Miranda (MS)16 09 2019 – Animais mortos ou se deslocando para fugir do fogo e em busca de água, um rastro de destruição em mais de 60% da vegetação nativa da fazenda e um verdadeiro exército de homens e máquinas lutando ao limite para controlar os focos de calor. Este é o cenário que se tornou rotina na Estância Caiman, de 52 mil hectares, no Pantanal de Miranda. O fogo tomou conta da região desde o dia 10 e está sendo combatido por cerca de 70 pessoa foto Saul Schramm
LIT-QI

Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional

Juan Connolly

Milhões de hectares das maiores zonas florestais do planeta, a Amazônia e o Ártico(Alaska, Siberia, Groenlândia) são consumidos em incêndios provocados pela ação humana.

Cidades tão diferentes como São Paulo ou Yakutia (Russia) viram seus céus escurecerem em pleno dia devido à fumaça e pó que os ventos empurraram.

Encontramo-nos diante de uma crise ecológica global na qual a acumulação dos fatores destrutivos da natureza, próprios do sistema capitalista e suas consequências, não só estão destruindo pouco a pouco o planeta e as espécies que o habitam, como também nos conduzem a uma extinção global já quase irreversível.

Esta dimensão ambiental da crítica ao capitalismo nunca foi alheia a Marx, Lenin, nem aos Bolcheviques Russos. Em seus escritos e experiências encontramos uma perspectiva que hoje mais do que nunca urge recuperar e desenvolver ainda mais.

Em Marx e Engels, por exemplo, existe toda uma crítica ao saque sistemático da riqueza natural que o capitalismo opera e a interferência que causa no equilíbrio da natureza.

Esta crítica é sintetizada por John Bellamy Foster mediante o conceito de Fratura Metabólica.

Para Marx a espécie humana depende de seu trabalho sobre a natureza para viver.

Durante este trabalho acontece uma relação metabólica entre o ser humano e a natureza onde o primeiro se alimenta da natureza para viver e depois descarta nela nutrientes que já não requer mas que a natureza necessita para continuar se desenvolvendo.

Em O Capital, Marx denuncia a indústria e a agricultura capitalistas por fraturar o adequado equilíbrio que deve existir entre os nutrientes que o ser humano toma dos solos para se alimentar e o que devolve aos mesmos para que possam continuar produzindo:

A produção capitalista congrega a população em grandes centros, e faz com que a população urbana alcance uma preponderância sempre crescente…perturba a interação metabólica entre o homem e a terra, isto é, impede que se devolva à terra os elementos constituintes consumidos pelo homem na forma de alimentos e roupa, e impede portanto o funcionamento do eterno estado natural para a fertilidade permanente do solo…Mas, ao destruir as circunstâncias que rodeiam o metabolismo…obriga sua sistemática restauração como lei reguladora da produção social, de uma forma adequada ao pleno desenvolvimento da raça humana…Todo progresso na agricultura capitalista é um progresso na arte, não de roubar o trabalhador, e sim de roubar o solo; todo progresso no aumento da fertilidade do solo durante um certo tempo é um progresso para a ruína das fontes duradouras dessa fertilidade…A produção capitalista, em consequência, só desenvolve a técnica e o grau de combinação do processo social de produção solapando simultaneamente as fontes originais de toda riqueza: o solo e o trabalhador. [1]

Marx escrevia essa passagem baseando-se em um disciplinado estudo sobre os conhecimentos mais modernos da química agrícola da época e em um contexto de crise agroalimentar na Europa e Estados Unidos, no qual as práticas agrícolas capitalistas haviam drenado os nutrientes dos solos deixando-os inférteis para a agricultura.

Já no século XIX tinha claro como a falta de planificação na produção e a frenética concorrência entre capitalistas pela obtenção de lucros (isto é a propriedade privada) implicava não só a ruína para a classe trabalhadora, como tendia a desequilibrar a relação do ser humano e a natureza e a destruir esta última.

Muitos dos problemas que hoje ameaçam nosso planeta tem a mesma raiz. Podemos citar por exemplo como o desmatamento, a urbanização descontrolada e o excesso de uso dos combustíveis fósseis esgotam a capacidade do ecossistema terrestre para absorver os gases de efeito estufa e com isso sua temperatura aumenta.

Por isso, para Marx o socialismo devia restabelecer o ciclo material como “lei reguladora da produção” e, mediante a apropriação coletiva dos meios de produção, fazer a gestão dos recursos e da economia para “regular racionalmente seu metabolismo com a natureza”, em lugar de serem arrastados pelo mecanismo cego da busca do benefício individual e privado.[2]

[1] Marx, K. El Capital Tomo I. Citado en Bellamy,J. La Ecologia de Marx. P249.

[2] Parodi, Juan. “Capitalismo y Crisis Ecológica”.

Tradução: Lilian Enck