Eduardo Almeida

Quais são as causas das crises? Como funciona seu mecanismo básico?Existe um grande debate entre os marxistas sobre a origem das crises cíclicas do capitalismo, em boa parte porque o próprio Marx não chegou a completar seu livro fundamental (O Capital).

Uma corrente marxista com peso razoável (a sua mais notável defensora foi Rosa Luxemburgo) atribui as crises ao subconsumo das massas, ou uma “brecha de demanda”.

No capitalismo, o valor produzido pelos trabalhadores é sempre maior do que seus salários, o que corresponde a mais valia. Ou seja, parte do valor é embolsada pelos capitalistas na forma de lucros. Quanto maior for a participação dos lucros no valor total produzido, maior seria a brecha da demanda. Ou seja, para os “subconsumistas”, as crises seriam originadas pelo fato dos trabalhadores não poderem consumir todos os bens que produzem. Isso ocasionaria a superprodução, queda nos lucros e a crise.
Essa teoria tem vários equívocos. Em primeiro lugar, sua conclusão lógica é que os aumentos salariais ajudam o capitalismo a sair da crise. Apesar de ser popular entre os defensores do “mercado interno”, sendo apresentada como saída para a crise, isso não tem nada a ver com a realidade do capital. A crise em geral estoura nos momentos do auge, quando muitas vezes os salários estão mais altos. E a saída para os capitalistas é sempre a mesma: o aumento da mais valia pela redução dos salários.

Além disso, segundo o economista Anwar Shaikh: “Dentro de um quadro assim, é evidente que qualquer intervenção econômica que reforce e dirija os fatores expansionistas pode superar, em princípio, a ameaça de estagnação. A economia keynesiana, por exemplo, proclama que o estado, seja por conta de seus próprios gastos, seja estimulando o gasto privado, pode alcançar os níveis socialmente desejados de produção e emprego e desse modo determinar, em última instância, as leis de movimento da economia capitalista.” (Valor, acumulação e crise)

Os subconsumistas não teriam como explicar a situação atual da crise capitalista. Com a maior intervenção dos Estados imperialistas de todos os tempos, uma espécie de keynesianismo brutal, não haveria razão para não se superar a crise atual do capital. Nunca houve na história nada semelhante à injeção de verbas públicas feita nesse momento. E, pelo menos a nosso ver, a crise não foi resolvida.

Mas a interpretação marxista mais sólida para as crises capitalistas é a que as relaciona com a tendência à queda das taxas de lucros. Essa interpretação inclui a questão do consumo dos trabalhadores, mas dentro de outra ótica mais ampla.

A lógica da taxa de lucros
Os capitalistas desenvolvem duas guerras ao mesmo tempo; contra os trabalhadores e na concorrência contra outros capitalistas. Fazem isso para garantir o móvel central de sua atividade que é a obtenção do maior lucro possível.

A batalha contra os trabalhadores é para reduzir o chamado capital variável, composto pelos salários pagos. Uma parte fundamental da batalha da concorrência para aumentar a produtividade é o investimento na mecanização e em matérias primas. Isso aumenta a outra parte do capital, chamado capital constante. Assim a dupla guerra dos capitalistas pode ser resumida na redução do capital variável (os salários dos trabalhadores) e ampliação do capital constante (pela mecanização).
Dentro dos ciclos, nas fases de expansão, as grandes empresas investem na mecanização, aumentam a produtividade, para produzir com preços mais baixos que as concorrentes. Tais medidas possibilitam a abertura de novas fábricas ou ampliação das existentes.

A taxa de lucro relaciona a mais valia e o total do capital investido (capital variável mais o capital constante). A massa de lucros é diferente da taxa, por ser a quantidade total dos lucros obtidos pelos capitalistas. A tendência dos capitalistas de investir em máquinas e ampliar o capital constante leva à ampliação da capacidade produtiva por um lado, mas por outro conduz à diminuição relativa do capital variável (dos salários pagos aos trabalhadores). Como a taxa de lucro é definida por uma equação que tem em seu numerador a mais valia extraída dos trabalhadores e no denominador a totalidade do capital investido (mais valia / capital constante mais capital variável), teremos uma tendência à diminuição da taxa de lucros na medida em que se amplia o investimento em capital constante por parte dos capitalistas.
Quanto mais se amplia a capacidade produtiva, com mais máquinas e equipamentos, mais se impõe a tendência a diminuir a taxa de lucros. Isso não deve ser confundido com a massa total de lucros que em geral continua aumentando. O capitalista consegue um lucro menor por mercadoria, mas como produz e vende mais mercadorias, sua massa de lucros aumenta.

Mas as outras empresas reagem com o mesmo tipo de iniciativa de ampliação da capacidade produtiva, o que leva a uma forte disputa pelo mercado. A produção é cada vez maior e acaba superando a massa salarial disponível para consumir os produtos a um preço que possa fornecer o lucro médio esperado. A taxa de lucros cai mais e acaba afetando a massa de lucros. Aí então os capitalistas param de investir. A queda da taxa e da massa de lucros não compensa novos investimentos, e vem a crise de superprodução.

Aqui a massa salarial e sua capacidade de consumo têm importância, mas não decidem a crise. Só quando a taxa e a massa de lucros caem é que ocorre a crise. Ou seja, a crise acontece porque os capitalistas param de investir na economia.
Nesse momento do ciclo, ocorre a destruição do capital constante (fechamento de fábricas) e de capital variável (redução de salários e desemprego), como pré-condição para se restabelecer o aumento da mais valia e da taxa de lucros.
Por isso, os capitalistas recorrem a reduções dos salários para escapar da crise e tentar voltar a elevar seus lucros. Por mais que os governos injetem dinheiro na economia, enquanto não se queimar o capital excedente (com a falência das empresas mais fracas) e se restabelecer a taxa de lucros das empresas, o crescimento econômico não será retomado.

Esse é o mecanismo básico das crises cíclicas, que têm uma duração determinada entre 5 e 10 anos.

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