CSP Conlutas

Central Sindical e Popular

A bancada ruralista intensificou a mobilização na Câmara para colocar em regime de urgência a votação o Projeto de Lei 490 que estabelece o Marco Temporal para a demarcação de terras indígenas. A proposta tem o apoio do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e não foi colocada em prática já nessa semana por questões regimentais.

O tema está em julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal), que tem previsão de ser retomado no dia 7 de junho. A articulação de parlamentares ruralistas e que atuam a favor dos interesses do setor visa se antecipar ao STF e garantir a aprovação do marco temporal, que é um dos mais graves ataques aos povos indígenas no país.

No STF, dois votos já foram proferidos. O ministro Nunes Marques foi favorável à tese anti-indígena do marco temporal, e o ministro relator, Luiz Edson Fachin, proferiu voto contrário ao marco temporal. Em setembro de 2021, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista, o que suspendeu o julgamento desde então.

Na semana passada, quando acontecia o ATL 2023 (Acampamento Terra Livre), com povos indígenas de todo o país em Brasília (DF), Lira se reuniu com a Frente Parlamentar da Agropecuária e prometeu colocar o PL em votação.

O objetivo da bancada é aprovar o regime de urgência, já que assim o projeto seguiria para votação direta no Plenário, sem precisar de votação em comissões da Câmara.

Projeto da morte

O PL 490 é um dos vários projetos em tramitação na Câmara contrários aos povos indígenas, mas é um dos mais graves. Um dos principais pontos do texto é a criação do “marco temporal”, tese que estabelece que as comunidades indígenas só teriam direito à terras com posse reconhecida até a Constituição de 1988.

Se aceita essa tese, isso afetaria até mesmo os povos que estão com os processos de demarcação em curso, inclusive, demarcações que já foram realizadas e que não levaram em conta a referida tese.

O texto transfere ainda do Executivo para o Legislativo a prerrogativa de demarcar as terras indígenas. Ou seja, a questão deixa de ser uma política dever do Estado para ser definido pelo Congresso, hoje dominado pela bancada ruralista e a serviço de interesses privados de mineradoras, madeireiras, do agronegócio e outros.

Como se isso não bastasse, o PL 490 libera a exploração de terras indígenas para atividades de mineração, construção de hidrelétricas estradas, e outras atividades econômicas.

Movimentos e especialistas afirmam que, na prática, a tese do Marco Temporal resultaria no aprofundamento ainda maior do genocídio indígena, da invasão de terras e da violência, além do desmatamento e destruição ambiental.

Mobilização para barrar o Marco Temporal

Os povos originários, movimentos e organizações sociais já se articulam para impedir a votação na Câmara, bem como para que o julgamento no STF tenha um desfecho ainda neste ano, derrubando essa tese que é inconstitucional. A ação em julgamento no Tribunal se refere à posse do território do povo Xokleng, de Santa Catarina, mas o resultado terá repercussão geral, ou seja, irá orientar o julgamento de todas as ações do tipo no país.

Na semana passada, durante o ATL ocorreram passeatas e vigílias de milhares de indígenas que estavam em Brasília.

Além do PL 490, há o PL 191/2020, que autoriza a mineração em terras indígenas, o PL 6299/2002, que flexibiliza o uso de agrotóxicos, o PL 2159/2021, que afrouxa necessidade de licenciamento ambiental e os projetos de lei 2633/2020 e 510/2021, que podem facilitar grilagem de terras públicas.

Para a integrante da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas, a indígena Raquel Tremembé, a tese do marco temporal é uma “sentença de morte” aos povos originários. “Vem para dizimar nosso povo, assim como o PL 191 e outros que tramitam no Congresso”, afirmou.

Segundo Raquel, o marco temporal nega os direitos de vários povos que tiveram suas terras usurpadas, griladas e foram expulsos do seu bem viver e não estavam na posse dos territórios quando da promulgação da Constituição. Afinal, são séculos de violência, opressão e exploração dos povos originários.

Não temos tempo para respirar e vem mais uma forma de violentar nossos direitos. Há tempos temos lutado para derrubar o Marco Temporal e vamos intensificar, pois queremos que esse julgamento aconteça ainda esse ano com resultado em defesa dos povos indígenas, assim como que o governo Lula cumpra a promessa de demarcar todos os territórios”, disse Raquel.

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