(Resende - RJ, 17/08/2019) Presidente da República, Jair Bolsonaro durante o desfile militar.rFoto: Marcos Corrêa/PR
Redação

No momento em que fechávamos esta edição, a CPI da Covid-19 havia acabado de votar seu relatório final, pedindo o indiciamento de 78 pessoas, incluindo Bolsonaro e seus filhos. O presidente foi responsabilizado por nove crimes, incluindo alguns tipificados no Código Penal, como o de “epidemia com resultado morte” e “charlatanismo”, além de crimes “de responsabilidade” e “contra a humanidade”.

Foi, porém, uma versão branda do relatório preliminar que o senador Renan Calheiros (MDB-AL) havia divulgado na semana anterior, e que enquadrava Bolsonaro nos crimes de “homicídio doloso” (quando há intenção de matar), além de “genocídio” e “genocídio indígena”.

Essa primeira versão do relatório desatou uma crise na Comissão e esses crimes mais graves acabaram sendo deixados de lado. O principal opositor a que Bolsonaro fosse chamado de genocida foi o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), que recebeu nada menos que R$ 220 milhões em emendas do governo, nas vésperas da votação.

Mais que uma consequência jurídica, o crime de genocídio tem um sentido político. Bolsonaro, com sua gestão de morticínio, massificou um termo que a população não conhecia. Insistir na acusação talvez fosse um pouco demais para setores que, de fato, não querem tirá-lo de lá.

Uma política consciente de assassinato em massa

Ainda em 2020, estava evidente que, mais do que incompetência e sadismo, o governo tinha uma estratégia bem definida: promover a chamada “imunidade de rebanho”; impedir o fechamento da economia, para não se desgastar eleitoralmente (e não prejudicar os lucros da burguesia); e fazer propaganda de soluções mágicas, como a cloroquina, a fim de dar uma falsa sensação de segurança para que o povo saísse às ruas, trabalhasse normalmente e se contaminasse.

Fato comprovado também através do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário (Cepedisa), da Faculdade de Saúde Pública da USP, em parceria com a Conectas. O “Mapeamento e análise das normas jurídicas de resposta à COVID-19 no Brasil” debruçou-se sobre 3.049 normas federais e 4.427 estaduais, só em 2020, além de discursos e atos do governo Bolsonaro, concluindo de forma inequívoca: “existiu uma estratégia institucional de propagação do Coronavírus, promovida pelo governo federal.”

As ações elencadas pelo estudo vão desde o veto federal à obrigatoriedade do uso de máscaras à omissão no combate à pandemia, como através da obstrução de medidas adotadas no âmbito dos estados e municípios, passando pela propaganda contra a saúde pública e a disseminação de notícias falsas.

Mas poderíamos caracterizar tudo isso “apenas” como um extermínio em massa? Vejamos. A pandemia atingiu, sobretudo, a população pobre e negra, com menor acesso à moradia digna, serviços de saúde e condições mínimas de higiene. Dados da ONG Instituto Polis, compilados em 2020, na cidade de São Paulo, mostram que, enquanto entre os brancos morriam 157 pessoas a cada 100 mil, entre os negros eram 250 mortes. Entre as mulheres negras, morreram 140 a cada 100 mil, enquanto que, entre as mulheres brancas, foram 85.

Não houve uma política de extermínio indefinida ou generalizada. Ainda que o vírus não escolha cor ou classe social, a política de Bolsonaro acertou um alvo muito bem estabelecido: pobres e a população negra. O que seria isso, se não um genocídio?

O genocídio indígena

Outro ponto retirado do relatório da CPI foi o que tipificava o crime de genocídio indígena, que foi exatamente o que Bolsonaro promoveu. Em julho de 2020, por exemplo, quando sancionou o Projeto de Lei 1142/2020, que definia indígenas e quilombolas como grupos vulneráveis à pandemia, Bolsonaro vetou o acesso à água potável, às cestas básicas e à distribuição de materiais de higiene, limpeza e desinfecção de aldeias. Vetou, ainda, a instalação de equipamentos hospitalares para esses grupos, como UTIs e ventiladores mecânicos.

O que faltou em produtos de necessidades básicas e hospitalares, sobrou em cloroquina. Foram centenas de milhares de comprimidos distribuídos nas reservas indígenas, muito acima do que normalmente é enviado para combater a malária. Fica evidente que o governo se aproveitou da pandemia para impor o extermínio indígena, o que já faz, “normalmente”, como no caso do Marco Temporal.

Vamos às ruas no dia 20 de novembro

Fora Bolsonaro e Mourão, já!

A CPI foi um produto da crise e aprofundou o desgaste do governo. Mas não há disposição para tirar Bolsonaro agora, como ficou evidente no abrandamento do relatório final. À oposição interessa apenas desgastá-lo eleitoralmente. O PT, em favor de Lula; a direita tradicional, em nome da “terceira via” que espera construir até lá.

E mesmo essas acusações irão para a gaveta do Procurador Geral da República, Augusto Aras (reconduzido ao posto com os votos do PT) e de Arthur Lira. A única forma de se tirar Bolsonaro, a prioridade número 1 para conter a destruição do país, é através da mobilização. É preciso ir às ruas, jogar peso no próximo dia 20 de novembro e, juntamente com os movimentos negros, fazer grandes manifestações que expressem a real correlação de forças. E, junto a isso, organizar uma Greve Geral, que possa bater duro no governo e em sua política de entrega, fome e miséria.