Em seu depoimento, deputado reitera acusações. Ex-secretária de Marco Valério, acusado de operar “mensalão”, denuncia ligações entre agência de publicidade e esquema do PTO depoimento de Roberto Jefferson, líder do PTB e pivô dos escândalos de corrupção que detonaram a mais grave crise política nos últimos anos, foi apenas mais um aperitivo do que vem por aí. Jefferson confirmou todas as denuncias que fez nas suas duas entrevistas ao jornal Folha de S. Paulo, voltando a apontar o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, como um dos coordenadores no esquema do “mensalão”.

Usando da mesma desenvoltura e da mesma dose de cinismo e hipocrisia dos tempos em defendia Collor de Mello, Jefferson esteve senhor de si no discurso de abertura.
Atacou Delúbio, Silvio Pereira (secretário-geral do PT), José Dirceu (Casa Civil), enumerou uma porção de parlamentares do PL e PP que recebiam o “mensalão” e disse ainda, na maior cara de pau, que nunca foi corrupto.

Na abertura, Jefferson pediu para Dirceu sair do governo e, como vem costumeiramente fazendo, tentou preservar o presidente Lula. “José Dirceu, se você não sair, vai fazer réu um homem inocente que é o presidente Lula”, declarou.
Sobre Delúbio, disse que recebeu a proposta do “mensalão” em casa: “Atendi ao Delúbio em minha casa. Com o conhecimento do Genoino, sem o Marco Valério (publicitário que segundo Jefferson trabalha com Delúbio). Ele fumou um charuto. É um homem simples. Com jeito goiano, cheio de melindres. Ele falou que estava ali para ajudar a tirar uma unha encravada. É assim que ele fala. Ajudar a tirar algum problema na minha bancada. Ajudar a alguém que precise”.

No seu depoimento a Comissão de “Ética” da Câmara, o deputado confessou ter cometido crime eleitoral e que o dinheiro usado para o mensalão e uma “contribuição” eleitoral dada pelo PT ao PTB nas eleições de 2004 provinham de empresas estatais que possuem ligações – a palavra certa é contratos de licitações – com estatais. “Todo mundo sabe disto. Nas campanhas eleitorais, todos os partidos recebem dinheiro destas empresas. Não há um partido que faça diferente disto”, respondeu Jefferson a um deputado da Comissão.

O presente dado pelo PT ao PTB, segundo o petebista, teria sido de R$ 4 milhões, entregues em duas malas, que não foram declarados ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Jefferson se recusou a dizer os nomes dos políticos do PTB que receberam o dinheiro: “Eu vou dizer os nomes quando o PT esclarecer as origens dos recursos. Aí eu abro quem recebeu”.

No decorrer das perguntas feita pelos membros da Comissão, Jefferson bateu boca com deputados acusados por ele de receber o “mensalão” e atendeu ainda a algumas súplicas de alguns parlamentares que queriam saber se nos seus partidos alguém teria recebido o “mensalão”. Generoso para alguns, o deputado respondia: “Não, deputado, no seu não tem”.

A testemunha
Enquanto Roberto Jefferson deitava e rolava na Comissão de Ética da Câmara, o site da revista Istoé Dinheiro publicava uma entrevista com Fernanda Karina Ramos Somaggio, a ex-secretária do publicitário Marcos Valério, acusado de ser um dos operadores do “mensalão” do PT. A entrevista foi realizada no dia 2 de junho, portanto, antes da revelação do “mensalão” feita por Jefferson no último dia 7.

Karina revela que no período em que foi secretária, entre abril de 2003 e janeiro de 2004, na agência do publicitário, a SMP&B, possuía intimas relações com Brasília. Ocupando uma posição privilegiada na agência, uma vez que agendava os compromissos de Valério, Karina endossa as denúncias de Jefferson dizendo que o interlocutor mais freqüente de Valério era Delúbio Soares. “Eles se falavam pelo menos uma vez por semana”, afirma. O segundo da lista era Sílvio Pereira do PT. Mas, segundo a secretária, isso não seria exclusividade dos dois dirigentes petistas. “O Dirceu e o Marcos Valério falavam diretamente”, disse a secretária.

De acordo com ela, os encontros eram“sempre em hotéis, tudo na surdina”. Também disse ter visto sair malas de dinheiro do escritório da agência. “Às vezes, mandavam tirar R$ 1 milhão, em dinheiro, no Banco Rural”. Suas acusações atingem inclusive membros do governo FHC, como o ex-ministro das Comunicações Pimenta da Veiga, que teria recebido R$ 150 mil da SMP&B, em duas parcelas. A agência SMP&B possui contas de publicidade em várias estatais como o Banco do Brasil (BB), Correios e ainda da Câmara dos Deputados.

Karina conta um pouco com o seu ex-chefe mantinha esses contratos. “O Marcos Valério dá muitas festas para eles (dirigentes do BB), muitos paparicos, muitos mimos”. Festas em que, segundo ela, “rolava dinheiro, rolava mulher”.

A esperança escorre pelo ralo
A enxurrada de denúncias contra o governo Lula não pára. A lama não invade somente o Planalto e os escritórios do PT no Centro de São Paulo. Ela também inunda os gabinetes parlamentares do Congresso e expõe as turvas negociatas entre empresários e políticos incrustados na “fabriquinhas” (cargos de estatais loteados entre os partidos). O avanço das denúncias de corrupção cresce na mesma proporção da imensa decepção popular com o governo do PT. Sentimento esse que aprofunda a crise do conjunto das instituições da democracia dos ricos e corruptos. O desencanto promove, certamente, a ruptura de milhões com o governo que enxergam suas esperanças, que já estavam um tanto abaladas depois de dois anos de um governo neoliberal, escorrerem pelo ralo. Até o momento, Lula tenta passar a impressão de desdém à crise, dizendo estar mais preocupado com as partidas do Corinthians. Faz isso porque acha que está “blindado” das denúncias. Seguindo o rastro de Delúbio, entretanto, esse desdém pode não durar muito tempo.