Declaração do PSTU sobre a tragédia em RealengoComo todos os brasileiros, foi com tristeza e horror que assistimos ao massacre de Realengo. Na manhã do dia 7 de abril, um jovem de 23 anos invadiu a escola Tasso da Silveira, no Rio, e tirou a vida de dez meninas e dois meninos à bala. O assassino Wellington Menezes de Oliveira se matou em seguida.

Em primeiro lugar, somos solidários a todas as mães, aos pais, amigos e familiares. A dor dessa perda é inimaginável. Foram 12 projetos abortados de forma tão artificial e brutal. Somos muito solidários também aos professores, que terão de conviver com este trauma pelo resto de suas vidas.

Este é um daqueles momentos que exige de nós uma reflexão mais profunda sobre o mundo em que vivemos. Analisar os fatos pontualmente pouco serve. Este foi o primeiro assassinato em massa numa escola brasileira. Porém, não pode ser reduzido ao produto simples de uma mente perversa e doente.

Uma questão mais profunda
O antes, o durante e o depois dessa história são uma pequena amostra do quanto a sociedade capitalista animaliza a humanidade. O atirador enxergou na escola o alvo para se vingar de um mundo doente, do qual ele foi a máxima expressão naquela quinta-feira de abril. Escola onde ele, portador de esquizofrenia, estudou durante anos, sofrendo bullying.

A doença de Wellington nunca foi tratada. Os projetos pedagógicos para portadores de necessidades especiais são fantásticos, mas só existem no papel. E como poderiam ser executados num país onde a educação é a primeira atingida pelos cortes de verbas? Cortes que servem para desviar o dinheiro para o pagamento da dívida pública.
Sem investimento, não há qualificação profissional. Os professores, ainda que identifiquem os problemas, não têm meios para agir. Aliás, eles mesmos são acometidos por doenças psicoemocionais provocadas pelo trabalho. São muitas horas trabalhadas para um salário miserável. Frequentemente, sofrem agressões morais e físicas de alunos e até de pais.

Soma-se a isso o preconceito contra os portadores de distúrbios. A sociedade capitalista alimenta esse tipo de discriminação, porque não é interessante investir em saúde. O tratamento exige uma estrutura diferenciada com profissionais altamente qualificados. Os medicamentos são absurdamente caros. Muitos deles – normalmente os mais eficazes – ainda não tiveram a patente quebrada.

No entanto, essa mesma sociedade é a causadora de um aumento imenso nos casos de doenças psicoemocionais. Pesquisas já indicam que esses transtornos estão chegando ao topo da lista de doenças do trabalho.

Mas a doença por si só não explica o crime. Houve um histórico que levou Wellington a dar este desfecho para seus delírios. Em sua cabeça, estava se vingando da discriminação que sofrera na infância. Discriminação que é fruto de uma ideologia que impõe padrões de comportamento e normalidade, que estimula o individualismo e o egoísmo.

O ser humano passa a ser mais uma coisa num mundo de mercadorias. A miséria crescente traz consigo a brutalidade. O capitalista precisa pagar cada vez menos pela força de trabalho, precarizar as condições de vida do ser humano e promover a violência – como as guerras – para aumentar seus lucros e garantir seu domínio.
No Rio de Janeiro, em particular, tornou-se normal assistir à polícia subindo os morros para matar a população pobre. A chacina promovida pelo Bope ganha status de heroísmo em nossa sociedade, e a política de segurança do governador Sérgio Cabral é aplaudida de pé pela classe média e pela burguesia carioca. No meio disso tudo, que valor tem uma vida? Quem, afinal, é responsável pelo aumento da violência?

Tragédia como espetáculo
A comoção provocada é totalmente justificada. Porém, com a tragédia consumada, a imprensa e o governo trataram de tirar o máximo proveito possível. A questão era: como aproveitar o episódio para, de alguma forma, aumentar a audiência das emissoras de TV e ainda ampliar a repressão sobre a população?

A tentativa de ligar o assassino a algum grupo fundamentalista islâmico beirou o ridículo, mas serviu para gerar confusão e xenofobia. Já os políticos se aproveitaram da desgraça para tentar reverter uma derrota do passado. Em 2005, no plebiscito do desarmamento, a população rechaçou a proibição da venda de armas de fogo. Agora, em meio ao sofrimento geral, o senador José Sarney – um símbolo da corrupção do país – se apressou em chamar uma reunião para discutir a possibilidade de um novo plebiscito. Querem fazer crer que a raiz da violência está no comércio de armas e munição em nosso país, e não na degradação da situação social, pela qual os políticos são responsáveis. Falam em desarmar a população e fazer com que o Estado, através de seu aparelho repressor, assuma a condição de protetor da sociedade. Mas quem confia, em sã consciência, na polícia como ela está organizada atualmente?
José Sarney e o Congresso estão se lixando para os problemas cotidianos que os trabalhadores sofrem. Recentemente votaram um salário mínimo de fome para a população, enquanto aumentaram seus próprios salários em quase 62%, indo para R$ 26.700.

Ao receber a notícia, a presidente Dilma chorou. Mas ela foi a responsável pelo maior corte orçamentário dos últimos anos. Mais de R$ 50 bilhões foram retirados do orçamento da educação, da saúde e dos serviços públicos, o que vai degradar ainda mais as condições de vida da população.
Não foi apenas Wellington que matou aquelas crianças. O crime também teve outros atiradores: a sobrecarga de trabalho, a falta de lazer, o preconceito, a precarização da saúde e da educação, a violência policial, a criminalização dos movimentos sociais e da pobreza, a ideologia burguesa, a falta de perspectiva e de sentido para a vida.

O que os trabalhadores precisam o sistema capitalista não pode dar. Só os próprios trabalhadores podem lutar e construir esse mundo onde um ser humano não é dono do outro e em que todos tenham os mesmos direitos e deveres.

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