A esquerda brasileira precisa rediscutir o programa para o campo. Até hoje, predominou no movimento a bandeira da reforma agrária.

Mas o avanço do agronegócio, como expressão da globalização no campo, explicitou um movimento central, que já vinha ocorrendo, de fusão dos antigos coronéis latifundiários com a grande burguesia industrial, comercial e bancária para compor a classe dominante no campo. Hoje, são os grandes bancos e empresas nacionais (como o Bradesco e a Votorantim) e multinacionais (como a Cargill) que mandam no campo, produzindo para exportação em grandes propriedades, com máquinas modernas e sementes transgênicas.

O proletariado rural é superexplorado com salários baixíssimos e condições brutais de trabalho, com uma parte de trabalhadores temporários – os boias-frias. Convivem com pequenos proprietários que mantêm a agricultura familiar, de grande importância para a produção de alimentos como feijão e arroz, e absorvem uma parte importante da mão de obra.

Ao lado disso, temos os sem-terra, o mais importante movimento social do campo das últimas décadas, imprensado pelo avanço do agronegócio e por sua cooptação ao governo Lula. A base social de camponeses sem-terra aponta para o programa de divisão das terras em pequenas propriedades, mas isso é contraditório com a produtividade superior das grandes empresas capitalistas.

A cooptação ao governo Lula impede a extensão das ocupações, o método tradicional da luta pela terra, que diminuíram, e impõe uma limitação ainda maior do programa para se encaixar nos limites legais. Por isso, ocorreu a luta pela revisão nos índices de produtividade da Constituição de 1988, que permitiriam ampliar a porcentagem das terras improdutivas para a reforma agrária. Mas essa luta legítima, ainda que limitada, não toca no maior problema do campo brasileiro: o que fazer com as terras produtivas do agronegócio?

Não basta a reforma, é preciso uma revolução
A burguesia brasileira não realizou a reforma agrária. Hoje, a burguesia é uma inimiga ferrenha dessa possibilidade, e cabe ao proletariado encabeçar uma luta histórica por essa bandeira. Mas, a nosso ver, é preciso associar a luta pela reforma agrária à a revolução no campo, expropriando as terras do agronegócio e as colocando sob controle dos trabalhadores. Só assim seria possível redirecionar o campo brasileiro para responder às necessidades do conjunto dos trabalhadores, e não aos lucros da burguesia.

A produção deixaria de ser pautada pelas necessidades da exportação e passaria a responder às necessidades de alimentação do povo, exportando o que sobrasse.
Os preços não seriam determinados pelo mercado mundial e nem pela necessidade de lucros das grandes empresas. O resultado seria a redução do preço dos produtos, como o álcool, cujo litro poderia custar menos de um real (hoje esse combustível é produzido por menos de cinquenta centavos). A carne poderia ser vendida pela metade do preço (hoje a arroba, que equivale a mais ou menos 14,6 quilos, é vendida aos atacadistas por 75 reais).

É preciso encarar a necessidade de expropriar o agronegócio. Desviar a discussão para a questão de “terras produtivas contra não produtivas” permitirá à burguesia agrária prosseguir na ofensiva contra a luta pela terra.

Por outro lado, é importante obter o apoio do proletariado urbano para a luta no campo, algo que não se faz apenas com a solidariedade natural entre explorados e oprimidos. É preciso mostrar como a expropriação do agronegócio poderia melhorar a vida dos trabalhadores, com a redução nos preços dos alimentos e combustíveis.
Hoje, a luta do proletariado rural superexplorado é de grande importância. O setor pode assumir o primeiro plano das lutas no campo brasileiro, por sua concentração e grau de exploração. Os trabalhadores rurais podem ganhar uma importância enorme, não só pelas lutas mínimas, mas também porque podem sustentar a batalha estratégica da expropriação do agronegócio, colocando-a sob seu controle.

A luta pela reforma agrária
Esse conjunto de medidas, por outro lado, não significa ignorar ou desconsiderar o anseio pela repartição das terras, incorporado na consciência dos atuais sem-terra. Essa consciência se faz presente também em parte importante do próprio proletariado rural, pela origem recente em camadas de pequenos proprietários arruinados ou que viraram sem-terra. O programa para o campo terá de ser decidido concretamente pelos que nela trabalham. Mesmo uma grande propriedade produtiva deverá ser repartida, se assim entenderem os trabalhadores. Na Revolução Russa, Lênin teve essa postura após a tomada do poder pelos bolcheviques.

Uma proposta de reforma agrária deve ter como meta assentar cerca de cinco milhões de famílias sem terra. O custo para o auxílio imediato a essas famílias é menos da metade dos cerca de 300 bilhões de reais gastos pelo governo Lula para ajudar as grandes empresas durante a crise no início do ano.

Será fundamental assegurar não apenas o direito dos trabalhadores sobre o que fazer com as terras, mas também dar todo o apoio necessário em termos de crédito bancário e tecnologia aos pequenos proprietários. Atualmente, os financiamentos são privilégio da burguesia.

Além disso, é fundamental enfrentar o problema da violência no campo, imposto pelos jagunços das grandes empresas e pela própria polícia. Isso significa exigir a prisão dos jagunços e seus mandantes, que devem também ter suas propriedades expropriadas.
Mas tudo isso implica combater abertamente o governo Lula, o governo do agronegócio. E exigir do MST que rompa com ele que, além de tudo, chama os sem-terra de “vândalos”.
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