Gérson Santos, do Flamengo. Foto Alexandre Vidal/CRF
Rodrigo, do Rio de Janeiro (RJ)

Gérson Santos, jogador do Flamengo, foi vítima de racismo durante jogo contra o Bahia em partida válida pela 28ª rodada do Campeonato Brasileiro. Aos 7 minutos do segundo tempo, o jogador Ramírez, do Bahia, disse “cala a boca, negro” para Gerson. A partida foi interrompida com as reclamações de Gerson, mas nenhuma atitude foi tomada pelo árbitro. Depois do jogo, a Rede Globo transmitiu a gravação de seus microfones que captaram a voz do treinador do Bahia, Mano Menezes, justificando a atitude racista de Ramírez afirmando que “com o Daniel Alves, que engoliu ele [Gerson], ele não discutiu”. Mano Menezes tentou minimizar dizendo que Ramirez, de 23 anos, “é garoto, ele vai aprender”. O técnico ainda provocou Gerson dizendo à beira do campo: “Virou malandragem”. O técnico repetiu diversas vezes o termo “malandro” e “malandragem”, que são expressões historicamente utilizadas de forma racista.

A denúncia sobre o caso aconteceu na entrevista que Gerson concedeu ao fim do jogo. “Eu fui falar com ele [Ramirez] e ele falou bem assim pra mim: cala a boca, negro” disse Gerson. “Eu nunca falei nada disso porque eu nunca sofri, mas isso aí eu não aceito. Eu não aceito. E eu nunca falei de treinador, mas o Mano [Menezes], ele tem que saber respeitar. Ele tem que saber respeitar. Tô vindo falar aqui de mim e de todos os negros que existem no Brasil”, complementou o jogador.

O jogo permaneceu paralisado, e era notório que o jogador estava indignado com o que ouviu do adversário. Mas apenas após a denúncia feita ao vivo pelo atleta foram exibidas as imagens em que se percebe Gérson explicando o ocorrido e os áudios com os comentários de Mano Menezes.

O Flamengo se pronunciou em sua conta no Twitter dizendo que “repudia veementemente o episódio lamentável ocorrido na partida deste domingo com o atleta Gerson, que foi vítima de injúria racial. O racismo desumaniza, fere e mata. O racismo é inadmissível. Exigimos profunda apuração do fato”.

E o Bahia, que possui um histórico de engajamento na luta contra o racismo, demitiu o técnico Mano Menezes após o jogo Já “Índio” Ramirez foi suspenso pelo clube.

O racismo segue nos gramados mundo afora

O futebol mundial foi surpreendido, há menos de duas semanas, pela atitude dos jogadores do Paris Saint Germain e Istanbul Basaksehir, que durante jogo da Champions League, deixaram o gramado e se negaram a continuar a partida depois que o árbitro auxiliar ofendeu Pierre Webó, integrante da comissão técnica do time turco com insultos racistas. A partida foi adiada para o dia seguinte.

Infelizmente o racismo em eventos esportivos não é nenhuma novidade. Daniel Alves – citado por Mano Menezes – já foi alvo de ataques racistas quando atuava pelo Barcelona, na Espanha, quando torcedores jogaram bananas  no campo.

Em 2005, o jogador argentino Leandro Desábato foi preso após uma partida disputada no Morumbi pelo Quilmes contra o São Paulo,  pela Libertadores da América. O argentino chamou o atacante do São Paulo, “Grafite”, de “macaco”, “negrinho” e outras ofensas de cunho racial. Desábato foi detido, mas libertado após alguns dias.

Na quarta-feira (16/12) a denúncia do menino Luiz Eduardo Bertoldo Santiago, de apenas 11 anos, se tornou viral na internet. No vídeo, Luiz Eduardo conta aos prantos que na partida do campeonato “Caldas Cup”, no sul de Goiás, o técnico do time adversário “orientava” as outras crianças sob o seu comando gritando repetidamente “fecha o Preto”.

A jogadora norte-americana Megan Rapinoe, vencedora da Bola de Ouro, e conhecida por seu ativismo, declarou que gostaria de ver jogadores como Cristiano Ronaldo, Messi e Ibrahimovic se posicionarem e usarem o prestígio que possuem no combate às injustiças, citando sua admiração por astros como LeBron James e Lewis Hamilton. Em trecho do seu discurso, disse: “Não estou falando sobre usar uma camiseta do Black Lives Matter, estou falando sobre ir mais fundo”, disse a campeã olímpica.

O combate ao racismo cresce no mundo

A postura de jogadores, árbitros, técnicos e da cobertura jornalística é de extrema importância na denúncia e no combate ao racismo. Por isso saudamos a atitude de Gérson, de não se submeter à omissão da comissão de arbitragem e denunciar a atitude racista  de Mano Menezes, ex-técnico da seleção brasileira.

Em maio e junho deste ano torcidas organizadas no Brasil ecoaram os protestos contra o racismo que explodiram no mundo inteiro a partir da revolta com o assassinato racista de George Floyd pela polícia nos Estados Unidos¹.

A cada dia cresce a consciência de enfrentar o racismo, e a burguesia é cada vez mais coagida a responder a essa demanda, a repercutir denúncias e a dar respostas pontuais a situações que a imensa população de negras e negros mundo afora já não suportam mais. E é importante que essa consciência cresça.

Mas é preciso que cresça ciente de que é uma luta que não se pode vencer sozinho. É muito importante quando jogadores como Gérson, Richarlyson, Neymar e Daniel Alves se posicionam politicamente contra o racismo, e é melhor ainda quando recebem solidariedade de tantos outros jogadores, clubes, torcida e organizações. Só que é preciso entender que não se vence o racismo, sem derrotar também o machismo e a LGBTfobia, e que não se acaba com as opressões sem derrotar também a exploração capitalista.

As opressões servem para dividir a classe trabalhadora e aumentar a exploração econômica, e com isso as vitórias nas lutas contra as opressões serão parciais se não se somarem na luta contra o capitalismo. Enfrentar o racismo é um ipasso importante, mas de uma longa caminhada em direção ao socialismo.

E não faltam exemplos de momentos em que o esporte serviu para a denúncia e combate contra opressão, recomendamos aqui a leitura do artigo “Torcida, atletas e a luta dos trabalhadores” publicada em nosso site.