O caos dos transportes públicos afeta milhões de trabalhadores em todo o país. Para falar dessa situação e da campanha salarial dos metroviários de São Paulo, o Opinião entrevistou o presidente do Sindicato dos Metroviários, Altino PrazeresComo você avalia a crise no transporte público, que não
afeta apenas São Paulo, mas todo o Brasil?

Altino Prazeres – Fizemos um seminário no sindicato e a conclusão foi de que existe uma priorização histórica do modelo rodoviário em contraposição ao metroferroviário, que significa transporte sobre trilhos.

Há países, como os EUA, em que o modelo metroferroviário é maior do que o rodoviário. No Brasil, é justamente o inverso. Aqui 70% do transporte são feitos pela rodovia. Isso afeta tanto o transporte da carga quanto a locomoção das pessoas nas grandes cidades e explica as razões do caos dos engarrafamentos.

Na verdade, existe, em nome das multinacionais automobilísticas, uma prioridade do transporte rodoviário. E no Brasil, ao contrário dos outros países, também houve um desmonte do que existia da malha ferroviária. A malha ferroviária do Brasil foi destruída. E agora, com o caos do trânsito, começa uma discussão muito importante sobre quais são as saídas. Obviamente, volta a proposta sobre a adoção do modelo metroferroviário. O desmonte da malha ferroviária, a falta da adoção de um modelo metroferroviário levou o nosso país a acumular décadas de atraso quanto ao transporte. O investimento público neste tipo de modelo seria a solução para o caos do trânsito e, também, para o transporte de cargas em geral no país, da produção industrial e agrícola.

No entanto, os governos não estão dispostos a financiar esse modelo. Veja o caso de São Paulo. Com o atual ritmo de construção do metrô da capital paulista, seria preciso, no mínimo, 60 anos para alcançar os 200 quilômetros de metrô necessários para atender a população.

Outro problema é que esse desmonte também influenciou a alta tarifa dos transportes. Aqui em São Paulo – e sabemos que em muitas outras cidades também – a tarifa aumentou muito mais do que a inflação. A população pobre e trabalhadora é mais penalizada. Nós achamos que o transporte deve ser subsidiado pelo poder público para que os trabalhadores paguem uma tarifa muito abaixo do valor que é cobrado hoje. A alta tarifa mostra que os governantes estão privando a população de seu direito ao transporte.

Como o sindicato está levando essa discussão para a população?
Altino – Desde dezembro, estamos distribuindo panfletos à população. Já distribuímos mais de 100 mil cartas aos usuários do sistema nas principais estações de metrô. Também estamos distribuindo um jornal na porta das estações. Nosso objetivo é dialogar com a população. Um dos temas que abordamos é justamente da tarifa abusiva. Em nossos materiais, mostramos como a tarifa do metrô de São Paulo é uma das mais caras do mundo, muito acima da inflação.

Também participamos dos protestos contra o preconceito social manifestado pelos moradores de Higienópolis, tradicional bairro de elite da cidade. O Sindicato dos Metroviários de São Paulo repudia a atitude servil do governo Alckmin, de alterar o projeto original da construção da estação Angélica da Linha 6-Laranja, sucumbindo à exigência de uma ínfima parte de moradores que, movida pelo preconceito, recusou o metrô no bairro. Essa elite alegava que o metrô poderia trazer “gente diferenciada” ao bairro, isto é, trabalhadores pobres. Por isso, fomos ao “churrascão da gente diferenciada” para mostrar que estamos favoráveis à ampliação das linhas de metrô.

Qual é a situação dos trabalhadores do metrô hoje?
Altino – O lema da nossa campanha salarial este ano é “Chega de sufoco”. Isso porque queremos mostrar tanto a insatisfação da população quanto a dos trabalhadores do metrô. Há uma terceirização enorme, acompanhada por uma política de privatização através das Parcerias Público-Privadas (PPPs), já implementada na linha 4-Amarela, cuja construção ficou tristemente conhecida pelo desastre da estação Pinheiros que desabou e matou sete pessoas em 2007. Além disso, essa política de PPPs está sendo estendida pelo governo federal em algumas linhas que são controladas pelo Estado. Somos contra essa privatização disfarçada, contra a terceirização e os ataques aos direitos dos trabalhadores.

Por outro lado, constatamos que houve um aumento enorme de usuários, enquanto o número de trabalhadores metroviários não cresceu na mesma proporção. Estão faltando seguranças no metrô, agentes de estação, operadores de trem, pessoal da manutenção. Inclusive está faltando gente para o setor administrativo.

Se não houver hora-extra, o metrô não funciona. Se os metroviários resolvessem parar de fazer horas-extras, o metrô iria parar também. Por exemplo, se os seguranças não fizerem horas-extras, não tem gente pra garantir a segurança de eventos como os jogos de futebol. O sindicato é contra essa superexploração. Por isso, na última assembleia da categoria, orientamos os trabalhadores a não realizarem mais horas-extras.

Além dessa superexploração, há uma defasagem salarial. Os metroviários de 15 anos atrás tinham um determinado nível salarial. Hoje, porém, o nível é muito mais baixo. Combinado com isso, o metrô contratou os novos trabalhadores com salários muito menores. Isso criou uma realidade muito distinta entre os salários dos antigos e o salário dos novos. Na verdade, há uma redução dos salários que vem se acumulado por anos. Vamos fazer uma assembleia no próximo dia 26. Nossa campanha chegou a um momento decisivo. Caso o governo se mantenha intransigente, os metroviários de São Paulo podem parar.
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