O anúncio do crescimento de 1,2% do PIB (Produto Interno Bruto, a soma das riquezas produzidas pelo país no período) no primeiro trimestre do ano foi amplamente alardeado pelo governo e o mercado. No dia 2 de junho, enquanto as panelas ressoavam pelas janelas, Bolsonaro afirmava na TV que “a economia mostrou seu vigor”.

Na vida real, porém, a grande maioria da população não viu esse tal crescimento. Embaixo, o que existe é desemprego recorde, redução drástica da renda, inflação e aumento da pobreza. Enquanto fechávamos esta edição, a Petrobras anunciava um novo aumento do gás de cozinha, o 15º seguido, sendo que o preço médio do botijão já passa dos R$ 100,00 em várias regiões.

Esse novo aumento é um exemplo de quem está lucrando às custas do aumento da pobreza da população. Com o produto cotado em dólar, a elevação do preço no mercado internacional é repassada aqui. As famílias ficam mais pobres com a inflação, e os acionistas estrangeiros que controlam a maior parte da Petrobras faturam ainda mais.

Mais pobres cada vez mais pobres

A inflação dos produtos mais básicos atinge em cheio as famílias mais pobres. São elas que comprometem a maior parte da renda, não só com gás, mas com energia elétrica (que vai ficar mais cara com a privatização da Eletrobras), alimentação e medicamentos, alguns dos itens que mais registraram aumento no último período. Em maio, por exemplo, a inflação das famílias mais pobres (com renda de até R$ 1.650,00) foi o dobro das mais ricas (acima de R$ 16 mil), segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Entre os meses de abril de 2020 e deste ano, o preço dos alimentos subiu 15,5%. A carne, outro item de exportação, virou raridade na mesa do brasileiro e seu consumo teve a maior redução em 25 anos. A queda na renda média das famílias foi de 10% desde o início da pandemia.

Se as famílias estão cada vez mais pobres, para onde está indo esse “crescimento”? A relativa expansão da economia mundial, sobretudo da China e dos EUA, puxou o setor agroexportador ávido por commodities (produtos primários), que foi o que mais cresceu nesse período.  As grandes redes varejistas também se beneficiaram com a alta dos produtos básicos e o auxílio  emergencial que, embora pífio, pôde manter o consumo das famílias até certo ponto. E até mesmo a indústria teve uma certa recuperação, ao mesmo tempo em que demite, rebaixa salários e direitos.

Quem também lucrou em meio à segunda onda da pandemia foram os bancos, que tiveram uma alta de 35,2% em relação ao mesmo período do ano passado (levantamento da Economatica levando em conta os quatro maiores bancos, que ganharam, juntos, R$ 18,6 bilhões). Foi simplesmente o maior valor, em números brutos, já registrado na história.

Este é o resultado da política econômica de Bolsonaro e Guedes, e o que lhes garante ainda o apoio do grosso da burguesia, a despeito do genocídio em marcha na pandemia. E ao contrário de outros períodos da nossa história, como o ciclo do boom das commodities durante os governos Lula, que representaram algumas migalhas aos mais pobres e aumento do emprego (de baixos salários), desta vez se dá com o empobrecimento avassalador das famílias, puxado pelo desemprego recorde e a queda na renda.

Saiba mais

Raio-x do “crescimento”

Agropecuária: 5,8%

Finanças e seguros: 5,2%

Indústria: 4,3%

Administração pública, saúde, educação, seguridade social: – 4,5%

Atividades de serviços: – 9,5%

(Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas – FGV Ibre, comparado ao mesmo período de 2019)

Pagando caro

Inflação atinge os mais pobres

6,33% para as famílias mais ricas

8,91% para os mais pobres

(acumulado dos 12 meses – Índice Nacional de Preços ao Consumidor do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – INPC-IBGE)

Brasil miserável

Pandemia de desemprego

14,8 milhões desocupados

33,2 milhões subutilizados

6 milhões desalentados

(IBGE)

O de baixo desce

Desigualdade bate recorde

O crescimento econômico ocorre de forma inversa à criação de empregos e ao nível da renda. Desde 2012 essas duas pontas nunca estiveram tão afastadas.  De um lado tem-se o setor agroexportador enchendo os bolsos, as grandes redes varejistas lucrando como nunca, os banqueiros se beneficiando da alta dos juros e as grandes empresas investindo em tecnologia para ampliar a produção. De outro, demissões em massa, a renda ladeira abaixo e 20 milhões de pessoas passando fome, segundo a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan).

De acordo com o IBGE, o desemprego é recorde – 14,7%, ou 14,8 milhões de pessoas sem trabalho. Esses números se referem às pessoas que buscavam trabalho no período da pesquisa. Num critério mais amplo, o de subutilização (quem está apto a trabalhar, mas não tem emprego), são 33,2 milhões, outro recorde.

Mas o emprego é o último setor a se recuperar, então podemos vislumbrar uma melhora no curto prazo, certo? Errado. Enquanto o mercado projeta crescimento de 5% do PIB para este ano, não há qualquer perspectiva de uma recuperação sustentada dos empregos, da renda ou pelo menos o arrefecimento da inflação dos alimentos. O que se opera é, na verdade, a consolidação de um novo patamar de desemprego, de postos de trabalho precários e salários reduzidos.

 

Fora Bolsonaro e Mourão

Governo impõe o desemprego e a miséria “de rebanho”

Assim como os quase meio milhão de mortes notificadas na pandemia não são obra do acaso, mas fruto direto de uma política deliberada por parte do governo Bolsonaro, a pandemia do desemprego e da miséria também não caiu do céu. É produto de uma política econômica que, para manter os lucros dos banqueiros, grandes empresários e latifundiários, joga os efeitos da crise nas costas da classe trabalhadora e da grande maioria da população.

Bolsonaro não só não tomou nenhuma medida para impedir as demissões e proteger os empregos, como reeditou a Medida Provisória para reduzir os salários. Após muita pressão, concedeu o arremedo de auxílio emergencial com média de R$ 250,00, que não compra sequer metade de uma cesta básica. E ainda cortou R$ 22 bi da saúde em plena pandemia, além de manter um bloqueio de R$ 1,5 bi na educação que ameaça até o funcionamento de universidades e órgãos federais de pesquisa. Tudo para manter o teto dos gastos e priorizar o pagamento da dívida pública aos banqueiros.

Sua política entreguista e capacho dos banqueiros se reflete diretamente no preço do gás de cozinha e dos combustíveis, já que mantém o preço dolarizado do petróleo a fim de beneficiar os investidores privados da Petrobras. A mesma coisa ocorre com a energia elétrica, cujo aumento, além de penalizar as famílias mais pobres, pressiona toda a cadeia de produção e provoca um efeito inflacionário em cascata. O que deve piorar com a privatização da Eletrobras, verdadeira obsessão de seu governo.

Cortina de fumaça eleitoral

O projeto de Bolsonaro e Guedes é aprofundar ainda mais esses ataques, impor uma nova rodada de reforma trabalhista, precarização e uma reforma administrativa que mira os direitos e os salários dos servidores públicos. Diante da crise e da catástrofe humanitária aprofundada pela pandemia, o governo tem uma só estratégia: reforçar a guerra social contra os trabalhadores e os mais pobres.

Com vistas às eleições, porém, Guedes anunciou o adiamento do parco auxílio emergencial para setembro ou outubro próximos. O governo também estuda uma versão turbinada do Bolsa Família, a fim de garantir dividendos eleitorais lá na frente. Medidas que são menos do que migalhas do que estão tirando, e pretendem ainda tirar, da classe trabalhadora e do povo pobre.

PROGRAMA

Enfrentar os banqueiros e os bilionários, por auxílio, emprego e salário

29M em Maringá. Foto Phil Natal

A crise que envolve o governo Bolsonaro em torno da pandemia promove atritos entre setores da própria burguesia. No entanto, o grosso dos banqueiros, grandes empresários e latifundiários ainda quer mantê-lo. É a garantia de que terão seus interesses atendidos, mesmo às custas de centenas de milhares de mortes. Por isso, a primeira tarefa é tirar esse governo já, condição fundamental para enfrentarmos não só a pandemia, mas a tragédia social do desemprego e da fome.

Temos que lutar por um programa que enfrente os capitalistas que lucram com nossa morte e miséria. Precisamos de auxílio emergencial de R$ 600,00 já (deveria ser de um salário mínimo, na verdade), enquanto durar a pandemia. Só assim teremos condições de fazer uma quarentena de verdade. É preciso lutar pelos empregos e o aumento dos salários. Isso passa por proibir as demissões e reduzir a jornada sem reduzir os salários, abrindo mais postos e absorvendo a mão de obra que está parada. E ainda perdoar as dívidas dos trabalhadores e amparar o pequeno negócio, garantindo a folha de pagamento das empresas de até 20 funcionários, além de garantir isenção e subsídio ao setor.

Também precisamos reverter a reforma trabalhista, acabar com a precarização e colocar em marcha um plano de obras públicas que gere empregos e ajude no enorme déficit habitacional que historicamente sofremos, além do saneamento básico.

Como fazer isso? Virando de ponta-cabeça a atual política econômica e colocando a economia a serviço da maioria da população, e não de meia dúzia de bilionários. É necessário parar de pagar a dívida aos banqueiros para investir em saúde, educação e emprego. Taxar em 40% as fortunas dos bilionários, os lucros e dividendos distribuídos aos acionistas das 100 maiores empresas do agronegócio. E estatizar, sob controle dos trabalhadores, o sistema financeiro para garantir crédito e investimento público.

Além disso, é preciso barrar as privatizações e a entrega do país. Reestatizar as empresas privatizadas, retomar a Petrobras das mãos dos especuladores e colocá-la a serviço do povo, reduzindo, para o preço de custo, o combustível e o gás de cozinha. A mesma coisa com a energia elétrica e a Eletrobras.

Um programa dos trabalhadores que enfrente a pandemia, o desemprego e a fome não vai ser posto em prática por esse governo ou por qualquer outro aliado com a burguesia. Por isso, é urgente fortalecermos uma alternativa socialista e revolucionária, pois só através de um governo socialista dos trabalhadores, baseado em conselhos populares, será possível resolver não só a catástrofe atual, mas os problemas históricos da maioria do povo.