Redação

Horas depois do tragicômico desfile militar na Esplanada dos Ministérios, os deputados aprovavam nesta terça-feira, 10, por 304 votos a 133, o texto-base da Medida Provisória 1045 que institui o que vem sendo chamado de mini-reforma trabalhista, passando a boiada nos direitos, ou no que restou deles após a reforma de 2017.

Numa votação expressa, os deputados aprovaram a MP sob a relatoria do deputado Christino Áureo (PP-RJ), incluindo ainda um pacotão que reduz salários e retrocede em direitos históricos, além de implementar uma série de modalidades de trabalho precário voltado principalmente à juventude, avançando ainda mais no desmonte da CLT e institucionalizando a informalidade, impondo, na prática, medidas da já rechaçada carteira verde-amarela.

Aumento da jornada

Uma das medidas da mini-reforma é a chamada “jornada complementar facultativa” a quem hoje tem direito de jornadas especiais como trabalhadores do telemarketing, professores, advogados e jornalistas. A medida acaba com essa diferenciação ao elevar a jornada até o limite determinado pela CLT, de 8h diárias, sem que isso seja contado como hora extra. Os mineiros, por exemplo, que trabalham hoje 6 horas em condições extremamente degradantes, poderão trabalhar até 12h num único dia.

As horas que excederem à jornada normal de trabalho não serão pagas como é hoje (50% de segunda a sábado e 100% nos domingos e feriados), mas terão acréscimo de apenas 20%. Essa medida, além disso, poderá ser imposta através de acordo individual entre patrão e empregado, e não por meio de acordos coletivos.

Trabalhadores de segunda classe

O pacote impõe ainda a proposta aventada pelo ministro do recém-recriado Ministério do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, de instituir o “trabalho voluntário” para supostamente dirimir os efeitos da pandemia, sem qualquer vínculo formal. Destinado a pessoas entre 18 e 29 anos, e os acima de 50, a medida institucionaliza o trabalho precário no setor público, estabelecendo como base o salário-mínimo hora. O governo bancaria R$ 125 deste “salário” e o restante não se sabe de onde mais viria. Sem férias, sem décimo-terceiro, sem FGTS ou qualquer outro direito.

Já o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), será destinado a jovens (18 a 29 anos) em busca do primeiro emprego, ou trabalhadores com mais de 55 anos desempregados, e estabelece contratos de trabalho de até dois anos, com um teto salarial de dois salários mínimos. As empresas que optarem por contratar nessa modalidade poderão reduzir o recolhimento do FGTS dos atuais 8% para 6%, 4% ou até 2% dependendo de seu tamanho. O governo promete um bônus cujo valor pode ser de R$ 275.

Outra “vedete” do pacote de empregos é o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtivo (Requip). Trata-se de um programa que não garante nenhum contrato, mas uma bolsa de até R$ 550 (metade pelo governo, metade pela empresa). Também voltado aos jovens sem emprego, esse arremedo de trabalho ultraprecarizado também tem como público ex-beneficiários de programas sociais. As empresas ainda poderão descontar os “gastos” na contribuição ao Sistema S.

Essas modalidades de trabalho precário retomam as medidas da famigerada carteira verde-amarela, de institucionalização do trabalho precarizado e sem direitos mínimos. Na prática, vai significar a substituição dos trabalhadores hoje contratados via CLT por essas novas modalidades. Ao contrário de criar empregos, significa precarizar o mercado de trabalho, hoje já marcado pelo desemprego em massa, a “uberização” e a informalidade. A reforma trabalhista de 2017 foi aprovada sob a promessa de criar 6 milhões de empregos, e o único efeito que teve foi a ampliação da precarização e a perpetuação do desemprego.

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Restrição à Justiça do Trabalho e desmonte da fiscalização

O pacotão do governo e do Congresso dificulta ainda a fiscalização pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). Para se ter uma ideia, obriga que, para um empregador seja multado, seja precisa duas visitas de auditores-fiscais do trabalho, mesmo para violações graves a normas como saúde e segurança no trabalho. Na prática, estabelece o vale-tudo para os patrões ao inviabilizar qualquer tipo de punição, mesmo a flagrantes de irregularidades.

Ao mesmo tempo, a MP restringe o acesso à justiça gratuita, exigindo a “comprovação de renda” para o direito. É uma forma de intimidar o trabalhador para que ele não recorra à justiça em busca de seus direitos.

O Congresso Nacional comprova, assim, que, mesmo com as eventuais diferenças políticas com Bolsonaro e estratégias distintas de poder (e mesmo assim com limites haja visto os votos de partidos como PSDB, DEM, PSB e PDT à pataquada do voto impresso), estão todos unidos nos ataques aos direitos trabalhistas, ao aumento da exploração e em jogar todo o peso da crise nas costas da classe trabalhadora e do povo pobre.

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