Flavia Bischain, de São Paulo (SP)

O secretário de Educação do estado de São Paulo, Rossieli Soares, anunciou a volta às aulas presenciais de forma parcial a partir de 8 de setembro. Enquanto fazia o anúncio, imagens ao fundo mostravam uma escola com torneiras adaptadas e uma estrutura impecável, com marcação no chão, funcionário na porta e espaços sendo desinfetados.

A cara de pau do secretário é revoltante! As aulas voltarão parcialmente na rede estadual nas cidades autorizadas pelos prefeitos e que estão há 28 dias no amarelo. Nesse mês de setembro, o retorno seria supostamente para recuperação, mas na verdade se trata de um ensaio para reabrir em todo o estado em outubro.

No mundo real, as escolas que conhecemos não têm sabonete, nem tampa no vaso sanitário, nem ventilação adequada. Muitas têm chão quebrado, infiltração e alagam quando chove. Nesse momento, muitas escolas sequer têm merendeiras e faxineiras, porque a maioria foi demitida pelo governador João Doria (PSDB) depois do encerramento do contrato com as terceirizadas.

As escolas reais também não têm funcionários para ficar na porta recebendo os alunos, acompanhando-os pelos corredores, medindo a temperatura. Aliás, não adianta medir a temperatura, já que a maioria das crianças é assintomática, embora não sejam imunes.

Quantas escolas de fato se parecem com a escola de fantasia mostrada pelo secretário? A verdade infelizmente é que as crianças retornarão para as escolas desestruturadas em plena pandemia. Elas levarão o vírus para suas casas, para os professores e funcionários, para o transporte, para o comércio, ampliando a contaminação e arriscando a vida de suas famílias, muitas das quais têm idosos ou pessoas com doenças crônicas.

E o que é pior: não haverá recuperação do conteúdo. Grande parte dos professores é do grupo de risco e não poderá retornar. Outros dariam aula com medo e com grande chance de se contaminar. Isso sem contar a imensa dificuldade de ser compreendido dando aula de máscara.

A comunidade escolar precisa se unir contra esse absurdo e dizer que não voltará. Não há segurança sanitária, nem testes, nem vacina, nem controle da pandemia. Em cada escola, é preciso organizar cartas abertas e conselhos virtuais, posicionar-se contra a volta às aulas na pandemia.

Se o secretário insistir, precisaremos debater e organizar uma greve sanitária em defesa da vida, junto a estudantes, pais e trabalhadores da educação. Não seremos corresponsáveis por essa política criminosa de Doria e Rossieli!

 

Modelo de Carta Aberta – Coletivo Reviravolta na Educação (para ser adaptado à realidade de cada escola)

Carta Aberta aos pais, aos estudantes e à comunidade escolar

Nós, professores da EE ____________, cidade______________, somos contra a volta às aulas presenciais enquanto não houver controle da pandemia, testes em massa ou vacina contra a COVID-19. A política do governo de São Paulo de retorno parcial a partir de 8 de setembro é um ensaio para o retorno em todo o estado em outubro. Não seremos corresponsáveis por essa decisão que colocará milhares de vidas em risco.

O Brasil ultrapassou o triste marco de 126 mil mortos, superado apenas pelos Estados Unidos. No estado de São Paulo, são mais de 31 mil mortos. Na capital, os dados oficiais indicam mais de 300 mil infectados (número superior ao de países inteiros, como Itália e Alemanha). A maioria das mortes se concentra nas periferias, onde está grande parte das escolas públicas. As vítimas são principalmente os pobres, especialmente negros e negras, que não tiveram direito ao isolamento social ou à quarentena e foram obrigados a continuar arriscando-se no transporte público lotado, no trabalho ou nas filas em busca do auxílio emergencial (que muitas vezes não chegou). O mesmo governo que não garantiu as condições para a proteção dos trabalhadores, agora quer expor as crianças e os adolescentes, agravando ainda mais os riscos de contaminação.

As crianças não são imunes e podem ficar com sequelas. No Brasil, mais de 130 foram vítimas fatais do vírus só no mês de maio. Estudos apontam que elas carregam uma alta carga viral e, como muitas são assintomáticas, transmitem facilmente o vírus para suas casas e famílias, para o transporte público e comércio. No estado de São Paulo, mais de 2 milhões de idosos e pessoas com doenças crônicas (diabetes, problemas cardíacos ou pulmonares) vivem com crianças em idade escolar e têm maior risco de morte segundo a Fiocruz.

Muito diferente do que mostra o governo, as escolas não têm estrutura nem segurança sanitária. Não têm sabonete, nem ventilação adequada, nem banheiro, nem sala em boas condições. Além disso, faltam funcionários para acompanhar os alunos na escola e nos corredores, e grande parte das escolas estão neste momento sem merendeiras e faxineiras, depois que o governador João Doria encerrou o contrato com as empresas terceirizadas, acarretando na demissão de mais de 4 mil trabalhadoras.

Muitos professores e funcionários das escolas são do grupo de risco e não poderão retornar. Isso demonstra que a preocupação de Doria e Rossieli não é de fato com a aprendizagem das crianças nem com a recuperação dos conteúdos, que não poderá ser realizada nesse momento, em meio à pandemia. Doria visa atender aos interesses dos donos das escolas privadas e dos empresários, que não se importam com a realidade da escola pública nem com os filhos dos trabalhadores.

Embora grande parte dos alunos não tenha tido acesso ao ensino remoto e este sistema seja incapaz de oferecer um ensino de qualidade aos estudantes, a solução não é arriscar a vida da comunidade escolar. A recuperação do conteúdo deverá ser organizada junto aos pais e aos estudantes no próximo ano, de modo a não prejudicar nenhum aluno. No momento, nossa preocupação primordial deve ser com a vida. Não aceitamos que a responsabilidade de retornar às escolas seja transferida aos pais de forma individual. Tampouco concordamos que um “comitê local”, sem formação técnica ou médica, assuma essa incumbência, como aponta a Resolução 61/2020. Quem deve assumir a responsabilidade e assegurar que as aulas retornem apenas quando houver as devidas condições sanitárias e nenhuma vida em risco é o governador e a Secretaria da Educação!

Não ao retorno presencial na pandemia! Volta às aulas só com vacina, testes em massa e segurança sanitária!

Conteúdo se recupera, Vidas não!

____________, ______ de setembro de 2020