Coluna da CSP-Conlutas na Marcha do Orgulho LGBT em São Paulo, setembro do ano passado | Foto: PSTU-SP
Wilson Honório da Silva, da Secretaria Nacional de Formação do PSTU

Quem conhece nossa militância, já deve ter ouvido, nas ruas ou encontros dos movimentos, os camaradas inflando os pulmões pra dizer: “Eu não sai, eu explodi o armário. Sou LGBTI, sou revolucionário!”. Versos curtos, mas cheio de significados, a começar pelo fato de que, para nós, lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexos que militam no PSTU, o combate à LGBTIfobia só pode ser levado a cabo, de forma coerente e consistente, se condicionado à luta sem tréguas contra o sistema que a alimenta e dela se beneficia, uma vez que, como nos já nos ensinou Rosa Luxemburgo, o capitalismo é um sistema de discriminação na exploração.

Por isso, nas eleições, também apresentamos candidaturas LGBTIs país afora. Mais do que atender ao critério da “representatividade”, nosso objetivo é, em primeiro lugar, levantar um programa que combine estas duas facetas de uma mesma realidade. Um programa, diga-se de passagem, que temos orgulho de também ser defendido, com igual força, pelos(as) nossos(as) companheiros(as) heterossexuais e cisgêneros (ou seja, que se identificam com o sexo biológico com o qual nasceram).

Mas, também queremos seu voto. Pois, votar neles e nelas é uma forma de fortalecer a consciência para a luta, com independência de classe, de projeto socialista e revolucionário. Elegê-los(as) é ter vozes que ecoem esta perspectiva e estas lutas e, acima de tudo, ajudem na organização para que possamos avançar na construção do único tipo de sociedade onde realmente poderemos ser livres e iguais: um mundo socialista.

Então, leia o artigo para conhecer algumas destas candidaturas, o que pensamos sobre o tema e alguns pontos do programa que estamos apresentando.

Vote 16, contra os torpedos da direita e a canoa furada do reformismo

O capitalismo é um sistema que se aproveita das diferenças humanas (e as aprofunda) para explorar ainda mais amplos setores da sociedade, como mulheres, negros(as), LGBTIs, quilombolas, migrantes etc. E, se não bastasse, ainda as utiliza para dividir e enfraquecer a classe operária e o povo pobre.

Prova disto, inclusive, é o momento em que vivemos. A crise detonada em 2008 teve como uma de suas consequências diretas o acirramento dos discursos e práticas baseadas nas ideologias que semeiam a discriminação e o preconceito, auxiliando na ascensão, mundo afora, de alguns de seus mais asquerosos porta-vozes, como Trump (EUA), Viktor Orban (Hungria), Marine Le Pen (França), Erdogan (Turquia), os “Fratelli” (“Irmãos”, da Itália) e, evidentemente, Jair Bolsonaro.

Combater estes setores de extrema-direita, que também proliferam na América Latina, na Ásia e na África, é tarefa fundamental e de primeira-ordem. Não só para defender milhões que têm suas vidas marcadas por todas e quaisquer formas de violência, mas também para evitar que direitos básicos, arrancados com muita luta, sejam confiscados; como, inclusive, vem ocorrendo há tempos.

Contudo, este não é o único “front” nesta batalha. Há muito, pressionada pelas lutas e maior visibilidade conquistada pelos setores oprimidos, a burguesia tradicional (ou “liberal”) também têm buscado se antecipar às mobilizações e cooptar para seu lado setores e ativistas dos movimentos, pregando a ilusão de que é possível ter um mundo igualitário e livre sob o capitalismo, seja através da ascensão social ou “empoderamento” individual, do “empreendedorismo” ou qualquer outra coisa que não altere em absolutamente nada a lógica da democracia burguesa e do próprio capitalismo.

O problema é que essa farsa também ganhou um “coro”, que a faz ecoar aos quatro ventos, nas vozes de ativistas, organizações e partidos que, hoje, entoam as ladainhas da “pós-modernidade” ou as velhas baladas do reformismo, defendendo a possibilidade de um tal “capitalismo com cara humana”. E, para tal, prega a conciliação de classes, consolidada em projetos e parcerias com banqueiros, empresários e até o ultrarreacionário agronegócio.

O problema é que para LGBTIs, assim como todos demais oprimidos(as), qualquer uma destas opções é receita certa para o desastre. A diferença é se deixar abater pelos torpedos de ódio disparados pelos conservadores ou embarcar na canoa furada dos reformistas, esperando as ilusões serem dragadas pela primeira crise do sistema (que, sempre, implica em corte de direitos, verbas e políticas para os mais explorados e oprimidos) ou ter as expectativas traídas por aqueles que dizem nos representar. Afinal, “quem paga a banda, escolhe a música”.

“Contra a LGBTIfobia, nossa luta é todo dia”

Toda e qualquer forma de opressão se apoia em ideologias; em ideias e teorias que não só propagam e acirram os preconceitos como também cumprem uma importante função social e “concreta” na sociedade, na medida em que, ganhando o coração e mente de milhões, são utilizadas para “justificar” a marginalização e, acima de tudo, a superexploração daqueles e daquelas que não se enquadram nos padrões identificados com os da classe dominante.

Flávia Bischain é professora da rede pública, bissexual, moradora da Brasilândia, na periferia de São Paulo, onde é candidata à vice-governadora, ao lado do Altino Júnior. E é de sua experiência na Educação, lamentavelmente um dos principais veículos para a propagação de ideologias opressivas, que ela avalia o impacto do governo Bolsonaro sobre as LGBTIs.

“O bolsonarismo, com Damares Alves (ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos) à frente, vez de tudo para impor sua pauta conservadora e a censura nas escolas. Nas escolas militarizadas, são inúmeros os relatos de violência e perseguição de caráter LGBTIfóbico, racista e machista contra estudantes, professores e até mães de alunos. O cabelo ‘black’, as unhas pintadas ou qualquer tipo de comportamento considerado ‘afeminado’ ou fora dos ‘padrões’ são atacados violentamente pelos  ‘gestores’ dessas escolas”, lembra Flávia.

Contudo, ela também lembra que a simples presença de Geraldo Alckmin na chapa de Lula é prenúncio de que nada de muito bom sairá daí. Se não bastasse o fato de ser conhecido por seus vínculos com a Opus-Dei, um dos setores mais reacionárias do catolicismo, Alckmin mal consegue disfarçar sua plumagem de tucano e, como tal, é exemplar das políticas deste setor da burguesia.

“O PSDB, em São Paulo, reproduziu a LGBTIfobia e o nefasto combate à chamada ‘ideologia de gênero’, atacando a autonomia nas escolas, dificultando o debate e luta contra a LGBTIfobia,  o racismo e o machismo. Enquanto isso, estudantes e professores tiveram (e continham tendo) que se enfrentar com um ambiente constrangedor e violento, algo particularmente terrível em relação às/aos estudantes trans, que sofrem com todo tipo de preconceito e discriminação e, ainda, precisam da assinatura dos pais para terem seus nomes sociais registrados nas escolas. Consequentemente, é comum vermos as alunas trans desistirem de estudar ao longo do ano”.

Flávia ainda lembra que, enquanto isto, a LGBTIfobia “corre solta nos corredores e, inclusive, nas salas dos professores, a começar por comentários ofensivos e ‘piadas’ que nos ferem profundamente, como ‘Essa aí não se decidiu..’, particularmente no caso das bissexuais, ou até o lamentável ‘Isso agora é moda’, como que ser vítima do preconceito fosse uma opção da gente. Por isso, queremos reverter as escolas cívico-militares e derrotar, de vez, o famigerado ‘Escola Sem Partido’, que, apesar de nunca aprovado, está sendo ilegalmente implementado país afora.”

Essa é uma realidade bastante conhecida por nossa juventude, como nos lembra Jo Souza, candidata a deputada federal pela “Coletiva Rebeldia”, em Santa Catarina, formada majoritariamente por gays, bissexuais ou pessoas não-binárias (ou seja, que não se identificam como pertencentes a um gênero exclusivamente), como Jo, que destaca que “combater a LGBTIfobia na Educação, assim como combater o racismo e o machismo, é parte essencial de tornar o ambiente educacional um lugar seguro e acolhedor para todas as pessoas”.

Mas, exatamente por entender que as ideologias incidem sobre a vida concreta, Jo também nos lembra que é preciso combatê-las em todas suas formas e onde quer que se manifestem: “Entendemos que os preconceitos não são inerentes do ser humano, mas um reflexo da desigualdade social, mas eles dividem a classe explorada e enfraquecem a luta de classes. Por isso lutar contra todas as formas de opressão é também lutar contra o sistema capitalista que se alimenta dessas opressões e intensifica a desigualdade social”.

Algo que é particularmente sentido pela juventude, a quem o capitalismo nega um futuro, como também é ressaltado por Jo: “Nossa candidatura representa a juventude que não vê perspectiva dentro do capitalismo. Uma juventude que, em sua maioria, trabalha na informalidade, sem um salário digno, sem direitos, sem estabilidade, com uma economia que desvaloriza ainda mais o salário que recebe. Juventude essa que raramente tem a oportunidade de chegar num curso superior e, quando chega, com muitas dificuldades, ainda encara uma sociedade que não dá quase nenhuma oportunidade e muito menos condições de competir com outras pessoas mais favorecidas.”

“Por isso mesmo, defendemos uma educação pública, laica (sem vínculos religiosos) e gratuita, sem vestibular e de qualidade, para formar nossa juventude e toda a classe trabalhadora, não somente como mão de obra técnica, mas como gente ativa, crítica e participativa na construção da nossa sociedade”, continua Jo.

Mas não podemos parar por aí. “Algumas das principais propostas do PSTU, como a estatização das 100 maiores empresas do país e a expropriação dos bilionários e super-ricos também têm tudo a ver com as LGBTIs, pois, assim como revogação de todas as reformas trabalhistas e previdenciárias, este é o caminho para que possamos aumentar o salário mínimo, reduzir as cargas horárias de trabalho, investir realmente na saúde pública, na educação e combater a miséria que mata tantas pessoas de fome, coisas que atingem de forma ainda mais cruel aqueles e aquelas que, devido às opressões, são jogadas para as margens da sociedade”, conclui a camarada da “Coletiva Rebeldia”.

“Sou LGBTI, socialista e revolucionária! Minha luta é ao lado da classe operária”

Como não há como combater a opressão sem lutar contra a exploração, rejeitamos qualquer aliança com a burguesia e seus representantes. Critério há muito esquecido pelo PT e, hoje, também “minimizado” por partidos como o PSOL. Estas alianças, além de criar ilusões vãs, minam qualquer possibilidade de mudança radical da sociedade, como também, no presente imediato, acabam saindo pela culatra, atingindo particularmente aqueles e aquelas que estão dentre os mais explorados(as) e oprimidas(os).

E esta é uma realidade bastante conhecida por Seu Alex, candidato a deputado federal no Pará. Homem trans, negro, operário da construção civil e dirigente sindical da categoria, ele defende que “particularmente para as LGBTIs da classe trabalhadora é muito importante construir nossa luta ao lado da classe operária e demais setores oprimidos”, uma necessidade que, pra começar, tem a ver com o dia-a-dia das pessoas trans.

Nosso setor é muito oprimido dentro do sistema capitalista. A gente fez levantamentos, pra ver como está a situação na construção civil, e viu muito disto. Tem colegas minhas que trabalham no mesmo sistema que os homens héteros, mas não são qualificadas, não têm a profissão reconhecida. Os patrões ainda colocam a gente nos piores postos de trabalho. É um sofrimento absurdo. Quando eu vou nos canteiros de obras, ouço muita reclamação, porque o camarada homem e hétero tem uma produção fixa, além do salário-base, enquanto a/o trans não tem o mesmo valor, fazendo o mesmo trabalho.”, destacou o companheiro.

E Seu Alex também sabe que o sofrimento é ainda maior para cerca de 90% das transexuais que sequer conseguem entrar no mercado de trabalho. “A gente vê travestis e trans jogadas na prostituição, porque não dão oportunidade de emprego pra elas. Minha candidatura é pra defender e combater esta exploração e este preconceito dentro do sistema capitalista, a começar pela exigência de salário igual, pra trabalho igual, mas também lutando todo dia pra desfazer os preconceitos que os patrões enfiam em nossas cabeças.”

Alessandro Furtado, candidato a deputado estadual, pela “Coletiva Trabalhadores Socialistas”, em Minas Gerais

A necessidade de unidade com a classe trabalhadora também está no centro da candidatura de Alessandro Furtado a deputado estadual, em Minas Gerais, pelo “Coletivo dos Trabalhadores Socialistas”. Gay, professor e dirigente do Setorial LGBTI da CSP-Conlutas, ele destaca que esta aliança é cada vez mais decisiva. E não só pras LGBTIs.

“Vivemos uma crise do capitalismo em que a disjuntiva ‘socialismo ou barbárie’ nunca esteve tão evidente. O governo assassino de Bolsonaro e sua trupe só aprofundaram as condições de desigualdade e os ataques à classe trabalhadora. O momento presente se traduz em altíssimos níveis de desemprego, mais da metade da população brasileira vivendo em insegurança alimentar”, nos disse Alessandro, destacando que, “se isto é verdade para a enorme maioria dos trabalhadores submetidos à exploração, é uma realidade ainda mais cruel para nós, que temos a vida marcada pela opressão.”

“Para as LGBTIs, a situação também é muito grave. O nível de desemprego quase dobra ao se comparar com heterossexuais, condição que se agravou com a pandemia. Como também, com Bolsonaro, aumentaram os casos de violência e somos atacados por manifestações de ódio quase diárias”, continuou o candidato mineiro.

Um exemplo muito específico da forma como as políticas neoliberais e o confisco de direitos têm afetado particularmente as LGBTIs, os serviços de telemarketing, foi destacado por Mandi Coelho, estudante, bissexual e candidata, em São Paulo, a deputada estadual, na “Coletiva Mulheres em Rebeldia”, formada majoritariamente por mulheres jovens e LGBTIs.

Mandi Coelho, candidata pela “Coletiva Mulheres em Rebeldia”, em São Paulo.

“Hoje, o trabalho no telemarketing, em serviços extremamente precários, é um realidade para os jovens. Sabemos que estas empresas contratam mais LGBTIs, como também negras e negros, porque é uma tentativa de esconder a gente da sociedade, porque que a pessoa que você atende não está te vendo. Precisamos de melhores empregos, com melhores salários e direitos plenos”, ressaltou Mandi.

Diante disto, defendemos a geração de empregos, com direitos, também para as LGBTIs, dentro de um plano mais amplo de obras públicas para construir escolas, hospitais, moradias, transporte, saneamento básico etc., que, além de atacar problemas urgentes da população, possa empregar os setores mais oprimidos, inclusive através de cotas para pessoas trans, negros e mulheres (também nos serviços públicos).

Além disso, defendemos a revogação imediata das reformas neoliberais já citadas por Jo, mas também da Lei das Terceirizações, com a incorporação das trabalhadoras terceirizadas, com os mesmos direitos e estabilidade.

 “Se me oprime e me explora, eu digo não, digo não! Vamos fazer revolução”

Alessandro também nos falou sobre o porquê, diante das proporções desta crise e da única forma que a burguesia conhece para enfrentá-la (o aumento da exploração), a Frente Ampla promovida pelo PT é particularmente criminosa.

“A chapa Lula-Alckmin não representa qualquer solução para as LGBTIs, principalmente a maioria de nós que somos da classe trabalhadora. Foi também em função das alianças que o PT, em seus mandatos anteriores, não resolveu minimamente as questões referentes à LGBTfobia. Nada fez para que se aprovasse um projeto de lei contra a LGBTIfobia, na verdade ajudou a engavetá-lo, e, ainda, não permitiu aprofundamento de debates de gênero e sexualidade dentro das escolas. Agora, explicitamente unido setores burgueses e conservadores, Lula não resolverá as questões referentes às pessoas LGBTIs”, concluiu o dirigente do Setorial LGBTI da CSP-Conlutas.

Essas alianças também foram alvos das críticas da Flávia, nossa vice em São Paulo. Uma conciliação  sempre “justificada” pela tal da “governabilidade” (leia-se a administração dos interesses capitalistas) e cujos resultados não poderiam ter sido outros senão a perpetuação e até mesmo o aumento da opressão.

“Em primeiro lugar, o PT nunca prestou contas sobre o porquê da violência letal contra LGBTIs não parou de crescer e, inclusive, disparou durante seus governos. Em um estudo que li recentemente – ‘Homicídios da População de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros (LGBT) no Brasil: uma análise espacial’, publicado por estudantes da Escola Nacional de Saúde Pública (RJ) –, até mesmo os números assumidamente subnotificados apontam isto: no período de 2002 a 2006 foram 158 mortes; já entre 2012 e 2016, foram 558 casos. Um crescimento de 253%”, destaca Flávia, lembrando que “isto é exemplo de como discursos e políticas pontuais, quando não mexem com o centro do problema, que é a exploração e marginalização impostas pelo capitalismo, não resultam em mudanças significativas.”

Flávia também recordou o episódio do chamado “kit anti-homofobia”, que, apesar de extremamente “tímido”, retirado das escolas, em 2014, “quando Dilma, que já havia assinado a ‘Carta ao Povo de Deus’, prometendo respeitar os ‘valores da família’, fez um acordo com a bancada evangélica para livrar a cabeça do Palocci, envolvido em corrupção. Ou seja, também aí nossos direitos foram usados como moeda de troca para favorecer os interesses de quem está no poder”, concluiu Flávia.

Algo que, não temos dúvidas, irá se repetir em um provável governo do PT. Não só pelas alianças no Congresso, mas também pela amplitude (que tende ao infinito) da Frente. Algo, desta vez destacado pela Vera, nossa candidata à presidência, que sendo uma mulher hétero e “cis”, mas também uma operária negra, é aliada incondicional de nossas lutas.

“Não há boas novas para as LGBTIs na Frente Ampla. O flerte com o conservadorismo é primo-irmão da conciliação de classes. Se não bastasse Alckmin, há figuras como o Pastor Sargento Isidório, do Avante da Bahia, conhecido por sua defesa da ‘cura-gay’. Em março, Lula posou todo alegre ao lado dele. E, agora, em junho passado, mesmo depois de Isidório ter sido denunciado em rede nacional por manter uma tal  ‘comunidade terapêutica’ Fundação Doutor Jesus, que viola os direitos humanos de internos, com castigos físicos e humilhações, como a repressão à orientação sexual, ele recebeu a solidariedade e apoio de Jerônimo Rodrigues, candidato do PT ao governo de lá”, lembrou Vera.

“As, bi, as gays, as trans, as sapatão, tão tudo organizadas pra fazer Revolução”

Apesar dos levantamentos serem parciais, já foi constatado que há um número recorde de candidaturas LGBTIs nestas eleições. Pra nós, isto é reflexo da visibilidade que ganhamos através das lutas constantes que temos travado, mas também de muito do que afirmamos na introdução deste artigo.

A existência de candidaturas LGBTIs inclusive em partidos abertamente conservadores é, por exemplo, expressão tanto do cinismo destes partidos quanto dos danos que as ideologias burguesas causam mesmo dentre aqueles e aquelas que sofrem opressão.

Mandi, da Coletiva Mulheres em Rebeldia, também conversou conosco sobre isto: “Os ricos chamam os jovens pra participarem da política, inclusive aqueles e aquelas que também sofrem com a opressão, mas só se forem pra defenderem o projeto deles. E nós estamos demonstrando que é possível uma candidatura de mulheres jovens pra defender os interesses da classe trabalhadora. Esse perfil é muito importante, porque nos últimos anos, as mulheres, os negros, as LGBTIs foram linha de frente das lutas, em especial da juventude. Por exemplo, nas ocupações de escolas, através da luta, vários jovens saíram do ‘armário’, colocaram sua cara ao sol e começaram a se organizar. Nossas candidaturas também refletem este processo”.

Agora, quando estamos às vésperas das eleições e Bolsonaro tem acirrado seus ataques antidemocráticos e ameaças golpistas, há também um movimento crescente pelo “voto útil”, fortemente alimentado pela chapa Lula-Alckmin.

Uma polarização que, na essência, é falsa; pois, por maiores que sejam as diferenças entre eles, ela mascara a verdadeira polarização que existe na sociedade capitalista: aquela que opõe os interesses de banqueiros, empresários, latifundiários e sua ganância sem fim, sintetizados no fato absurdo de que 315 bilionários detém grande parte da riqueza do país, aos interesses da grande maioria da população que, ao contrário do grosso da classe dominante, é marcada pela diversidade em termos de orientação sexual, identidade de gênero, raça-etnia, origem regional etc.

Por isso, dizemos que o verdadeiro “voto útil” é aquele que sirva para fortalecer a consciência dos “de baixo”, impulsionar sua organização e suas lutas para a superação desta contradição que, cada vez mais, afunda o mundo na miséria, na fome, na catástrofe ambiental e na desesperança. E isto foi um dos aspectos destacados por Nikaya Vidor, mulher trans, estudante no Rio Grande do Sul, onde é candidata a deputada federal.

“As candidaturas LGBTIs  do PSTU se diferenciam das outras porque são candidaturas  socialistas e, nesse sentido, apresentam um programa que sintetiza um projeto revolucionário. É um programa que vai pra muito além do “blá-blá-blá” e até mesmo do processo eleitoral, na medida em que pretende ser um instrumento para que possamos construir um mundo capaz de garantir pleno emprego, moradia, acesso pleno à saúde e de fato uma educação que garanta um combate à discriminação e, particularmente,  à transfobia”, nos disse a candidata gaúcha.

“Um programa que é voltado para toda a classe trabalhadora”, continuou Nikaya, “porque são aqueles e aquelas que produzem os únicos que realmente podem inverter a lógica da sociedade capitalista, se apropriando de toda riqueza material e a colocando a serviço de nossas reais necessidades, ao contrário do que acontece hoje, quando nem mesmo 1% da população, a burguesia, se apodera de quase tudo. Mas, também, um programa que sabe respeitar a diversidade desta mesma classe, inclusive da população trans, para qual, diante da extrema marginalização, exigimos, dentre outras coisas, cotas nas universidades, serviços públicos e no mercado de trabalho; atendimento digno, público, de qualidade e especializado, no SUS; combate à violência e punição daqueles que a praticarem.”  

E isso que nossas candidaturas tentam expressar. A começar pela Vera e sua candidata a vice, a Raquel Tremembé. Somos quilombo e oca. Somos das quebradas, das aldeias e assentamentos. Somos negros, indígenas e migrantes. Somos héteros e LGBTIs.”

Jo Souza, candidata a deputada federal, em Santa Catarina

E para materializar este programa, nós LGBTIs do PSTU, também não escondemos que queremos mais que seu voto. Queremos, sim, eleger. E, para tal, estamos lutando unicamente com as forças e esforços de nossa classe, enfrentando o boicote antidemocrático da mídia, que nos veta nos debates e sabatinas. Mas, queremos mais, como também foi destacado pela camarada Jo, de Santa Catarina.

“Por não vermos perspectiva dentro do capitalismo é que, então, nós encaramos a tarefa de nós mesmos tomarmos a iniciativa de discutir e construir o futuro que queremos. Não só nas eleições, mas para muito além da democracia burguesa, que só favorece os exploradores capitalistas e quem se alia a eles”, nos disse a candidata da “Coletiva Rebeldia”.

Mas, para construir este futuro, Jo também ressalta algo muito importante: “Pra acabar com esta ‘ricocracia’, precisamos dos movimentos sociais e de muita luta, todos os dias. Mas, não podemos parar aí. Aquilo que conquistamos hoje, já sabemos, pode virar pó amanhã. Por isso, é fundamental construir um partido verdadeiramente socialista e revolucionário, como o PSTU. Só assim teremos a oportunidade de não só de sermos ouvidos, enquanto povo trabalhador e reais produtores de riqueza, mas também de fazer a revolução necessária para que estas riquezas sejam apropriadas pelos trabalhadores e a juventude que, organizados em Conselhos Populares, discutam como eles serão utilizadas para satisfazer nossas necessidades e, também, criar as bases econômicas, políticas, sociais e culturais que possam varrer a opressão e os preconceitos para o lixo da História.”