaso do governo Tarcísio com o tema, aliás, não é nenhuma surpresa, haja visto que o governador era um dos principais homens do governo Bolsonaro, que protagonizou um dos casos mais repulsivos da República recente ao preferir ficar de férias passeando de jet ski a acompanhar o drama das enchentes na Bahia, em dezembro de 2021.
Resposta insuficiente
Lula interrompeu seu feriado para ir até São Sebastião, onde se reuniu com Tarcísio e o prefeito bolsonarista Felipe Augusto (PSDB). No entanto, ao invés de medidas concretas e efetivas para enfrentar a calamidade, reproduziu o discurso de unidade nacional com a direita. Ao lado dos governantes de extrema-direita, declarou: “Essa parceria é uma fotografia boa para nosso país, se cada um trabalhar sozinho, nossa capacidade de rendimento é menor“.
Essa política, porém, de governar com e para os grandes empresários, é justamente a que perpetua o descaso e a omissão responsáveis pelas tragédias que vitimam a classe trabalhadora e a população mais pobre todos os anos. Que privilegia a especulação imobiliária, o desmatamento, a falta crônica de verbas para obras de enfrentamento às enchentes.
Já a resposta dada pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, é um verdadeiro tapa na cara das famílias enlutadas e desabrigadas: a liberação do FGTS para os trabalhadores da região. É dizer, depois de anos de descaso, que cada um deve virar por si próprio. Além disso, a “prioridade” elencada pelo governo é a recuperação de estradas, quando dezenas ainda estão soterrados.
Solidariedade e luta
Neste momento de dor, é preciso prestar toda a solidariedade aos atingidos pelas chuvas no litoral paulista. É necessário fortalecer a solidariedade de classe, a exemplo da campanha que a CSP-Conlutas está desenvolvendo, de doações e ajuda à população da região.
Para além disso, é necessário fortalecer a independência de classe, a fim de lutar e exigir dos governos medidas concretas para dar um basta a essa interminável sucessão de tragédias. Enfrentar a especulação imobiliária, desapropriar residências em áreas seguras que hoje serve à especulação para garantir moradias dignas à população pobre, além de reparar os prejuízos dos atingidos. É necessário exigir ainda a suspensão do pagamento da dívida aos banqueiros, redirecionando todos os recursos necessários para socorrer as famílias.