Candidato à presidência da Bolívia está na frente das pesquisas e diz que ninguém vai que tirar as multinacionais “empurrões do país“Em sua desenfreada corrida para chegar ao poder, o partido boliviano Movimento ao Socialismo (MAS), do deputado indígena e cocalero Evo Morales, que encabeça a preferência eleitoral na Bolívia, submete-se aos organismos internacionais, promete não afetar os interesses das transnacionais e respeitar os contratos das empresas petrolíferas, ainda que estes sejam ilegais e lesivos para o país
“Foram reuniões cordiais de mútuo respeito nas quais uma equipe de profissionais e técnicos de alto nível indicou com solvibilidade – técnica e política – o que vamos fazer no país“, disse o candidato a vice-presidente do MAS, Álvaro Garcia Linera, após a reunião que teve com representantes do FMI, do Banco Mundial e outros organismos que definem fundamentalmente a política econômica que segue um dos países mais saqueados da América Latina.
O programa de governo do MAS, elaborado por Linera, o ex-guerrilheiro que agora defende a conciliação e a colaboração de classes, foi posto à consideração dos organismos internacionais e de setores empresariais para “estender pontes“ que tornem viável um possível governo de Evo Morales, o líder indígena que encabeça a preferência eleitoral com 28%. Este programa propõe a construção e o desenvolvimento de um forte capitalismo de Estado, mas sem afetar os investimentos estrangeiros nem a estabilidade macro-econômica, sustentada pelos acordos anuais firmados com o FMI e o Banco Mundial.
Segundo explicação de Linera, que tem influência decisiva sobre Morales, o programa de governo do MAS, cada vez mais voltado à direita, tem como eixo central a “recuperação“ dos recursos naturais, mas respeitando os contratos firmados com as transnacionais.
O objetivo, disse, seria avançar também em direção à industrialização dos hidrocarbonetos (petróleo e gás) para beneficiar o povo boliviano. A proposta do MAS pretende que no futuro as empresas petrolíferas não controlem os recursos naturais, ainda que “ninguém vai tirá-las a empurrões do país“.
“O Estado tem interesses muito importantes que vai a manter e ampliar, respeitando contratos. As empresas que não o façam terão que se ater às conseqüências“, agregou ao ratificar que um governo do MAS, que emergeria das urnas em dezembro próximo, não fará nem expropriações nem confiscos da propriedade e riqueza das petrolíferas, que de maneira dolosa apropriaram-se de mais de 100 bilhões de dólares.
Os 78 contratos firmados pelas petrolíferas Repsol, Petrobras, Total, British Gas, Vintage, Enron, Shell e outras com os governos neoliberais foram considerados ilegais pela justiça boliviana ao não ter sido referendados pelo Congresso, tal como estipulam as leis. Por isso, vários setores sociais exigiram seu desconhecimento imediato, dando lugar à nacionalização sem indenização e a expulsão das transnacionais que operam na Bolívia à margem da lei.
No entanto, outra é a posição do MAS nesta etapa eleitoral, deixando para trás seus questionamentos aos contratos para dar lugar ao “respeito aos investimentos estrangeiros“. Segundo Linera, os temas abordados na reunião do MAS com os organismos internacionais são relativos ao modelo produtivo, hidrocarbonetos, terra e território, fomento empresarial, estabilidade macro-econômica e política fiscal. “Notaram-se as caras de relativa tranqüilidade nos organismos de apoio, não foram de espanto e menos ainda de temor“, disse satisfeito o candidato à vice-presidente ao concluir a reunião. Todos os compromissos adquiridos pelo MAS seriam referendados no dia 28 de setembro na Espanha, lugar da última reunião entre os principais organismos internacionais que assistiram Morales e Linera, complementou o deputado do MAS, Santos Ramírez.
No mesmo tom, ainda que em separado, o candidato Morales assegurou que a estabilidade macro-econômica será garantida, sem vulnerabilizar os acordos internacionais, numa tácita aproximação aos postulados dos organismos internacionais que priorizam a estabilidade e o controle do déficit fiscal.
O assunto em que aparentemente não houveram retrocessos foi a coca. Morales disse que uma das propostas centrais de seu plano de governo é a descriminalização da produção da folha de coca. Ao expor sua posição a respeito da política de erradicação da folha de coca, Morales comentou que iniciará uma campanha radical de descriminalização da folha. “Não haverá `Coca Zero`, mas sim `Narcotráfico Zero“`.
Morales assegurou à imprensa que não seguirá a política norte-americana de perseguir os produtores de coca, a qual teria como objetivo não só terminar com as “plantações excedentes“, senão que também “atormentar os cocaleros da zona do Chapare e dos Yungas“.