Em Itapecerica da Serra, região a 33km da capital paulista, cerca de 3 mil famílias sem-teto lutam pelo direito à moradia. A ocupação, batizada de João Cândido, resiste a uma ordem de despejo e é exemplo de luta e organização. O Portal do PSTU conversou com Guilherme Boulos, coordenador estadual do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), que falou mais sobre o acampamento.

Portal do PSTU – Como começou o acampamento e como está hoje?
Guilherme
– O acampamento João Cândido iniciou dia 16 de março com a ocupação, por famílias sem-teto da região, de um grande latifúndio urbano de 1 milhão e 300 mil metros quadrados, que vinha há mais de 20 anos servindo à especulação imobiliária. Logo nos primeiros dias, o judiciário deu uma liminar de reintegração de posse, mas fizemos, nesse mês, uma série de lutas importantes que conseguiram garantir, até agora, a permanência das famílias. Fizemos duas marchas em Itapecerica, uma delas com mais de 3 mil pessoas. Fizemos uma marcha com mais de 5 mil pessoas ao Palácio do Bandeirantes. Com isso, conseguimos abrir negociação com as três esferas de governo para que eles consigam a solução definitiva para o problema de moradias das famílias, mas sabemos que isso só vai ser efetivado com a continuidade da mobilização.

Como é o dia-a-dia no acampamento? Como as pessoas estão fazendo para sobreviver nessa difícil situação?
Guilherme
– Temos um forte empenho em garantir a organização coletiva. Se você pega 3 mil famílias, não tem como garantir o diálogo direto com todas elas, se, por exemplo, fizermos uma assembléia, de maneira que dividimos o acampamento em grupos. São 39 grupos que variam de 70 a 120 famílias. Cada um destes grupos elege um coordenador e os coordenadores de todos esses grupos compõem a coordenação do acampamento, mantendo uma circulação de informações, de propostas entre todos os acampados e a coordenação política do movimento. Cada um desses grupos tem cozinhas coletivas, banheiro e um setor de infra-estrutura, que cuida da construção de espaços coletivos, como barracões de reunião. E cada um desses grupos tem uma comissão de disciplina, que garante que seja seguido o regimento interno aprovado em assembléia, que possibilita uma coexistência baseado no respeito e no trabalho coletivo. Então, isso garante não só a sobrevivência, mas a participação política dessas famílias, que é fundamental.

Tem agora uma liminar de despejo com prazo para o dia 7 de maio. Como os moradores convivem com a permanente ameaça de repressão?
Guilherme
– Sabemos que toda e qualquer conquista só virá através da luta. A ameaça de despejo é permanente no acampamento. Então, nós respondemos a isso de duas maneiras: com organização e formação política, que é um primeiro braço mais interno, e com mobilização. O despejo deveria ter ocorrido há 2 semanas, conseguimos esse prazo para 7 de maio através de mobilizações. E vamos tentar conseguir mais prazos até que haja uma negociação conclusiva. Mas, se precisar tomar medidas mais combativas, estamos dispostos a tomar, como uma forma de auto-defesa, de resistência popular.

Qual é o calendário de mobilizações que o movimento está preparando?
Guilherme
– O MTST se integra ao calendário geral construído pelos sindicatos, pela Conlutas, em unidade com os outros movimentos populares, o que pra nós é essencial. Sozinhos, não temos condições de dar resposta para o problema de moradia no país. Mas uma articulação de movimentos pelo direito de moradia e outros direitos sociais tem condições de dar uma resposta à altura, e isso é o que estamos tentando construir.