A companhia Vale do Rio Doce (CVRD) vem batendo recordes de lucro e produtividade nos últimos anos. Na última sexta feira, a Vale fez uma oferta de 17,6 bilhões de dólares pela mineradora de níquel canadense INCO, a maior oferta já feita por uma companhia brasileira na área de fusões ou aquisições. Caso seja efetivada, esta transação aumentará o valor de mercado da Vale para 75 bilhões de dólares.

Por outro lado, a cada dia aparecem novas evidências de que a privatização da empresa foi feita irregularmente, com subavaliação de seu valor e de suas reservas de minérios, o que vem fortalecendo a campanha organizada pela CONLUTAS, movimentos sociais e partidos políticos pela imediata reestatização da empresa.

Neste momento em que ocorre a campanha salarial dos trabalhadores da Vale e as eleições presidenciais, é hora de fortalecer a luta pela reestatização nas lutas e nas eleições.

Uma empresa estratégica para o Brasil
A Vale foi criada em junho de 1942 pelo governo de Getúlio Vargas, com o objetivo de expandir qualitativamente a exploração mineral brasileira. Em 1948, a Vale já era responsável por 80% das exportações de minério de ferro. Desde então, a empresa se tornou um símbolo do desenvolvimento nacional, com investimentos também em numerosos programas sociais.

Hoje, a Vale é a maior produtora mundial de minério de ferro e pelotas, com participação de 33% no mercado transoceânico e recursos de minério de ferro suficientes para manter os níveis atuais de produção pelos próximos 200 anos.

É a segunda maior produtora de manganês e ferroligas do mundo. Detém 11% das reservas mundiais estimadas de bauxita e direitos minerários sobre uma área equivalente a 2,5 vezes o tamanho da Bélgica. Além disso, é a maior empresa de logística do Brasil, onde opera mais de 9 mil quilômetros de malha ferroviária e dez terminais portuários próprios.

Atualmente, a Vale está presente em 14 estados brasileiros e 24 países. É responsável por 14% do transporte de cargas brasileiro e 58% da movimentação portuária de granéis sólidos. Tem valor de mercado de aproximadamente US$ 55 bilhões (126,5 bilhões de reais) e teve lucro líquido de US$ 5,564 bilhões nos últimos 12 meses, ou seja, cerca de 12,8 bilhões de reais / ano. Tudo isso fez com que as ações da CVRD tivessem uma valorização média anual de 34,6% nos últimos 5 anos (1999-2003), superando as seis maiores empresas da indústria de mineração e metais do mundo (ver tabela).

A Vale sempre teve uma participação importante na economia de Minas Gerais. É aqui em nosso estado que se localiza o chamado “Sistema Sul”, a maior e mais antiga fonte de minérios da Vale, composto por quatro complexos mineradores: Itabira, Mariana, Minas Centrais e Minas do Oeste, englobando mais de 15 minas, localizadas no Quadrilátero Ferrífero. Aqui são produzidas 120 milhões de toneladas de ferro por ano.

Infelizmente a Vale não é mais uma empresa estatal, patrimônio dos trabalhadores e do povo de Minas e do Brasil. Ela foi privatizada em maio de 1997 pelo governo Fernando Henrique (PSDB), quando o Consórcio Brasil, liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), venceu o leilão realizado na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, adquirindo 41,73% das ações ordinárias da CVRD por R$ 3,338 bilhões, o equivalente ao lucro de apenas um trimestre da empresa.

2003 2004 2005 2T/2006*
Receita Bruta 5,545 8,479 13,405 15,159
Lucro Líquido 1,548 2,573 4,841 5,564
Geração de Caixa 2,130 3,722 6,540 7,319
Investimentos 1,988 1,956 4,161 4,713

Em US$ bilhões
2T/2006*: últimos doze meses encerrados em 30.06.06
Fonte: CVRD Fact Sheet, em www.cvrd.com.br

As irregularidades na privatização
A privatização da Vale foi uma grande armação do governo FHC, que aproveitou a onda neoliberal e a ideologia do “Estado mínimo” para entregar a maior parte das empresas estatais brasileiras aos banqueiros e empresários internacionais: hoje, 67,8% das ações da Vale pertencem a investidores estrangeiros.

A entrega da Vale foi marcada duas irregularidades principais. A primeira é que a corretora norte-americana Merril Lynch foi a responsável pela avaliação do patrimônio da Vale em 3.338 bilhões de reais, levando em consideração apenas o valor das ações da empresa no mercado. Foram deixadas de fora das contas as 54 empresas onde a Vale operava diretamente (controladas e coligadas), como a Açominas, CSN, Usiminas e Companhia Siderúrgica de Tubarão; a reserva mineral, duas das três ferrovias mais rentáveis do mundo, o capital tecnológico e intelectual, os portos e o Complexo de Carajás, no Pará. Menos de um ano depois a Merrill Lynch se tornava uma das acionistas da Vale.

A segunda irregularidade foi a subestimação das reservas de minério sob controle da Vale. Segundo informações da própria CVRD à empresa norte americana Securites and Exchange Comission, as reservas de minério de ferro de Minas Gerais e da Serra dos Carajás eram de 12.888 bilhões de toneladas em 1995, muito acima dos 3,2 bilhões de toneladas anunciadas na época de sua privatização.

Além disso, a privatização da Vale foi inconstitucional por vender reservas de urânio, que são de propriedade exclusiva da União, alienar milhões de hectares de terras e permitir a exploração de minérios na faixa de fronteira, o que não poderia ser feito sem a aprovação do Congresso Nacional.
A conclusão é clara: a Vale foi sub-avaliada e maquiada, como aliás ocorreu em todo o processo de privatização das estatais, entregue a preço de banana ao capital privado. Um verdadeiro roubo.

Situação dos trabalhadores piorou
Após a privatização, a CVRD iniciou um processo de redução de custos com pessoal que causou arrocho salarial jamais visto entre os trabalhadores. De 1997 a 2004, as despesas com pessoal caíram de 16,8% para 5% do faturamento. Neste período, o reajuste salarial foi de 61,4%, enquanto a inflação ficou em 89,5%.

Para Valério Vieira dos Santos, diretor do Sindicato Metabase de Inconfidentes-MG, a Vale faz propaganda enganosa à população. “A Vale sempre diz que cumpre todas as normas de qualidade e que seus trabalhadores têm todos os direitos garantidos. Na verdade, a CVRD não cumpre nem uma terça parte do que está estabelecido na NR 22 que regula condições de trabalho em mineração, como foi apurado em recente investigação do Ministério Público de Minas Gerais”, afirma. “Além disso, os trabalhadores perderam conquistas importantes como prêmio por tempo de serviço prestado (pró-tempore), bolsa escola para dependentes de trabalhadores, e outros benefícios que entraram como moeda de troca diante do arrocho salarial”, diz Valério.

Por isso, os sindicatos estão mobilizando os trabalhadores para as negociações da campanha salarial que estão em curso, e se engajando na campanha pela reestatização, que traria benefícios aos trabalhadores e à população.

Cresce a campanha pela reestatização
Na época da privatização, houve grandes mobilizações nas ruas em defesa da Vale, criação de comitês em todo o país e uma importante manifestação no dia do leilão, que só prosseguiu devido ao enorme aparato policial que protegia o local. Além disso, dezenas de ações populares foram impetradas contra a venda da CVRD, mas infelizmente todas elas foram arquivadas.

No entanto, em Outubro do ano passado, a desembargadora federal Selena Maria Almeida determinou a reabertura do processo para apurar os danos causados ao Estado Brasileiro, o que tem ajudado a reorganizar a campanha pela reestatização.

É preciso tomar as ruas novamente, exigindo a devolução da Vale ao povo brasileiro, para que seja novamente uma empresa pública, mas desta vez controlada pelos trabalhadores da própria empresa, através de seus sindicatos e pelos trabalhadores das demais áreas em que a CVRD atua, e não pelos governos corruptos de turno.

Para defender a Vale: nem Lula, nem Alckmin
Vários setores interessados na reeleição de Lula, pretendem usar a campanha pela reestatização apenas como forma de chantagear o PSDB de Alckmin e FHC através da CPI das privatizações, recém aberta no congresso nacional.

É preciso lembrar que se o PSDB privatizou a Vale, o governo do PT não moveu uma palha para reestatizá-la e certamente não será em véspera de eleição que isso irá ocorrer.

Nós, da Frente de Esquerda, defenderemos a Vale nas ruas e nas eleições, para devolver o controle de nossas riquezas ao povo de Minas e de todo o Brasil. Reestatização já!