De acordo com a Rede de Observatórios de Segurança, 97,9% dos mortos por policiais na Bahia são negros | Foto: PM-BA/Divulgação
PSTU-BA

Victor Marinho, de Salvador (BA)

Maria Bernadete Pacífico, conhecida como Mãe Bernadete, 72 anos, assistia televisão com três netos adolescentes, na noite do dia 17, quando dois homens invadiram a casa sua e a executaram de forma brutal e covarde.

Ialorixá, coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) e liderança do Quilombo Pitanga dos Palmares, localizado na cidade de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador (BA), ela foi a 11ª quilombola assassinada na Bahia nos últimos 10 anos.

A Bahia, governada pelo PT há 17 anos, é o Estado campeão em assassinatos e perseguições às lideranças quilombolas. Hoje, 94 quilombolas, indígenas e trabalhadores rurais estão sob proteção judicial, e 25 nomes estão sob análise.

Parte dos conflitos com os povos tradicionais é diretamente com a gestão petista, a exemplo do Quilombo Quingoma, localizado na cidade de Lauro de Freitas, também na região metropolitana de Salvador, onde o governo estadual quer reduzir o território da comunidade a 20% de sua área original.

O alvo da mira policial tem raça e classe

Esse mesmo governo é responsável por uma escalada brutal no assassinato do povo negro e pobre. A Bahia tem a polícia mais violenta do país com um histórico marcado por chacinas e execuções extrajudiciais em série, que são veiculadas pela mídia como algo rotineiro.

Somente do dia 28 de julho a 4 de agosto, foram contabilizadas 32 mortes executadas por policiais, em chacinas ocorridas nas cidades de Camaçari, Itatim e Salvador.

Os dados do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que, no ano passado, 1.464 pessoas foram mortas em ações policiais na Bahia, levando o título de corporação policial mais assassina do país.

Uma a cada cinco mortes em ações policiais ocorridas em 2022 em todo o Brasil foram no Estado governado pelo PT. Uma comparação feita pelo site UOL, em 14 de agosto, revelou que a polícia da Bahia, (com população de 15 milhões), em um ano, matou mais que todas as polícias dos EUA (1.201 mortes, numa população de 330 milhões). E o alvo da mira policial tem raça e classe.

A Rede de Observatórios de Segurança divulgou, em novembro de 2022, na publicação “Pele alvo: a cor que a polícia apaga”, que 97,9% dos mortos por policiais na Bahia são negros. Isso mesmo, 98 a cada 100 mortos são negros. É o extermínio da juventude pobre e negra sendo colocado em prática. Um verdadeiro genocídio.

Essa política de segurança pública, que tem como alvo principal jovens negros dos bairros periféricos, tem um objetivo de controle social, em um Estado que produz muita riqueza, mas que é extremamente desigual.

A política de segurança dos sucessivos governos do PT na Bahia é aplicada para manter a ordem social vigente, a serviço de uma minoria burguesa racista e genocida, que construiu o seu império, fonte do seu poder, escravizando negros e negras por 388 anos e mantendo altos índices de superexploração, especialmente entre a população negra, nos dias de hoje.

No governo de Rui Costa (2015-2022), hoje ministro da Casa Civil, a letalidade policial subiu em 313% | Foto: Divulgação
Novos capitães do mato

Os governos do PT são responsáveis

Estamos no quinto governo sucessivo do PT na Bahia. A política de segurança aplicada nessas quase duas décadas de governo é de extermínio do povo negro. O PT é o grande capitão do mato da burguesia baiana, filhos dos velhos coronéis escravocratas. É com e para esse povo da Casa Grande que o PT governa.

O PT administra a Bahia a serviço dos interesses da classe dominante, com um programa social-liberal, em um arco de alianças com partidos da direita tradicional e das oligarquias locais, e com uma política econômica liberal, privatista e a favor do grande capital.

Aos trabalhadores, negros e pobres, sobram as mazelas. A Bahia é o Estado com o maior número de desempregados do país, segundo o IBGE; tem 15,5% da população em insegurança alimentar, de acordo com a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional; e ocupa o 3° lugar no ranking nacional de habitações precárias e tem o 5° maior déficit habitacional do país, segundo a Fundação João Pinheiro.

Além de todas essas mazelas sociais, tem uma política de segurança pública genocida, de extermínio da juventude pobre e negra. No governo de Rui Costa (2015-2022), hoje ministro da Casa Civil de Lula, a letalidade policial subiu em 313%. E como um bom capitão do mato, defendia com unhas e dentes o aparelho repressor do Estado. Ele chegou a dizer que o policial com um suspeito na mira do fuzil “é como um artilheiro na frente do gol, que tenta decidir em segundos como colocar a bola dentro do gol”. Essa comparação foi feita quando da Chacina do Cabula, que deixou 12 mortos, em 2015.

O atual governador, Jerônimo Rodrigues (PT), que gosta de posar de “governador dos direitos humanos” por ter “ascendência negra e indígena”, vai na mesma linha do seu antecessor. Defendeu as últimas ações violentas dos policiais e pediu respeito à instituição Polícia Militar da Bahia. Disse que todos os mortos pela polícia são “homicidas, traficantes, estupradores, assaltantes, entre outros criminosos”, como se houvesse justificativa para execuções policiais.

Covardia sem fim

Agora, de maneira desrespeitosa e caluniosa, o governador petista disse que a principal tese trabalhada pela polícia civil na investigação do assassinato de Mãe Bernadete é a atuação de facções criminosas na disputa por tráfico de drogas, uma das mais esfarrapadas desculpas usadas pelas forças de repressão para perseguir, prender e matar o povo preto, pobre e periférico.

Essa tese diverge da apontada por especialistas em conflitos envolvendo quilombolas e pelos advogados da família de Bernadete. A ialorixá e liderança quilombola não tinha envolvimento com a criminalidade. Era público que Mãe Bernadete era ameaçada por grileiros e madeireiros, que queriam extrair matéria prima ilegalmente na região do quilombo. Tanto que ela foi incorporada ao programa de segurança do governo do Estado, após o assassinato do seu filho em 2017. Esse programa cheio de falhas, que não garantiu a sua proteção.

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Cumplicidade

Movimento negro baiano tem que romper com o governo do PT

Hoje, as principais entidades dos movimentos negros na Bahia não fazem nada. Silenciam-se. Quando são obrigadas a se manifestar, buscam blindar o governo, já que os seus dirigentes ocupam cargos em secretarias.

É inadmissível seguir apoiando o governo do PT na Bahia e, ainda pior, integrar um governo que aplica uma política de segurança genocida contra o povo negro.

É preciso cobrar que as direções dessas entidades e movimentos rompam com o governo do PT. Sem independência, não é possível combater suas políticas.

É preciso construir uma forte oposição de esquerda ao governo de Jerônimo, a começar pela denúncia de sua política de segurança pública, para que não seja a direita neocarlista (ACM Neto) ou bolsonarista (João Roma) que capitalize, de maneira oportunista, o descontentamento com os governos do PT e suas medidas antipopulares.

Militância do PSTU presente na ‘Marcha da Periferia’ realizada no Capão Redondo, em São Paulo | Foto: PSTU-SP

Combater a violência policial e o genocídio

Para combater a violência policial e o genocídio do povo negro, é preciso levantar um programa de raça e classe, independente da burguesia e seus governos.

É preciso, de maneira imediata, implantar câmeras de monitoramento em todos os policiais. Mas isso não é suficiente. É preciso defender a desmilitarização das polícias e o fim da PM, com o controle social das polícias pelas organizações populares e a eleição de seus comandantes, garantindo o direito de sindicalização e greve aos policiais.

Junto a isso, é preciso pôr um fim à “guerra às drogas”, que, na verdade, é uma guerra aos pobres, que só serve ao extermínio da juventude pobre e negra e ao encarceramento em massa.

É necessário, também, revogar a Lei de Drogas, aprovada em 2006 pelo governo Lula, e descriminalizar as drogas, para combater o narcotráfico. Paralelo a isso, é preciso incentivar e organizar a autodefesa dos de baixo para responder à violência dos de cima.

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