Nazareno Godeiro, de Natal (RN)

 Como explicar o fato de o país ter uma das empresas petrolíferas mais rentáveis do mundo e os custos de produção mais baixos, e ter preços tão altos?

Duas notícias veiculadas na imprensa em maio confirmam o que vinham dizendo, há anos, os pesquisadores do Instituto Latino-Americano de Estudos Socioeconômicos (Ilaese). Existe um novo pré-sal no Brasil, que vai do litoral do Amapá até o Rio Grande do Norte e águas profundas de Sergipe-Alagoas, dotando o Brasil de uma das três maiores reservas de petróleo do mundo.

Por que o Brasil, que tem reservas de petróleo e custos de produção próximos aos da Arábia Saudita, vende seus combustíveis a preços cinco vezes mais altos? A resposta é que a Petrobras, à diferença da Saudi Aramco, foi privatizada em boa parte, vendida ao capital internacional, que abocanhou 63% das ações da empresa, junto com sua sócia minoritária, a burguesia “nacional”.

Ao adquirir a maioria do capital social da Petrobras, o capital internacional recebe superlucros ao produzir óleo com custo de 5 dólares o barril e vendê-lo a 98 dólares. Operação tão lucrativa que gera uma renda petroleira anual em torno de R$ 440 bilhões, dinheiro suficiente para reindustrializar o país, gerar dezenas de milhões de empregos e baixar o preço dos derivados.

Para abocanhar a maior parte dessa renda petroleira, a Petrobras está vendendo o litro de gasolina com uma margem de lucro de 275%, e o litro de diesel com margem de 465%!

 

MENOS DE UM TERÇO

Qual seria o preço dos combustíveis e do gás se a Petrobras fosse 100% estatal?

  • O custo de produção e refino de um litro de combustível na Petrobras foi de 0,72 centavos em 2021.
  • Gasolina – Caso a Petrobras cobrasse uma margem de lucro de 30%, o litro de gasolina seria vendido no posto por R$ 2,40. Poderia baixar mais, caso se reestatizasse a BR Distribuidora e se encampassem as três maiores empresas de distribuição e revenda de combustíveis (Ultra, Raízen e Braskem). Sem os atravessadores, o litro da gasolina seria comercializado a R$ 2,11.
  • Dieesel – O litro do diesel poderia ser vendido no posto a R$ 1,60, caso a Petrobras tivesse uma margem de lucro de 30%. Sem os atravessadores, o litro de diesel poderia ser comercializado a R$ 1,30.
  • Botijão de gás – A Petrobras tem uma margem de lucro de 123% na venda de um botijão de gás. Com um lucro de 30%, o preço baixaria para R$ 49,91. Caso reestatizasse a Liquigás e a União encampasse as outras quatro distribuidoras (Ultragaz, Supergasbrás, Nacional Gas e Copagaz), cairia o preço do botijão para R$ 31,04.

Esse é o preço justo, que poderia ser cobrado ao povo brasileiro, caso a Petrobras fosse 100% estatal e controlada pelos trabalhadores.

ENTREGA DO PAÍS

Privatização e desnacionalização da economia brasileira

O mesmo processo de desnacionalização ocorreu no setor de mineração e do agronegócio. O capital internacional migrou para lá, iniciando um processo de abandono da indústria de transformação, com o fechamento de milhares de empresas industriais, como se expressou recentemente na pretensão da Chery em abandonar o Brasil e no pedido de recuperação judicial da Avibrás, que é o principal fabricante de material bélico pesado do Brasil.

Assim, processou-se uma recolonização do Brasil, na forma de uma economia baseada nas exportações de produtos primários em detrimento do mercado interno brasileiro.

Novo setor da burguesia assume o poder

Com o slogan “Agro é tech, agro é pop”, um novo setor da burguesia – agro/mineral/energia/bancos – assumiu o comando da economia e da política no Brasil, associado ao capital internacional.

Este setor necessita de um “Bonaparte” para levar até o fim a destruição da natureza, para produzir soja e capim (enquanto mineradores e madeireiros abrem clareiras na floresta), e a destruição do emprego formal, uma nova forma de assalariamento, sem salário fixo, sem direitos, enfim, uma semiescravidão.

Visto deste ângulo, pode-se compreender o fenômeno Bolsonaro, elevado ao poder de Estado para destruir a indústria de transformação do Brasil e as relações trabalhistas que predominaram no Brasil de 1940 até 1990.

Sua subserviência ao maior bilionário do planeta, Elon Musk, disposto a entregar a Amazônia e a base de Alcântara aos cuidados de uma empresa privada, a SpaceX, é a demonstração mais evidente para qual setor da burguesia mundial está governando. No jantar com Musk estiveram representantes do agronegócio, da mineração e dos bancos brasileiros.

RECOLONIZAÇÃO

Uma nova orientação: Desinvestimento no Brasil e pilhagem colonial

Também está se revelando uma mudança na orientação do capital internacional e da burguesia “nacional” para o Brasil: de grandes investimentos na indústria automobilística entre 1945 e 1985 para um sistema colonial de extração de riquezas primárias, de pilhagem do país.

A demonstração desse fenômeno se expressa na Petrobras, em 2021: distribuiu 95% do lucro como dividendos aos acionistas, no valor de R$ 101 bilhões, deixando apenas R$ 5 bilhões para investir no pré-sal.

Este fenômeno gerou uma contradição na Petrobras: quanto mais ela gera riquezas, menos investe em si mesma e no país, como fica evidente no gráfico.

Essa transformação regressiva do Brasil está derrubando o país no Sistema Mundial de Estados: de uma submetrópole industrial na América do Sul para uma semicolônia exportadora de commodities. É uma mudança profunda na estrutura produtiva do país que está se refletindo na mudança da composição burguesa dominante que, por sua vez, repercutirá no Estado capitalista brasileiro e no regime político.

FALSA ALTERNATIVA

O acordo com Alckmin expressa a capitulação de Lula à recolonização

Compreendendo essas transformações estruturais no país e nas classes sociais, pode-se entender a dubiedade do discurso de Lula e do PT diante da crise da Petrobras.

O PT fala em parar a privatização da empresa, mas nega a anulação das realizadas por Bolsonaro, mesmo diante do escândalo e ilegalidade destas privatizações. Basta notar que o BTG-Pactual, banco que Paulo Guedes fundou, é sócio da empresa 3R Petroleum, que comprou os campos terrestres e de águas rasas da Petrobras por uma mixaria. Desde 2015, venderam-se partes importantes da Petrobras no valor de R$ 243 bilhões.

Lula fala em “abrasileirar” os preços dos combustíveis, mas o PT segue defendendo que os preços continuem relacionados com o mercado internacional. A proposta do PT – o Projeto de Lei (PL) 1.472/2021, aprovado no Senado em 11 de março de 2022, com apoio de Bolsonaro –, cria um “fundo moderador de preços” lastreado nos lucros pagos pela Petrobras ao Governo, para subsidiar os distribuidores privados.

Lula e o PT não defendem a anulação dos leilões do pré-sal, que vêm desde 2013 com Dilma e foram acelerados por Temer e Bolsonaro. Lula e o PT defendem o regime de partilha na exploração do pré-sal, modelo que entrega a maior parte do petróleo às empresas estrangeiras.

Devemos recordar que durante o primeiro mandato de Lula, Carlos Lessa, presidente do Banco Central, juntamente com Ildo Sauer, diretor da Petrobras na época, propôs a recompra de todas as ações da Petrobras negociadas na Bolsa de Nova York. A proposta foi recusada por Dilma, que era ministra de Minas e Energia.

Também é preciso recordar que a retomada do plano de privatização da Petrobras se deu em 2014, ainda no governo Dilma.

Portanto, se depender de Lula e do PT, não teremos a reestatização da Petrobras para retomar seu papel de indutora da recuperação industrial do Brasil.

O acordo com Alckmin, que representa um setor importante da burguesia brasileira, sinaliza uma capitulação do PT à recolonização do país, na sua nova forma de pilhagem colonial.

PROGRAMA

Petrobras 100% estatal, sob controle dos trabalhadores

A classe trabalhadora não pode embarcar acriticamente em nenhuma candidatura presidencial. Ao contrário, deve elaborar um programa para a recuperação industrial do país, partindo da reestatização da Petrobras, sob controle dos trabalhadores, a anulação de todas as privatizações, a anulação das reformas previdenciária e trabalhista, para garantir terra, trabalho e soberania, em ruptura com o capitalismo e a dominação imperialista do Brasil.