Livre-comércio serve às multinacionaisA recente escaramuça comercial entre os governos da Argentina e do Brasil colocou em debate o papel do Mercosul, projeto de livre-comércio entre os países do Cone Sul da América Latina. O estopim da crise ocorreu quando o governo de Néstor Kirchner decidiu impor uma barreira tarifária aos produtos eletrônicos produzidos no Brasil, taxando as mercadorias em 21%. A barreira afeta principalmente os produtos da chamada linha branca, ou seja, eletrodomésticos como geladeiras, fogões e máquinas de lavar.

Caminho livre para as multinacionais

A barreira imposta por Kirchner explicitou os reais beneficiários do livre-comércio entre os países do Mercosul. Pressionado por empresários argentinos, o presidente argentino foi obrigado a barrar os eletro-eletrônicos produzidos no Brasil, que invadiram o mercado de seu país. Entre os meses de janeiro e junho de 2003, o Brasil exportou cerca de R$ 6,7 milhões em máquinas de lavar para o país vizinho. Neste ano, as exportações no mesmo período cresceram para R$ 17 milhões.

Com o anúncio das barreiras, Sony e Semp Toshiba declararam que suspenderão temporariamente as exportações para a Argentina. Isso porque essas empresas, assim como várias outras multinacionais que atuam na Zona Franca de Manaus, utilizam o Brasil como plataforma de exportações para outros países. Daí a necessidade de uma área livre de barreiras alfandegárias.

Essa situação se aprofundou com o colapso da economia argentina. Diversas multinacionais que estavam instaladas no país se transferiram para o Brasil, beneficiando-se também da desvalorização do real que barateava seus custos. Foi o caso da empresa Whirpool, proprietária da Multibrás, detentora de marcas como Brastemp e Cônsul, que saiu da Argentina para se instalar em Joinville (SC). Outras empresas que não saíram definitivamente da Argentina concentraram seus investimentos no Brasil, favorecendo-se do livre-comércio entre os países. A Fiat é outra beneficiária do Mercosul. Produtora de motores em Córdoba, na Argentina, exporta-os para Minas Gerais, para depois reenviá-los nos carros já montados para aquele país.

Não é difícil perceber quem são os grandes interessados na política de livre-comércio entre os países: as empresas transnacionais, devido à sua maior capacidade de deslocamento na busca por mais lucros.

Enquanto isso, os governos dos respectivos países, como Argentina e Brasil, defendem políticas como se estivessem defendendo a soberania nacional. Nada disso. Estão apenas seguindo a imposição das multinacionais.

Essa é a grande jogada do Mercosul, da Alca e do Nafta: o livre-comércio para as multinacionais. Não é à toa que os maiores interessados no livre-comércio sejam os EUA, que possuem a maior concentração de multinacionais do mundo.

União das multi, divisão dos trabalhadores

Apesar da recente atitude do governo argentino, Kirchner já declarou reiteradas vezes seu entusiasmo no fortalecimento do Mercosul. Como resposta à pequena divergência entre os governos, a Força Sindical protagonizou esdrúxulas manifestações pedindo que Lula tome medidas mais duras contra a Argentina. Para a direção da central pelega, os trabalhadores argentinos tomam os empregos dos brasileiros.

A Força Sindical presta um grande desserviço à união da classe. O problema não está entre os trabalhadores. A disputa pelo emprego é resultado da política das empresas que estão preocupadas em aumentar lucros e não em criar novos postos de trabalho. Basta observar que o recente aumento de produção brasileiro não veio acompanhado de empregos e, sim, de horas extras.

Por isso, a campanha da Força Sindical deve ser repudiada. Ao contrário, devemos chamar a unidade dos trabalhadores argentinos e brasileiros contra as empresas e por uma campanha de exigência por redução da jornada de trabalho e abertura de novos postos.
Post author Diego Cruz, da redação
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