Carol Benzaquen
Redação

Ativista do movimento LGBT lança nota pública sobre a sua entrada no PSTU

Leia abaixo a carta na íntegra:

“Aos ativistas LGBT’s e de todos os movimentos sociais,

Vivemos em uma sociedade capitalista que promove cruelmente diversas opressões, infelizmente fui dar conta disso muito tarde, somente depois de sentir na pele o seu poder de destruição. Escrevo essa carta a todos os militantes que conviveram comigo, que conhecem minha trajetória, que atuam ou tem interesse no sucesso do movimento LGBT. Escrevo para explicar aos companheiros e companheiras minha última decisão: porque entrei no PSTU.

Comecei a me organizar politicamente muito nova, primeiro com o grupo de Jovens da Comunidade Católica do meu bairro por influência da minha família, tradicional, conservadora e católica, em seguida com o Movimento Estudantil nas escolas, mesma época que me filiei no Partido dos Trabalhadores onde fiquei por 9 anos.

Em 2005, iniciei minha militância no movimento LGBT em Contagem, desde então vivenciei muitas histórias de luta e decepção, somente hoje, depois de ter experimentado essas sensações que posso compreender, avaliar e decidir com consciência o melhor caminho para combater o capitalismo e suas opressões. Vi nascer e crescer um grande movimento. Aliás, o maior que já vi em Contagem. Nada, nem ninguém, levou mais pessoas para as ruas da cidade nos últimos anos que o Movimento LGBT. A cada ano, percebia o nosso crescimento enquanto movimento social, seu amadurecimento político e suas intervenções na cidade.

Recebi a difícil missão de liderar este movimento na cidade, onde passei por várias situações que hoje posso entender que nada mais são que as pressões da sociedade capitalista sobre nosso movimento. Uma das que me senti mais incomodada foi quando um ex-secretário da prefeitura me pediu para reconsiderar o local de concentração da Parada do Orgulho LGBT de Contagem, visto que existia um pedido da CDL, do Big Shopping e da CONPAQ (Conselhos de Pastores de Contagem) à Prefeitura de Contagem para a retirada da parada daquele local. A CDL e o Big Shopping reclamavam que a Parada atrapalhava as vendas do Dia dos Pais e a CONPAQ que a concentração era em frente à Igreja e atrapalhava o Culto da mesma. O que foi triste não foi a manifestação deste setores, que já era esperada e rotineira, mas sim o fato do PT, que governava a prefeitura, fazer coro com estes setores reacionários. Foi quando me dei conta que o PT já não era mais o partido para chamar de “meu”, pois ele já não mais defendia as nossas lutas, mas os interesses de uma classe dominante atrasada e mesquinha. Resisti, junto com outros companheiros e companheiras, à mudança de local, porque julgávamos que os LGBT´s tinham direito a fazer sua parada no local de maior visibilidade da cidade. Infelizmente, no ano passado, o PT conseguiu o que queria e a parada mudou de lugar.

Esses desgastes que aconteceram tanto na minha relação partidária, quanto no grupo que participava que no meu entender atuava de maneira governista, prejudicando os avanços das políticas publicas LGBT na cidade, esta percepção acabou culminando na minha desfiliação do PT e em uma dissidência no movimento, onde eu e mais alguns companheiros com o mesmo entendimento, fundamos o Movimento Organizado de Combate à Homofobia (MOOCAH) que nasceu em outubro de 2010 com uma ideia de movimento independente, pautado pela luta incansável contra o racismo, machismo e homofobia.

Essa dissidência não foi fácil, onde no primeiro ano com dois movimentos na cidade passaram mais tempo se desgastando como pares do que enfrentando o real e poderoso inimigo, o capitalismo que impera sustentando a homofobia cada vez mais visível em Contagem. Um erro que quase custou caro e que só favoreceu nossos inimigos, os homofóbicos. Erro que assumo minha parcela de culpa, talvez por falta de amadurecimento político, talvez motivada pela inflamação dos ânimos no ápice das disputas entre os movimentos.

O MOOCAH sofreu com uma onda de calúnias, principalmente no período da II Conferência Estadual LGBT, onde foi acusado de defender o Governo do Estado, sem sequer ser consultado por aquele que os acusaram, de forma até descuidada, que nem perceberam que o MOOCAH assinou e ficou do lado de todas as moções de repúdio contra o Governo Tucano. Acredito que talvez tenha sido mais envolvimento das emoções do que “descuido”, uma entidade que tirou na marra a I Conferência Municipal LGBT de Contagem, onde teve audiência com secretário de Governo, ofícios, campanha em rede social para tirar a conferência do papel, ela aconteceu mesmo com alguns dias fora do prazo estabelecido por decreto nacional.

Após estes dois atos, foi realizada uma campanha covarde na internet intitulada “De Olho no Movimento” que conseguiu criar polêmica e desavenças dentro dos grupos LGBT das Região Metropolitana, atacando as companheiras da ALEM- Associação Lésbicas de Minas, que foi grande parceira da nossa entidade no ano de fundação, não assinava com o nome da nossa entidade, mas dava entender que era de nossa autoria, atitude cruel e com característica de quem com certeza não queria a continuidade de nossas ações dentro do Movimento LGBT.

Antes mesmo dessa onda de boatos na Internet, o MOOCAH em reunião com o outro grupo LGBT da cidade, foi acusado de ser uma entidade eleitoral, que foi fundada única e exclusivamente para me eleger Vereadora e na qual a história se encarregaria de contar os fatos.

Com todas essas forças para enfraquecer o MOOCAH, tivemos muitos momentos de crise internas e debates calorosos para continuar resistindo à cooptação e manter a linha da independência financeira, sem receber dinheiro público, de políticos ou entidades privadas com interesse em tutelar nossa luta. O grupo se desgastou, muitos militantes foram se afastando e nossa intervenção na cidade caiu bastante.

Foi necessário um ano para reflexão de tudo que aconteceu para entender que não só podemos como precisamos reerguer o MOOCAH, até porque, nunca na história da cidade, houve um governo capaz de avançar na defesa e promoção dos Direitos LGBT, nem o Governo Marília Campos, que teve oportunidade de regulamentar a Lei 3.506 da Ex-Vereadora Letícia da Penha, que pune a discriminação por orientação sexual na cidade, esta lei foi aprovada em 2001, sancionada em 2002 pelo então Prefeito Ademir Lucas e não foi regulamentada nos 8 anos de governo do PT em Contagem, e não foi por falta de cobrança, o movimento sempre se posicionou, inclusive até participou do Orçamento Participativo de 2009 onde lideramos a Obra da Construção do Centro de Referência em Direitos Humanos em Contagem para ser construído e entregue até 2011 na região do Eldorado em Contagem, obra no valor de R$223.300,00 que até hoje nem começou a ser construída.

Atualmente, todos os casos de homofobia em Contagem são encaminhados pelo Movimento Social para Belo Horizonte por falta de estrutura pública, por mais que a Lei 3.506 no seu Art. 7º fala: ” – O Poder Executivo deverá manter setor especializado para receber denúncias relacionadas às infrações a presente Lei.” O Governo Marília campos, que praticamente não teve oposição em Contagem, teve oportunidade de mudar esta história e não o fez.

Em 2012, tivemos a eleição do Prefeito Carlin Moura (PCdoB), até então grande aliado do movimento, inclusive muito atuante na Frente Parlamentar LGBT da ALMG enquanto Deputado. A eleição de Carlin Moura teve apoio incondicional dos evangélicos, talvez por isso o então candidato pela primeira vez não tenha comparecido à Parada do Orgulho LGBT da Cidade no ano eleitoral. A população de Contagem, que pela primeira vez pode contar com horário eleitoral na TV, se deparou com propostas como “Criação do Morro da Oração e do Parque do Batismo”, um verdadeiro estupro do Estado Laico, infelizmente sendo proposta de um ex-aliado e de um partido que se diz comunista.

Pois bem, Carlin foi eleito e uma de suas primeira ações de Governo foi nomear o Ex-Vereador Pastor Silva (PRB) como Secretário de Direitos e Cidadania de Contagem, o mesmo Vereador que pediu vistas do projeto 056 2011 e também um dos responsáveis por mobilizar mais de 100 pastores contra o mesmo projeto, projeto este que não foi aprovado, mas que também não atingiu a já sancionada Lei 3.506 onde ouvia-se rumores que a real tentativa era de revogá-la. Desconheço a história do Pastor Silva em benefício dos Direitos Humanos em Contagem, pelo contrário, neste momento que os movimentos estão na rua para pressionar a queda de Marco Feliciano da Comissão de Direitos Humanos, Pastor Silva representa o mesmo retrocesso, porém em âmbito municipal.

O MOOCAH iniciou debate com alguns movimentos e militantes independentes da cidade para organização de uma Frente Popular em Favor do Estado Laico na cidade, e em breve vai publicar um chamamento para todas e todos aqueles que não se sentem representados por estes senhores, vir conosco para rua, para pedir as suas respectivas saídas desses importantes espaços de manutenção, defesa e avanço dos Direitos Humanos, direitos esses seriamente em risco com a presença de figuras fundamentalistas como destes dois senhores.

Depois deste período de reflexão e de recarga de energias, mobilizei os fundadores do MOOCAH para sensibilizá-los da necessidade de retorno da nossa atuação, de como a cidade precisa ainda mais da nossa garra, luta e resistência. Até porque há indícios que o discurso de governo plural do PCdoB seja mais cruel e retrógrado do que o negligente de Marília Campos. Contagem precisa da nossa militância para fazer oposição ao capitalismo!

A minha volta ao movimento LGBT está caminhando com outra importante decisão na minha vida, a de me filiar novamente a um Partido Político, desta vez com amadurecimento, consciência e muita cautela. Em 2011, conheci alguns militantes do PSTU e desde então fui só me aproximando do partido, ficou mais forte ano passado quando apoiei a candidatura do companheiro Gustavo Olimpio para Prefeito de Contagem. Comecei este ano a frequentar as atividades no Diretório de Contagem, inclusive participando de atividades de formação política. Esta experiência tem sido muito interessante, porque pela primeira vez me sinto pertencente e segura da prática do discurso.

Diferentemente de outros partidos que conheci, o PSTU tem um debate alinhado com o combate às opressões, faz uma coluna classista, com credibilidade intocável, não se furta em se posicionar contra a burguesia retrógrada da cidade, e é nesse espírito revolucionário que eu me encaixo, é nesta vontade de lutar fora dos gabinetes que me enquadro.

Por este motivo, decidi me filiar ao Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, porque sinto que esta luta me pertence e a recíproca é verdadeira. Hoje entendo aquela frase que escutei de outro militante e citei no inicio deste texto, entendo e concordo com ela ‘a história se encarregou de contar os fatos’.”

Ana Carolina Diniz Benzaquen