Fundador do trotskismo no Brasil, Pedrosa tem sua história intimamente relacionada às bienaisA ocorrência da 26ª Bienal de São Paulo é uma excelente oportunidade para resgatarmos um pouco da história de Mário Pedrosa (1900-1981), um dos mais importantes militantes socialistas que este país já teve, e um dos poucos que conseguiu intercalar uma intensa atividade política com uma produção intelectual que faz dele referência obrigatória, até hoje, na reflexão e crítica sobre a arte brasileira e universal.
Defensor de que a arte e a política são as duas formas mais elevadas da expressão humana e de que, conseqüentemente, a única postura que se possa ter diante delas é a do engajamento militante e crítico, Mário envolveu-se nestes dois universos desde a juventude.
No campo da arte, seu currículo é extensíssimo. Atuando como jornalista, foi crítico de arte em vários jornais e dirigente da Associação Internacional de Críticos de Arte (1957-1970) e de sua seção brasileira. Foi curador da II Bienal de S. Paulo (1953), secretário-geral da IV Bienal e diretor do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Quando esteve exilado no Chile, fundou o Museu da Solidariedade, um dos mais importantes do país.
Contudo, mais importante ainda do que sua atuação prática no mundo artístico foi o legado que ele deixou em termos teóricos. Auto-didata, Pedrosa exerceu como poucos a liberdade crítica, não se submetendo aos padrões estabelecidos e muito menos à imposição do olhar acadêmico e tradicional sobre a arte. Muito pelo contrário. Esteve à frente da defesa de todas as manifestações e movimentos que apontavam para a ruptura e o radicalismo: da Semana de Arte Moderna de 22 ao surrealismo; do abstracionismo ao concretismo.
Coerente com defesa de que a arte tem um potencial libertário e revolucionário em si própria, em 1945, ele publicou no jornal Vanguarda Socialista editado juntamente com Patrícia Galvão (a Pagu) e Geraldo Ferraz o Manifesto por uma Arte Revolucionária Independente, elaborado anos antes pelo artista surrealista André Breton e por Trotsky, como resposta tanto à banalização da arte pelo capitalismo quanto seu cerceamento pelo stalinismo, através da imposição da estética do realismo socialista.
Foi essa visão que Pedrosa ajudou a impregnar na II Bienal, que trouxe para o Brasil não só o Guernica, de Pablo Picasso, como obras dos principais mestres da vanguarda artística daquele momento: surrealistas, cubistas, futuristas e abstracionistas, como Paul Klee, Mondrian, Calder, Edvard Munch, Marcel Duchamp e Juan Gris.
UMA TRAJETÓRIA QUE SE CONFUNDE COM A DO TROTSKISMO
A vida política de Mário Pedrosa também foi das mais ricas. Militante desde muito jovem, ele enfrentou várias prisões, nas décadas de 20 e 30, e teve que se exilar em três oportunidades, devido a perseguição de distintas ditaduras: o Estado Novo de Vargas, o golpe de 1964 e a sangüinária ditadura de Pinochet, no Chile.
No que se refere à luta pela construção do socialismo no Brasil, sua contribuição é inestimável. No final da década de 20, quando ainda militava no Partido Comunista Brasileiro, levantou, juntamente com Lívio Xavier, uma série de críticas às práticas e diretrizes do partido e, sintonizado com os debates internacionais em relação à condução burocrática e contra-revolucionária de Stalin (na III Internacional e na ex-URSS), aproximou-se das posições de Leon Trotsky.
O resultado foi a criação da Oposição Internacional de Esquerda no Brasil e, posteriormente, a fundação da Liga Comunista Internacionalista (1931), com Fúlvio Abramo e Aristides Lobo, dentre outros. Sua reconhecida atuação na construção de uma alternativa revolucionária, diante das traições do stalinismo, fez com que, em setembro de 1938 quando da realização da Conferência de Paris, que fundou a IV Internacional Mário Pedrosa fosse o delegado representante de todas as seções da Oposição de Esquerda na América Latina.
De lá até a sua morte, apesar de ter feito algumas opções incorretas, Pedrosa foi um incansável defensor da necessidade de construção de um partido operário, o que o fez ser um dos fundadores do PT, em 1981.
Particularmente no que diz respeito à história do PSTU, também devemos muito a ele. Uma das correntes que participou da fundação do partido, a Convergência Socialista, tem sua origem nas orientações que Mário Pedrosa deu a um grupo de militantes brasileiros que se encontrava no Chile, no início da década de 1970.
SAIBA MAIS
O que ler?
Para conhecer as idéias de Pedrosa sobre arte, as melhores leituras são seu livro “Mundo, Homem, Arte em Crise“ e “Mário Pedrosa: Itinerário Crítico“, organizado por Otília Beatriz Fiori Arantes. Já sobre sua contribuição política há “Solidão Revolucionária“, de José Castilho Marques Neto, e “Na Contracorrente da História“, livro de Dainis Karepovs que relata a história do trotskismo no Brasil. Vasta documentação sobre a vida e a obra de Pedrosa pode ser encontrada no Centro de Documentação do Movimento Operário Mário Pedrosa, hoje vinculado à Universidade do Estado de S. Paulo (Unesp).
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