Bolsonaro e os presidentes da Câmara e do Senado, Arhtur Lira e Rodrigo Pacheco Foto Ag Câmara

Depois de muito vai-e-vem, a Câmara dos Deputados aprovou em segundo turno, na noite desta terça-feira, 9, a chamada PEC dos Precatórios, por 323 votos a 172. Foi um placar maior que a votação em primeiro turno, quando 312 deputados aprovaram a mudança na Constituição (era necessário o mínimo de 308).

Esse resultado ocorreu após a liberação de pelo menos R$ 1,4 bilhão em emendas. O deputado Celso Mandaner (MDB-SC) afirmou que, na primeira votação, ofereceram R$ 15 milhões por voto no plenário. Além disso, Arthur Lira (PP-AL) alterou o regimento e liberou o voto de deputados licenciados e até mesmo no exterior.

O governo e o Congresso Nacional esperam liberar mais de R$ 90 bilhões com a medida. Além da alteração no cálculo do chamado teto dos gastos, a PEC institui um calote nos precatórios, as dívidas judiciais da União já julgadas. Dos R$ 89 bilhões que o governo deveria pagar em 2022, vai pagar só R$ 40 bi. Entra nesse bolo os chamados precatórios alimentares, as dívidas de pensões, aposentadorias, salários ou indenizações por mortes, inclusive os que hoje têm prioridade no recebimento dessas dívidas, caso de idosos e pessoas com deficiência.

Se hoje já é comum a pessoa morrer antes de receber a dívida de uma revisão de aposentadoria ou pensão, ou até mesmo do BPC (Benefício de Prestação Continuado), a situação só tende a se agravar com a PEC. A alternativa a quem espera receber esse dinheiro será usar o valor como crédito para abater algum imposto, aceitar parte com ações de estatais, ou um desconto de 40% do valor da dívida.

Enquanto mantém o pagamento dos juros da mal-chamada dívida pública aos banqueiros (só no passado foram R$ 347 bilhões só em juros segundo o próprio governo), dá o calote em trabalhadores, aposentados e pensionistas. E com a mentira de que esse dinheiro vai para pagar o Auxílio Brasil de R$ 400 a quem recebia o Bolsa Família.

Bolsonaro, depois de encerrar o pagamento do auxílio-emergencial, decretou o fim do Bolsa Família, cuja última parcela foi paga em outubro. Em seu lugar, instituiu o eleitoreiro Auxílio Brasil, cujo valor é hoje de, em média, R$ 217, com a promessa de elevá-lo a R$ 400 com a aprovação da PEC, e com duração até dezembro de 2022. Depois disso, não tem nada garantido.

Além de insuficiente, já que R$ 400 não paga metade de uma cesta básica, o governo promete atingir 17 milhões de pessoas. Isso é só um quarto dos 67 milhões que recebiam o auxílio-emergencial no ano passado (de R$ 600 em média), e menos da metade dos 39 milhões que receberam a versão reduzida do auxílio em 2021. Com o fim abrupto do programa, algo como 22 milhões ficarão ao leu, sem qualquer renda, em meio à mais profunda crise econômica e social do país.

Bolsonaro poderia simplesmente ter estendido o auxílio-emergencial, sem nem precisar de uma PEC. O que está por trás desse calote não é o Bolsa Família turbinado e com prazo para acabar, mas um esquema bilionário de compra de votos via emendas secretas, a fim de manter sua base no Congresso e impulsionar sua campanha eleitoral.

22 milhões jogados ao leu

Auxílio-emergencial em 2020 – 67 milhões de pessoas

Auxílio-emergencial em 2021 – 39 milhões de pessoas

Bolsa Família – 14,6 milhões de pessoas

Auxílio Brasil – 17 milhões de pessoas

TOMA-LÁ-DÁ-CÁ

Bolsolão: maior esquema de compra de votos da história

A liberação da grana com o calote nos aposentados e pensionistas deve irrigar as emendas secretas com algo como R$ 10 bilhões. Essas emendas foram instituídas a partir do ano passado, e dá ao relator do Orçamento, hoje ao presidente da Câmara, Arthur Lira, o poder de destinar bilhões para comprar deputados como bem entender, sem nem precisar especificar o destino desse dinheiro. Tudo por debaixo dos panos.

Para se ter uma ideia, as emendas parlamentares normais, que já é um mecanismo institucionalizado de compra de votos, soma hoje R$ 9,6 bilhões. As emendas de bancada, R$ 7,3 bilhões. Já as emendas secretas totalizam R$ 18,5 bilhões. É seguramente o maior esquema de compra de votos da história. Com o agravante de que, sem precisar registrar para onde vai, é muito mais fácil ele acabar direto no bolso dos parlamentares.

Nesse dia 9, o Supremo Tribunal Federal (STF), definiu maioria por suspender as emendas secretas, e abriu uma crise com Lira e o centrão. No entanto, mesmo assim, a PEC passou em segundo turno na Câmara. Isso porque o Congresso Nacional espera reverter essa decisão, no próprio STF, ou simplesmente mudando a rubrica desse dinheiro, passando para o Governo Federal e, de lá, para os deputados. O que se sabe é que esse balcão de negócios bilionários vai continuar.

Emendas parlamentares (2021)

Individuais (senadores e deputados) – R$ 9,6 bilhões

De bancada – R$ 7,3 bilhões

Emendas secretas – R$ 18,5 bilhões