Morreu neste dia 7 de setembro o geógrafo Carlos Walter Porto-Gonçalves. Professor na Universidade Federal Fluminense (UFF) de 1987 a 2019, Porto-Gonçalves foi companheiro de luta do líder seringueiro Chico Mendes, em Xapuri (AC), e de Osmarino Amâncio Rodrigues, Brasileia (AC). Também foi presidente da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB) de 1998 a 2000.

Na década de 1980, Porto-Gonçalves foi muito próximo da Convergência Socialista (CS), que na época era uma corrente política do Partido dos Trabalhadores, e que depois desempenhou um papel fundamental na fundação do PSTU em 1994.

Carlos Walter foi um dos principais assessores do movimento seringueiro do Acre. Apoiou e participou dos chamados “empates”, piquetes de luta formado pelas famílias seringueiras que impediam a destruição das florestas por parte dos fazendeiros. Também desempenhou um papel fundamental para a criação das Reservas Extrativistas (RESEXs), conhecida como a reforma agrária dos seringais. Sua experiência com o movimento está condensada na sua obra “Nos varadouros do mundo: da territorialidade seringalista à territorialidade seringueira”, sua tese de doutorado publicada em 2003. Outra obra de destaque é o livro “Amazônia, Amazônias”, produto de 22 anos de pesquisas sobre a região que ataca velhos mitos sobre a realidade local e as desastrosas consequências provocada pela expansão capitalista na região. Na obra, o autor dá o devido destaque aos protagonistas que lutaram contra a destruição da floresta e mostra que não existe uma “Amazônia” apenas, mas várias “amazônias”.

Outra grande contribuição foi o seu livro “A Globalização Da Natureza e a Natureza Da Globalização”, onde explica como a emergência da questão ecológica e ambiental foi capturada pelas politicas neoliberais do FMI e Banco Mundial nos anos 1990 e 2000.

Sua trajetória política a partir dos anos 1990 se inclina ao movimento Zapatista mexicano e a incorporação de elementos pós-modernos na sua obra acadêmica. Mas apesar das grandes diferenças e do afastamento político e ideológico, reconhecemos que Carlos Walter sempre se manteve fiel ao seu compromisso com os povos da floresta, camponeses, quilombolas e indígenas. Para Carlos Walter a “Geografia era verbo”, é ação política ao lado dos oprimidos e vulneráveis que, por meio de sua luta, gravam no espaço seu território e sua territorialidade. Nesse momento difícil queremos externar todo nosso apoio e solidariedade a sua família e companheira.

Por fim, citamos um testemunho de Osmarino Amâncio, líder seringueiro e militante do PSTU, que ao lado do professor abriu os varadouros para a criação das Reservas Extrativistas:

“Hoje pra mim é muito forte a perda do Carlos Walter. Na época dos empates e dos grandes conflitos, o Carlos Walter baixou aqui no Acre. Uma vez ele foi na minha casa em Brasileia, e teve um atentado contra a minha pessoa. Quando ele chegou, e não tava entendendo nada aquela situação, a gente pegou ele e jogamos dentro de uma Toyota. Era de noite. Depois do atentado eu falei: ‘entra na caminhonete’. Nós saímos com duas horas de viagem pelos varadouros da Amazônia e depois chegamos num forro, num seringal, com todo mundo festejando.

Tínhamos organizado um empate e conquistamos uma grande vitória. O povo tava feliz e comemorando com um forró. E o Carlos Walter ficou surpreso com a situação. Como é que ao mesmo tempo que a gente sofria atentado, que enfrentava fazendeiro e jagunço, a gente também comemorava nossas conquistas num forró. Mas a vida é assim. Na verdade, as pessoas que convieram com a gente essa realidade, nunca morrem. E naquele dia ele festejou junto com a gente”.