PSTU Rio de Janeiro

A crise do coronavírus está avançando rapidamente no Brasil. Em resposta a este fenômeno o governo Bolsonaro trabalha para criar uma polarização entre a necessidade de salvar vidas e as consequências econômicas do isolamento social. Aproveitando o momento, diversas legislações que flexibilizam direitos trabalhistas estão sendo editadas.

Seguindo esta lógica, na indústria como um todo – e na indústria do petróleo particularmente – esta polarização se expressa. Os trabalhadores e suas organizações batalham por medidas para salvar nossas vidas, mas tem que enfrentar duros ataques econômicos. Os debates estão ardendo em toda a sociedade. Há realmente uma contradição entre salvar vidas e conter uma desestabilização da economia? As medidas tomadas por governos e empresas são necessárias? Ou suficientes para enfrentar este momento? Este é o tema que vamos abordar neste artigo.

A resposta sanitária

A pandemia oficialmente chegou ao Brasil em 25 de fevereiro, quando o primeiro caso foi confirmado. Na Petrobras, em 12 de março, já havia a notícia de um funcionário de férias que foi contaminado. Somente em 17 de março os setores administrativos da Petrobras começaram a ser liberados para ficar em casa.

As empresas do setor privado nacionalmente continuaram suas rotinas como se nada acontecesse, ignorando determinações da OMS e, em muitos casos, decretos municipais e estaduais. As áreas operacionais em terra e mar, apesar das exigências de autoridades e sindicatos, não tiveram alteração em suas rotinas até iniciar uma enxurrada de denúncias de pessoas embarcadas com sintomas.

A Petrobras implementou unilateralmente algumas medidas para seus funcionários próprios: mudou e aumentou escalas de turno e embarque à revelia das opiniões dos atingidos, trancou operários em hotéis e colocou os setores administrativos em teletrabalho sob custos dos próprios funcionários. Mas não garantiu as medidas mais óbvias como oferta de álcool, máscaras e testagem para quem não podia parar de trabalhar.

Considerando suas dezenas de milhares de terceirizados, nem essas medidas parciais foram adotadas. Até agora os vemos nos prédios administrativos e nos canteiros de obras se expondo ao vírus por tarefas nada essenciais. Tem sido uma briga para tentar liberá-los para quarentena porque as empreiteiras só pensam no faturamento e a Petrobras lava as mãos. Os empresários os forçam entre o medo da morte e do desemprego, enfrentando até determinações de autoridades municipais e órgãos de Saúde.

Até o presente momento, há áreas da companhia que seguem funcionado apesar de não terem relação com serviços essenciais para o combate à pandemia. A redução de efetivo nas unidades e o afastamento dos trabalhadores pertencentes aos grupos de risco demorou em torno de duas semanas do início do isolamento social. As entidades sindicais fizeram diversas solicitações, principalmente em relação à testagem de quem está trabalhando e ao fechamento de setores desnecessários. As empresas em geral ignoram as solicitações e não admitem nem negociação sobre essas arbitrariedades.

Neste compasso, cresce um sentimento de revolta entre os de baixo que deve aumentar com o pico da contaminação nas próximas semanas. Apesar do medo do desemprego, a gravidade da situação deve trazer de volta as discussões de greve, à exemplo do que os metalúrgicos de São José dos Campos (SP) tiveram que fazer.

Empregos e salários

Os ataques do governo e empresários, contudo, não pararam nas limitadas medidas sanitárias. Apoiados nas possibilidades abertas por Bolsonaro e Paulo Guedes, uma onda de duros cortes e centenas de demissões são a nova realidade do setor. Os capitalistas estão aproveitando a crise social do coronavírus para engordar seus bolsos com a desculpa que estão salvando a economia. Na lógica dos ricos aeEconomia não tem relação com a vida.

Nas prestadoras de serviço como Norteng no Comperj, Brasfelds em Angra ou Elfe em Macaé, já ocorreram centenas de demissões. Há muitos casos de férias coletivas em empreiteiras já com aviso de suspensão de contrato e posterior demissão. Essa postura das empresas privadas e a conivência criminosa do governo – ao liberar dinheiro para empresários e não estabelecer a estabilidade no emprego para todos – é um atentado contra as suas vidas.

A Petrobras, semana após semana, vem tomando medidas mais duras. Logo no início das restrições impostos pelo isolamento, a empresa demitiu e suspendeu ilegalmente vários funcionários em retaliação à greve ocorrida em fevereiro. Para fazer isso teve que descumprir o acordo firmado com os sindicatos no TST. Esta provocação causou indignação geral e está provisoriamente suspensa pela Justiça, que determinou a reintegração dos demitidos.

Logo em seguida, começaram os ataques econômicos aos funcionários diretos. Aos embarcados que tiveram a jornada estendida e que estavam em hotéis de quarentena a empresa anunciou que não pagaria o valor total das horas-extras. Depois foi anunciado um corte salarial geral, chegando em até 50% do salário dos operários de turno que se encontram em isolamento. Isso atingirá principalmente quem é de grupo de risco, os mais idosos e que já sofrem com a brutal redução salarial ocasionada pelo equacionamento da previdência privada (a PETROS). Também foi imposta uma redução salarial de 25% a todos os funcionários do regime administrativo da companhia, com respectiva redução da carga horária.

A empresa vai postergar pagamento de férias, de horas-extras, do Programa de Prêmio por Performance e vai cancelar o avanço de nível do plano de carreira deste ano. Esses ataques não se justificam do ponto de vista do caixa da empresa, apesar de essa ser a desculpa. No último ano a Petrobras divulgou um lucro recorde de R$ 40,1 bilhões. Com as medidas ela diz que pretende economizar algo em torno de R$ 3 bilhões (R$ 2,4 bi na Petrobras e R$ 0,5 bi na Transpetro). Não bastasse o lucro que encheu o caixa, ainda foram contraídos R$ 11,5 bilhões de empréstimos para enfrentar a pandemia e reduzidos R$ 7 bilhões dos projetos de investimentos. Ora, se esses empréstimos não serão usados para investimentos, o que justifica o corte salarial?

A intenção da diretoria é lucrar sobre os cortes salariais, uma vez que o mercado de petróleo com um todo está retraído. Esta meta é ainda mais nojenta quando se analisa a postura em relação à alta chefia da empresa. Se para os trabalhadores que arriscam a vida produzindo, a empresa oferece cortes, para sua diretoria, alta gerência e os cargos de confiança ela vai apenas adiar o pagamento de parte do salário.

O que produzimos e para quem?

Esta semana veio o anúncio de que campos e participações serão vendidos, várias plataformas (de águas rasas) serão hibernadas e terminais no RN e SE seguem o mesmo caminho. Ainda assim, outro anúncio determinou que será mantida a produção em 2,07 milhões de barris por dia. Observando o aumento das importações realizadas pela empresa e as necessidades do combate à pandemia ficam algumas perguntas: para quem e para que está voltada a produção da Petrobras? Todas as atividades do mundo do petróleo são essenciais? As ações governo e a direção da Petrobras vão em qual direção?

Já há anos a Petrobras vem tendo uma política de diminuir sua produção interna de combustíveis para abrir mercado para importações. O bolso do povo brasileiro tem sido usado para absorver a produção internacional vendida em dólar. Para ajudar nesse sentido, a empresa eleva o preço da produção nacional buscando uma paridade com os preços praticados no mercado internacional. É um projeto iniciado pelo PT e mantido até agora, de transferência de renda para fora do Brasil, que somente governos lambe botas dos capitalistas estrangeiros poderiam impor.

Neste período de isolamento social, a demanda por combustíveis reduziu drasticamente. Várias refinarias estão quase paradas por falta de lugar onde estocar combustíveis. Por que então, este combustível não é oferecido de graça, ou à preço de custo para ajudar no combate à covid? Estados e municípios quebrados seguem pagando preços de mercado internacional para abastecer ambulâncias, viaturas e carros de bombeiros. Caminhoneiros se arriscam fora da quarentena e seguem pagando diesel a preços exorbitantes por uma escolha política do governo e da direção da Petrobras.

Esta escolha de servir aos interesses imperialistas é o que justifica a manutenção da produção de 2 milhões de barris. Entenderíamos se a justificativa fosse aumentar a produção de GLP ao máximo –  aproveitando a capacidade ociosa que hoje existe – e oferecendo a preços baixos aos mais pobres que já sofrem com o aumento por conta da escassez do produto em 7 estados. Mas pelo contrário, a empresa anuncia que aumentará as importações do produto.

O que justifica então este patamar de produção? São centenas de trabalhadores mantidos nas plataformas garantindo a exportação de petróleo bruto, mesmo que o preço do barril e as demandas do mercado indiquem internacionalmente uma redução. A razão de tamanho absurdo é o sistema capitalista: o Brasil é um país dominado por interesses de potências estrangeiras, sem nenhuma soberania, nem para salvar a vida e os interesses do seu povo. Bolsonaro e Castello Branco são os atuais gerentes dessa dominação. Defender nossas vidas, empregos e direitos passa diretamente por derrotar esses gerentes e o sistema.

O controle da produção pela vida de todos

É urgente um plano de crise. A produção deve ser colocada a serviço exclusivamente do combate ao coronavírus. A saúde de funcionários próprios, terceirizados e dos petroleiros do setor privado precisa ser defendida garantindo isolamento social a todos que puderem. Os cortes salariais, mudanças de regime, postergação de pagamentos e as demissões devem ser duramente combatidas. A Petrobras tem caixa mais do que suficiente para arcar com este período sem jogar a conta para seus funcionários.

Contra as medidas de salvamento dos lucros dos empresários estipuladas por Paulo Guedes, devemos defender medidas efetivas de garantia do emprego. As empresas privadas que demitirem ou pedirem falência devem ser estatizadas para garantir a estabilidade e os salários. Os pagamentos da dívida pública devem ser imediatamente revertidos para este fim.

Todos do setor do petróleo devem discutir a necessidade de parar suas atividades. Uma Greve Sanitária Nacional pode ser a única saída para salvar milhares de vidas. Contudo, esta mobilização não deve atrapalhar as ações de combate à pandemia. Os petroleiros já vêm demonstrando seu compromisso com esta luta, mas a ganância dos capitalistas faz com que os empresários e governantes defendam os lucros no lugar da vida. Por isso teremos que ser nós a organizar este processo.

Para isso, os sindicatos e as organizações dos trabalhadores devem articular nos locais de trabalho comissões de crise que fiscalizarão a parada dos canteiros, as demissões, os efetivos necessários nos prédios administrativos e a organização das áreas operacionais. Elas devem estipular quais plantas vão parar e quais vão funcionar. O objetivo deve ser garantir o gás de cozinha (encanado e de botijão) e os combustíveis essenciais. O controle dos estoques guiará a necessidade de operar mais ou menos plataformas. As escalas de trabalho, o efetivo das unidades e os métodos de prevenção de contágio devem ser discutidos e aprovados nessas comissões de crise.

Devem ser incentivas as iniciativas dos operários, como usar o conhecimento e a estrutura das empresas para consertar equipamentos dos hospitais. Os centros de pesquisa da empresa também podem cumprir um importante papel no desenvolvimento de tecnologias que ajudem a responder ao combate à covid-19. Todas as possibilidades devem estar voltadas a este propósito.

Sabemos que tudo isso vai no sentido oposto dos interesses do mercado financeiro, do imperialismo que nos domina e dos seus agentes que governam o país. A cada passo que dermos para nos defender, eles estarão contra nós. A qualquer ameaça do lado de lá, devemos responder com o grito cada vez mais forte de Fora Bolsonaro, Mourão e Castello Branco. As ruas já tem indicado este caminho.

Os de cima estão em casa, protegidos e insistindo que os de baixo devem morrer para a economia capitalista sobreviver. Mas nós que estamos arriscando nossas vidas temos a economia nas nossas mãos. Este poder de fazer o sistema funcionar é nosso, por isso o desespero deles em nos fazer trabalhar de qualquer jeito. Eles só têm nas mãos a autoridade de se chamar de presidente, empresário, ministro, deputado ou general. Nossa vida cada vez mais vai depender da destruição dessa autoridade que eles usam para nos matar.

Da nossa organização para lutar pela sobrevivência deve vir a destruição da falsa autoridade desses poderosos. Da posse e da reorganização da economia pelas nossas mãos deve surgir a construção de uma sociedade socialista, o trabalho salve vidas e garanta a dignidade de não ter que lutar para sobreviver. Onde os lucros de poucos lá de cima não existam mais porque se tornaram a fartura dos muitos aqui de baixo.