Apesar de condenação, impunidade persiste no campoNo último dia 15, o segundo mandante do assassinato da freira missionária Dorothy Stang foi condenado a 30 anos de prisão, após dois dias de julgamento. O fazendeiro Vitalmiro Santos de Bastos, conhecido como Bida, deverá ter novo julgamento, previsto na lei brasileira quando a pena ultrapassa 20 anos.

Dorothy Stang foi brutalmente assassinada com seis tiros à queima-roupa por pistoleiros, aos 73 anos, na região de Anapu, no Pará, em 12 de fevereiro de 2005. A freira norte-americana vivia no Brasil há 40 anos e atuava em projetos de desenvolvimento sustentável e na luta pela terra e em defesa dos direitos humanos. O crime aconteceu em plena luz do dia e diante da população.

Há anos, porém, ela já sofria ameaças que, na época, foram denunciadas ao governo Lula e à imprensa. Nenhuma providência foi tomada e a conseqüência foi a morte da ativista.

Bida é apenas um dos acusados. Um consórcio de fazendeiros e madeireiros para financiar assassinatos de ativistas foi denunciado e não investigado a fundo. Além de Bida, também é acusado como mandante Regivaldo Pereira Galvão. Há ainda pelo menos outros três envolvidos. Amair Feijoli da Cunha, o Tato, também fazendeiro, foi condenado por intermediar o crime a 27 anos de prisão. Posteriormente, ele teve a pena reduzida por “colaborar com o processo”.

Violência persiste no campo
A condenação de Vitalmiro Santos de Bastos foi fruto de uma ampla campanha que tomou dimensões internacionais. Nos dois dias do julgamento de Bida, permaneceram em frente ao tribunal centenas de ativistas em luta pela terra vindos de todo o estado do Pará e, inclusive, de estados vizinhos. Durante a sessão, eles vaiavam a acusação – que chegou a argumentar que a freira era “perigosa” e “vingativa” – e realizaram uma caminhada exigindo justiça não só pelo caso de Dorothy, mas por todos os crimes no campo.

A maioria esmagadora dos crimes contra ativistas e militantes no Brasil, entretanto, segue impune. Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Bida foi o quarto mandante de crime julgado no Pará em 33 anos. Nesse período, segundo relatório da CPT, mais de 770 assassinatos foram cometidos só no estado. Em contrapartida, o número de prisões políticas subiu de 261 trabalhadores em 2005 para 917 em 2006.

A morte da missionária foi uma entre tantas, como a de Chico Mendes, dos sem-terra de Eldorado dos Carajás e milhares de outros. Esses crimes são causados pela combinação entre impunidade, concentração de terras nas mãos de uns poucos latifundiários e falta de uma reforma agrária ampla, além da negligência criminosa dos governos federal e estaduais e de todo o aparato do Estado.

A batalha pela terra, não há dúvidas, só pode ser feita lutando contra a política neoliberal e o governo. Lula escolheu como aliados – os seus “heróis”, segundo suas próprias palavras – que ordenaram os disparos contra a irmã Dorothy, os sem-terra de Eldorado e tantos outros. Durante o seu governo, aumentaram os números da violência no campo e a repressão aos movimentos sociais.

No caso Dorothy, mesmo com a forte mobilização pela punição dos acusados, ainda há lacunas que precisam ser preenchidas. Os irmãos da freira, David e Thomas Stang, que acompanham o caso passo a passo, estão no Brasil e exigem que haja uma investigação profunda do tal consórcio para matar ativistas. “Pouca gente lembra, inclusive a polícia, do relatório feito por uma comissão do Senado brasileiro a respeito das circunstâncias do crime, inclusive a descoberta do consórcio para matar a nossa irmã”, recorda David. A denúncia deu conta de um grupo de cerca de 40 fazendeiros, ou seja, é possível que ainda existam mais de 30 responsáveis pelo crime contra Dorothy e por dezenas de outros que acontecem cotidianamente no Pará sem nenhum tipo de punição.

É preciso ir até o fim nesse caso e que sejam punidos os responsáveis por todo e qualquer tipo de violência no campo. Essa ação deve vir acompanhada de uma política do governo que implemente uma ampla reforma agrária.

O determinante, neste caso, foi a luta dos movimentos sociais e de organizações combativas. Mesmo assim, como se vê, a luta para ir às últimas conseqüências na apuração desse crime está longe de acabar. Só será possível pressionar a Justiça e obter vitórias contando com as ferramentas da classe trabalhadora: a mobilização permanente e a pressão pela distribuição de terra e de renda, hoje concentradas nas mãos de uma minoria.

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