Imigrantes haitianos e senegaleses são abrigados em Florianópolis-SC Foto: Thiago Mangrich/ SEMAS
PSTU-DF

Eduardo Zanata, de Brasília (DF)

A crise migratória é um problema mundial criado pelo capitalismo em função das guerras e das crises econômicas e humanitárias provocadas pela política imperialista de colonização e submissão da maioria dos países por um punhado de nações. Na última década, esse cenário se aprofundou com grandes ondas migratórias do Oriente Médio, da África e da América do sul, América Central e Caribe em direção aos países da Europa, EUA e para o Brasil.

No Brasil, aconteceram duas grandes ondas migratórias na última década. A primeira de haitianos depois do terremoto de 2010, que deixou um rastro de mais de 200 mil mortos e milhões de desabrigados, aprofundando ainda mais a situação precária em que já vivia a população haitiana. A segunda onda migratória veio da Venezuela a partir de 2016, quando a crise econômica brutal em que se encontra esse país levou a um quadro de desemprego e fome generalizada do povo venezuelano. Além dessas ondas migratórias, há um processo contínuo de migração de bolivianos, principalmente para trabalhar na indústria têxtil e no mercado informal de São Paulo.

Os dados da Polícia Federal e do Ministério da Justiça e Segurança Pública mostram que no Brasil vivem, pelos registros oficiais, cerca de 1,2 milhão de estrangeiros, sendo mais de 264 mil venezuelanos, 118 mil haitianos e 106 mil bolivianos. Do total de imigrantes no Brasil, mais de 550 mil vivem no estado de São Paulo, principalmente na capital e em sua região metropolitana. Roraima, por sua vez, concentra a maior parte dos imigrantes e refugiados venezuelanos, cerca de 75 mil, que entram no Brasil em sua maioria pela fronteira terrestre na cidade de Pacaraima (RR).

Trabalhadores bolivianos em confecção em SP

A grande maioria dos imigrantes e refugiados que vivem no Brasil é de trabalhadores informais e de empregos precários de baixa remuneração. Os dados da Polícia Federal e do Ministério da Justiça e Segurança Pública apontam, por exemplo, que mais de 60% dos venezuelanos residentes no Brasil atuam no mercado de trabalho informal ou estão fora do mercado de trabalho. Por sua vez, grande parte dos imigrantes bolivianos no Brasil atua nas manufaturas têxteis e possuem um regime salarial baseado no pagamento por peça produzida, o que leva, inclusive, a existência de diversos casos de trabalho escravo de imigrantes bolivianos.

Diante da paralisação da atividade econômica nos grandes centros urbanos para enfrentar a crise de saúde causada pela pandemia de Covid-19, uma necessidade absoluta para controlar o contágio pelo novo coronavírus, a situação da maior parte dos imigrantes é desesperadora. Perderam boa parte de sua renda e não conseguem acessar com facilidade os programas de auxílio-emergencial, que já são insuficientes, do Governo Federal e dos governos estaduais e municipais. Reportagem da Folha de S. Paulo mostra que, diante dessa situação, vários imigrantes já estão voltando aos seus países de origem.

É também extremante preocupante a situação de saúde da população imigrante, que vive em sua maioria em casas pequenas, em favelas e bairros sem acesso a saneamento básico, superlotadas com vários membros de uma ou mais famílias e com restrições alimentares impostas pela falta de renda nesse momento. Em Roraima, A situação de boa parte dos imigrantes e refugiados venezuelanos é ainda mais grave. A maioria vive em acampamentos improvisados nas praças e ruas de Pacaraima e Boa Vista, sem acesso fácil até mesmo a água tratada. Há também cerca de 15 mil venezuelanos que estão nos 13 abrigos temporários montados pela Operação Acolhida do Governo Federal e que vivem em tendas coletivas, onde habitam de 200 a 600 pessoas num mesmo espaço.

Esse quadro social e sanitário precário em que se encontra a maioria dos imigrantes os coloca em extrema vulnerabilidade para enfrentar a pandemia. Em primeiro lugar, porque muitos serão obrigados a sair para trabalhar para colocar comida na mesa, se expondo a uma eventual contaminação pelo novo coronavírus, tendo em vista que essa população também não consegue acessar os auxílios-emergenciais. Em segundo lugar, porque as condições de habitação precária em que se encontram favorecem um processo de contaminação rápida de um grande número de pessoas.

Um plano para garantir a permanência e renda aos imigrantes no Brasil

Não bastasse a situação econômica precária em que se encontram os imigrantes, a política de imigração de Dilma, Temer e agora de Bolsonaro para lidar com as ondas migratórias é completamente ineficaz. Dados do CONARE (Comitê Nacional Para Os Refugiados) indicam que, no final de 2019, mais de 204 mil solicitações de refúgio estavam esperando análise. O CONARE analisa de 300 a 400 pedidos mensalmente, o que faz com que a maioria das solicitações demore de 2 a 3 anos para ser concluída. Ou seja, grande parte dos refugiados permanece muito tempo sem documentos definitivos, impedindo que eles possam acessar linhas de crédito e até mesmo conseguir alugar alguma moradia.

Para aqueles que optam pelo pedido de residência, ao invés de refúgio, a situação também é muito difícil, pois a política do Governo Federal é conceder visto para residência provisória por 2 anos e só autorizar o visto de residência definitivo, após esses 2 anos, se o imigrante comprovar capacidade de garantir sua subsistência no país, conforme o artigo 3º da portaria interministerial nº 9 de março de 2018. Se já era complicado para os imigrantes antes da pandemia, diante da crise econômica e da xenofobia alimentada pelo próprio Bolsonaro, conseguir estabilidade financeira, nesse momento se torna ainda mais difícil. Essa política pode gerar um quadro de milhares de imigrantes e refugiados ilegais no país, sem CPF regularizado e sem carteira de trabalho, que inevitavelmente serão empurrados pra uma situação de miséria.

Diante da pandemia da Covid-19, é necessária uma série de medidas específicas para garantir condições dignas de vida para os imigrantes e refugiados:

  • O Ministério da Justiça e Segurança Pública, chefiado por Sérgio Moro deve imediatamente, de maneira sumária e coletiva, deferir todas as solicitações de refúgio que estão na lista de espera do CONARE.
  • Também é preciso imediatamente, por rito sumário, garantir o visto de residência definitiva a todos os imigrantes que hoje usufruem da autorização de residência provisória, sem qualquer tipo de comprovação de capacidade de subsistência.
  • Por sua vez a Receita Federal deve regularizar o CPF de todos os imigrantes, por rito sumário, para permitir que essa população acesse o mais rápido possível o auxílio-emergencial do Governo Federal.

Nesse momento, é fundamental garantir a plena legalidade dos imigrantes residentes no Brasil, mudando a política xenofóbica e burocrática do governo Bolsonaro, que dificulta a regularização dos imigrantes no Brasil.

Nesse sentido, também se faz necessário mudar a política de reconhecimento dos diplomas universitários para todos aqueles que se formaram fora do país, o que atinge principalmente os imigrantes, que em muitos casos possuem cursos superior e não podem exercer sua profissão no Brasil pela falta de reconhecimento de seus diplomas. O MEC deve garantir um processo ágil e desburocratizado de reconhecimento dos diplomas, inclusive firmando acordos bilaterais com as universidades de países como Venezuela, Haiti e Bolívia, facilitando o reconhecimento dos diplomas dos imigrantes dessas nações.

Além de garantir um plano emergencial de acesso a moradias populares, saneamento básico, renda e emprego de forma emergencial aos imigrantes, como também ao conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras do país. É necessário que o Governo Federal e os governos estaduais, através dos bancos públicos, garantam uma linha de crédito a fundo perdido, taxa zero e 2 anos de carência para que os imigrantes possam garantir a remessa de dinheiro para o exterior para suas famílias. Esse é uma medida necessária, tendo em vista que são milhares os casos de imigrantes e refugiados no Brasil que garantem a subsistência de suas famílias em seus países de origem.

Os problemas dos imigrantes e dos trabalhadores só podem ser resolvidos com o fim do capitalismo

A situação precária em que se encontram os imigrantes e refugiados no Brasil, ainda pior nesse momento pela pandemia, não é fruto do acaso. É antes de tudo, uma política consciente de Bolsonaro, do Congresso Nacional e dos governos estaduais para criar um exército de mão-de-obra muito vulnerável que possa ser explorada de forma barata pelos grandes empresários e multinacionais. Essa situação também afeta o conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras, que diante da formação de um exército de mão-de-obra precarizada e desempregada de imigrantes, sofrem com uma enorme pressão para o rebaixamento dos seus salários e de seus direitos trabalhistas.

Para mudar de forma definitiva a situação de todos os trabalhadores no Brasil, sejam brasileiros ou imigrantes, é preciso destruir o regime capitalista que vigora no país e construir uma sociedade socialista, com uma economia planificada que esteja a serviço da necessidade do conjunto da classe operária e da população pobre que reside no Brasil. Nesse sentido é urgente, ainda mais nesse momento, desenvolver ações para estreitar os laços sociais de solidariedade entre trabalhadores brasileiros e imigrantes, combatendo todo o tipo de ideologia xenofóbica, para desenvolver uma luta política unitária para botar pra fora Bolsonaro e Mourão.