O governo Kalil tentou se apresentar, durante toda a pandemia, como um governo de enfrentamento à pandemia e à política do governo federal. Fechou parcialmente a cidade, em momentos em que o governo Bolsonaro fazia ampla campanha contra o isolamento social usando e abusando do perfil conservador negacionista ao extremo. Se cercou de um comitê técnico com infectologistas reconhecidos na cidade e no país.

Desde o início de seu governo, Kalil se esforçou para se apresentar como progressista, como um governante “apolítico”. Abusou das fraseologias, formas de linguagem que tinham o objetivo de passar uma imagem de sinceridade, de alguém que entendia e reconhecia os problemas da população de BH, sobretudo dos setores mais pobres. Por outro lado, tentando se apresentar como um governante “plural”, construiu um governo com a participação de diversas colorações partidárias, com secretários de matizes diversas. Porém, nada disso é suficiente para encobrir o fato de que desde o primeiro dia de gestão, governou para atender aos interesses empresariais, não por outro motivo, a marca econômica de seu governo é privatista e com pouquíssimo ou nenhum recurso para programas de desenvolvimento humano, como, por exemplo, a inexistência completa de uma política de combate ao déficit habitacional e construção de moradias. Ao mesmo tempo, as terceirizações e contratos com OSCs mais do que dobraram em seu primeiro mandato, com destaque para a educação.

O prefeito kalil pode fazer o que quiser: usar frases de efeito, bater na mesa, ser grosseiro, esbravejar, como dizem os mais novos “pagar de doido”, mas nada disso é suficiente para esconder o fato de que a arrecadação do município, durante a pandemia, cresceu acima da inflação, mesmo período em que os investimentos sociais ficaram congelados percentualmente. Nem mesmo na saúde houve ampliação dos investimentos, na assistência houve acréscimo insignificante se comparado ao crescimento da arrecadação da cidade. E na educação houve redução proporcional dos gastos. Veja dados no quadro abaixo:

2019 2020  Diferença %
Arrecadação 11,64Bi 12,74Bi  + 9,57%
% investido em educação 17,97% 17,71% _ 0,27%
% investido em saúde 36,50% 36,42% _ 0,8%
% investido em habitação 1,30% 1,21% _ 0,09%
% investido em assistência 2,68% 3,77% + 0,9%

 

(Dados do ILAESE)

Obs:

  • A inflação de 2019 a 2020 foi de 5,45%. A receita teve um crescimento maior que a inflação
  • Em verdade, a prefeitura acumula o terceiro ano consecutivo com crescimento em sua arrecadação total na casa dos 10% ao ano.
  • Nos últimos 3 anos o crescimento da receita foi de 31,08%, 17% a mais que a inflação.
  • O gasto com folha de pagamento dos servidores também não cresceu percentualmente em 2020.
  • Em 2020 cresceu o superávit (sobra de caixa) e a transferência de recursos do município para instituições privadas via terceirizações de trabalhadores e determinados serviços

Embora muita propaganda tenha sido feita, a prefeitura não investiu em testes, insumos e outros elementos necessários ao combate a pandemia do covid-19. Em BH nunca houve um lockdown total, nunca houve uma situação em que de fato só as atividades essenciais funcionassem, prova disso é que os ônibus sempre rodaram lotados.

Desde o início de 2021 a prefeitura passou a adotar um mecanismo bastante perverso, se o critério técnico não atende ao político e à pressão econômica, muda-se o critério técnico. Com isso Kalil se superou, fez escola, sua característica de “cara de pau”, agora é compartilhada pelo conjunto de seus comandados, nesse sentido, a última coletiva da prefeitura foi um espetáculo à parte: tanto o prefeito quanto 80% dos secretários presentes, afirmaram que ônibus lotado não aumenta a transmissão do vírus. Utilizaram a informação de que os trabalhadores de limpeza e conservação estão entre o grupo de maior contaminação para justificar e minimizar o efeito da superlotação do transporte coletivo e responsabilizaram os próprios trabalhadores ou a natureza de seu trabalho pelo alto contágio. Afirmaram que os “encontros familiares” eram os principais responsáveis pelos autos índices de contaminação pandêmica, sem especificar a quais encontros estavam se referindo.

A ampla abertura da cidade de BH a partir do dia 23 de setembro reflete uma avaliação de controle da pandemia, sustentado pela “equipe técnica” cara de pau, que pelo jeito enxerga a realidade a partir da sala de estar de suas casas luxuosas.

Não precisa ser muito estudado para saber que a pandemia está longe de ser controlada, basta ver os  números de mortes, contaminados, ocupações de leitos de UTIs no país, no estado e na cidade de BH.  Os trabalhadores de limpeza e conservação nunca pararam de trabalhar, passam de 2 a 4 horas por dia dentro de ônibus lotados, atuam muitas vezes em prédios de grande circulação de pessoas e é o conjunto destes elementos que fazem com que estejam mais sujeitos ao contágio e consequentemente a morte. Vale destacar que entre estes trabalhadores as mulheres, negros e negras são ampla maioria, o que confirma o que já sabíamos, todos podem ser afetados pelo vírus, mas a maior vitimização tem classe, gênero e raça.

Na mesma entrevista anunciaram a volta do atendimento presencial nas escolas de educação infantil da cidade. Não é demais ressaltar a presença da presidente do SINEP (sindicato dos donos de escolas particulares) na coletiva. Mais uma demonstração de que não foram nada técnicas as decisões tomadas. Até novembro a prefeitura trabalhava com um critério de que as escolas seriam abertas quando houvesse um parâmetro de 20 contaminados para cada 100.000 habitantes, hoje tem mais de 400. Se apoiam nas teorias de que crianças se contaminam menos e transmitem menos, teoria já bastante contestada. Mesmo que as crianças se contaminem menos, ainda assim se contaminam e morrem ou ficam com sequelas graves. O funcionamento das escolas irá fazer esse “menos” aumentar. A pergunta é quantas crianças e trabalhadores em educação a cidade está disposta a deixar morrer para que as escolas funcionem presencialmente?

Na verdade, esta pergunta não se restringe só a educação, mas ao conjunto dos trabalhadores. Quanto mais vamos deixar morrer, para que o lucro de alguns não cesse.

O fato de Kalil não ser igual ao negacionista genocida Bolsonaro não é suficiente para nada. Na verdade, ser igual a Bolsonaro é de fato coisa para poucos! Bolsonaro e seus aliados, seus partidos, os chefes das forças armadas são os responsáveis pela maior mortandade que a pandemia irá produzir. E muito pouco não ser igual é preciso ser substancialmente diferente, o que Kalil não está nem nunca esteve disposta a ser.

Belo Horizonte pode fazer mais do que oferecer cestas básicas a uma parcela da população, pode garantir renda básica municipal, pode ter um plano de moradias populares, pode ampliar os investimentos em saúde e garantir a inclusão digital de trabalhadores e estudantes para minimizar os efeitos do ensino remoto. Kalil não toma essas medidas por uma decisão política e está neste momento barganhando com nossas vidas em troca de apoio eleitoral de um setor endinheirado da cidade para sua candidatura em 2022.

O PSTU se coloca ao lado da luta dos trabalhadores de Belo Horizonte pela vida e neste momento expressa seu total apoio à greve sanitária deflagrada pelos trabalhadores em educação da rede Municipal de Educação de Belo Horizonte.

Vanessa Portugal pelo PSTU BH