O governo Lula recebeu o sinal verde para implementar o projeto de transposição do rio São Francisco. No último dia 23, o presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Marcus Barros, assinou a licença ambiental para o projeto de transposição. Pouco antes, no dia 13, o Ministério lançou o edital de licitação para a primeira fase da obra. A não liberação da obra pelo Ibama, até então, estava se constituindo no principal entreve jurídico e burocrático para o seu início.

O polêmico projeto consiste no transporte de águas do “velho Chico” para as regiões necessitadas, aproveitando o potencial de oferta hídrica supostamente disponível no rio (o Nordeste possui apenas 3% de toda a água doce existente no país, 2/3 dos quais estão na bacia do São Francisco). Prevê também a retirada de 127 m3/s de água do rio, desde a cidade de Cabrobó (PE), eixo norte, e do lago de Itaparica (BA), eixo leste.

Além disso, o plano é construir uma rede de túneis e aquedutos que percorreriam dois mil quilômetros de rios e canais a céu aberto, abastecendo cerca de seis milhões de pessoas e irrigando 300 mil hectares de terras. De acordo com o governo, a transposição deverá receber investimentos no valor de R$ 4,5 bilhões.

,b.O agronegócio agradece
O governo afirma que o projeto visa “acabar com a seca do nordeste”. Entretanto, vários ambientalistas e organizações dos movimentos sociais denunciam que a obra faraônica objetiva mesmo proporcionar mais lucros ao agronegócio.

Grandes produtores de cana-de-açúcar que pretendem produzir o Biodiesel e plantar laranjas para exportação, setores onde o Brasil já é o maior produtor e exportador mundial, é que, na verdade, estão de olho nas águas do rio. Assim, ao contrário do que o governo diz, a obra não vai resolver o problema da seca no sertão, mas fortalecer um modelo econômico que há 500 anos vem desgastando o país, que é o agronegócio exportador. Como afirmam os movimentos sociais da região, o problema do semi-árido nordestino não é a “seca” e sim a “cerca”.

No momento há uma enorme especulação das terras nas áreas de provável irrigação. Os grandes latifundiários esperam valorizar em 400% suas terras.
Além disso, entidades dos movimentos populares afirmam que o projeto vai favorecer também as grandes empreiteiras que terão enormes lucros com a obra.

Sem discussão
Da mesma forma que os governo militares, Lula ignora os protestos dos movimentos sociais, as populações que vivem à beira do rio e os especialistas na hidrografia do semi-árido. “Com a licença ambiental do Ibama, o governo federal se diz pronto a iniciar as obras de transposição de águas do São Francisco e tem alardeado que o exército está pronto para iniciar o trabalho. O governo continua com sua postura autoritária. Tenta levar a obra adiante sem respeitar a opinião das comunidades ribeirinhas, que vivem do São Francisco, que dele dependem cultural e economicamente”, denunciou ao Opinião Socialista Éden Pereira Magalhães, Secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), uma das entidades à frente da campanha contra a transposição.

Éden ainda lembra que o presidente quebrou sua promessa com os movimentos sociais depois da greve de fome do bispo Dom Cappio. “O compromisso que Lula assumiu após a greve de fome de Dom Cappio, de abrir o diálogo real, não foi assumido apenas com o bispo, mas com a sociedade brasileira. E é este compromisso que o governo optou por ignorar”, afirmou.

Ativistas também denunciam que tropas do exército já estavam instaladas em Cabrobó (PE), antes mesmo da aprovação dos editais da obra.

Protestos
No dia 15 de março, cerca de 500 ativistas ocuparam o Ministério da Integração Nacional para pedir o fim do projeto de transposição das águas do rio São Francisco. Entre os dias 12 e 16, os ativistas estiveram em Brasília, no acampamento “Pela Vida do Rio São Francisco e do Nordeste Contra a Transposição”, com cerca de 600 pessoas, de acordo com a organização da atividade.

Como alternativa à transposição, os manifestantes reivindicam a revitalização do rio. Segundo estudos realizados, a transposição, além de “matar” o rio, vai retirar água de terras indígenas, quilombolas etc, aprofundando ainda mais o problema da seca constante na região.

O “Velho Chico”, apesar de sua enorme extensão (2.600 km), cortando vários estados entre o serrado e a caatinga, se encontra hoje muito degradado. Suas águas estão sendo usadas para o consumo humano e animal em centenas de cidades, na produção de alimento com irrigação, na pesca, como força motriz na geração de energia elétrica, na navegação, sendo poluído pelos esgotos domésticos e industriais, desmatamento e mineradoras.

Ambientalistas alertam que a obra vai trazer impactos ainda mais negativos, como aumento da emissão de poeiras, aumento e aparecimento de outras doenças, perda de terras potencialmente agricultáveis, perda e fragmentação de no mínimo 430 hectares de áreas com vegetação nativa, além de habitats e ecossistemas, com ampla fauna terrestre.

“É preciso fazer a revitalização do rio, trabalho que custa muito menos e dará emprego para muita gente que precisa”, defende um comunicado do Cimi.
A revitalização consistiria na construção de cisternas, de pequenas barragens, recuperação de poços, construção de adutoras e um insistente trabalho de educação para o melhor aproveitamento da água.

Além dessas medidas, é fundamental a realização da reforma agrária, para colocar um fim ao latifúndio, flagelo histórico do sertanejo nordestino.

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