Fábio Bosco, de São Paulo (SP)

Em 24 de fevereiro de 2022, o ditador russo Vladimir Putin iniciou a invasão militar da Ucrânia. Seu plano era tomar, em alguns dias, a capital Kiev, toda margem oriental do rio Dnieper e todo o litoral, para impor um ditador vinculado a Moscou.

Este plano fracassou devido ao levante popular contra a invasão, protagonizado pela classe trabalhadora ucraniana e a população em geral. No dia seguinte à invasão, cerca de 18 mil trabalhadores e trabalhadoras de Kiev se apresentaram para receber armas para combater a invasão.

Na época, falando em Kherson, no Sul do país, o general Maksym Marchenko disse que “cidadãos locais monitoravam constantemente o movimento das tropas russas e passavam coordenadas para os atiradores ucranianos. Gente comum destruiu veículos blindados e fez prisioneiros”, afirmando, ainda, que “nós paramos as forças russas porque o povo se levantou”.

Em questão de dias, o Exército Nacional e as Forças de Defesa Territorial ampliaram seus contingentes de 200 mil para um milhão de combatentes. Além da resistência armada, existe também a resistência desarmada, dentro e fora dos territórios ucranianos ocupados pela Rússia.

A guerra num impasse

Esta resistência impôs a primeira derrota militar às forças de Putin, em Kiev e seus arredores, no final do mês de março. Mas nem tudo são rosas. As tropas russas deixaram um rastro de destruição, massacres de civis, estupros utilizados como “arma de guerra”, como relatados nas cidades de Bucha e Lyman. Além disso, sitiaram, destruíram e tomaram a importante cidade portuária de Mariupol, em 13 de abril.

A segunda derrota militar de Putin veio em 10 de setembro quando as tropas russas tiveram que fugir da região de Kharkiv. Em novembro, a terceira derrota russa na importante cidade de Kherson, no sul do país. Desde então prevalece uma situação de impasse, com tropas russas ocupando 15% do território ucraniano.

A situação dentro da Rússia

Frente a estas derrotas, Putin convocou 300 mil reservistas, em 21 de setembro passado, e concentrou o esforço militar nas províncias de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia, onde foram realizados fraudulentos referendos de anexação à Rússia.

A convocação de reservistas provocou novos protestos contra a guerra e a fuga de um milhão de russos do território nacional. Cada vez mais a população russa vê a invasão da Ucrânia como uma guerra de Putin e não como sua. E as nacionalidades oprimidas dentro da Rússia e nos países vizinhos se identificam com o sofrimento e a luta dos ucranianos.

Além disso, a oligarquia russa vê seus negócios prejudicados pela perda de parte do mercado europeu de gás e petróleo e, também, pela desmoralização da indústria armamentista russa e de seus criminosos exércitos de mercenários, como o famoso grupo Wagner. Doze oligarcas ou altos funcionários de empresas russas morreram misteriosamente, provavelmente por dissidência política. Putin se mantém no poder graças à ditadura.

Estados Unidos

O papel do imperialismo norte-americano e dos países da OTAN

A primeira proposta do presidente Joe Biden foi retirar Zelensky de Kiev, entregando a capital ucraniana para Putin. Depois que a resistência ucraniana impôs a primeira derrota a Putin nos arredores de Kiev, os imperialismos norte-americano e europeu passaram a entregar armamento “defensivo” para a Ucrânia armamento – na verdade material bélico obsoleto e de alcance limitado. Ou seja, decidiram alimentar o impasse, que lhes favorece. Querem impedir tanto uma vitória ucraniana, quanto uma rápida vitória russa.

Esta política de preparar uma derrota ucraniana limitada não se dá sem contradições na Europa. De um lado, os países limítrofes da Rússia, como a Polônia e a Lituânia, queriam entregar mais armas para derrotar a Rússia, já que sua população teve uma experiência amarga nos tempos da União Soviética, a partir de Stálin.

Por outro lado, o presidente de extrema-direita da Hungria, Viktor Orbán, apoia Putin. No meio disto, estão os governos da França e da Alemanha, que trabalham contra uma derrota russa, mas têm a maioria da população apoiando a Ucrânia.

Oligarcas

A guerra e o governo Zelensky

O presidente Zelensky foi eleito em 2019, em meio à crise econômica, social e política da jovem democracia burguesa ucraniana.

Com o fim da União Soviética, a Ucrânia conquistou sua independência em 1991. Desde então, governos da oligarquia ucraniana têm se alternado no poder, pairando entre Moscou e a União Europeia. Em 2014, um levante popular conhecido como Maidan, derrubou o governo pró-Rússia e extinguiu as famigeradas forças policiais de repressão, conhecidas como Berkut.

Sem melhoras na situação econômica e cansada da corrupção da oligarquia, no segundo turno, 73% da população votaram em Zelensky para presidência, mas pouco mudou: a oligarquia continuou no comando e Zelensky estava perdendo popularidade, até que teve início a invasão russa.

Frente à invasão de Putin, que queria sua destituição, e pressionado pelo tremendo levante popular, Zelensky decidiu permanecer em Kiev e liderar a resistência, com a perspectiva de defender os interesses da oligarquia ucraniana.

Por isso, aproveitou a invasão russa para acelerar a adesão da Ucrânia à União Europeia, permitiu uma inflação de 50% dos produtos básicos, realizou uma Reforma Trabalhista radical contra os trabalhadores e seu governo, ainda, se envolveu com negociatas, como no caso da empresa de mineração estatal em Novovolínia.

 A ‘esquerda’ mundial: entre o apoio aberto ou disfarçado a Putin

A maioria das forças de esquerda define a invasão como uma “guerra interimperialista”, na qual o povo ucraniano é “agente da OTAN” e sua resistência à invasão não merece qualquer apoio. Por isso, defendem a paz sem exigir a retirada das tropas russas, que hoje dominam 15% do território ucraniano.

Esta visão oculta o fato de que Putin invadiu a Ucrânia para dominar o país e roubar suas riquezas. A classe trabalhadora e o povo ucraniano se levantaram contra esta invasão, numa guerra de libertação nacional que merece o apoio da classe trabalhadora de todo o mundo.

O imperialismo norte-americano não quer derrotar Putin, mas aproveita a invasão da Ucrânia para fortalecer a OTAN e promover uma corrida armamentista que não beneficia a Ucrânia; mas, sim, o complexo industrial-militar norte-americano. Quase nada deste armamento moderno vai para a Ucrânia. Caso uma parte destas armas fosse entregue à Ucrânia, a derrota militar russa já estaria selada.

Washington também aproveita para disputar o mercado europeu de energia, centralizar o imperialismo europeu sob seu comando e mandar uma mensagem para a China, tentando reafirmar que, mesmo decadente, o imperialismo norte-americano segue vivo e forte.

É importante lembrar que a extrema-direita mundial – Trump, Bolsonaro, Orbán, Marine Le Pen (França), Salvini (Itália), Netanyahu (Israel), Modi (ìndia), dentre outros – também apoia Putin, direta ou indiretamente.

Brasil

Bolsonaro e Lula negaram apoio à Ucrânia

Vera Lúcia, do PSTU, participou da manifestação chamada pela comunidade ucraniana e pela oposição russa em frente ao consulado russo, em São Paulo. Ela foi a única candidata à presidência da República, em 2022, a se posicionar pela vitória do povo ucraniano contra a agressão militar de Putin. Em sua fala, Vera denunciou a posição do governo brasileiro:

Desde o início da invasão, Bolsonaro e Lula negaram qualquer ajuda, seja militar ou humanitária, à Ucrânia. E aumentaram o comércio com a Rússia. Bolsonaro se identifica com Putin, pois sonha com um mundo cheio de ditaduras. Já Lula tem muitos apoiadores que defendem um mundo multipolar, com os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) frente à hegemonia americana”, lembrou Vera.

Ora, qualquer trabalhador que mora num bairro que tem uma máfia de bandidos deseja o fim da máfia e não a criação de mais duas ou três máfias. Temos que lutar pelo fim do imperialismo e não pela criação de novos imperialismos para massacrar a classe trabalhadora. Por isso, exigimos que Lula mude de posição e apoie a luta do povo ucraniano para se livrar da opressão de Putin, da OTAN ou de quem quer que seja”, concluiu a dirigente do PSTU.

Todo apoio

Pela vitória da resistência ucraniana! Fora Putin! Não à OTAN!

No aniversário de um ano da invasão, a comunidade ucraniana e a oposição russa organizaram manifestações em 120 cidades, de 45 países, mandando um recado de apoio à heróica resistência operária e popular na Ucrânia e, também, para o ditador Putin de que a diáspora russa está sendo organizada em oposição ao seu regime, baseado na oligarquia russa e no Serviço Federal de Segurança (FSB, a ex-KGB).

O PSTU e a Liga Internacional dos Trabalhadores (Quarta Internacional) apoiam as manifestações e as iniciativas de solidariedade operária, como a importante campanha de Ajuda Operária à Ucrânia, organizada pela Rede Sindical Internacional de Solidariedade e Lutas.

Vera em ato de solidariedade à resistência ucraniana
Apoio e solidariedade

Brasileiros na Ucrânia

Uma delegação da CSP-Conlutas, na qual participaram membros do PSTU, integrou os dois comboios de ajuda humanitária, organizados pela Rede Sindical Internacional de Solidariedade e Lutas. O primeiro foi enviado para a cidade de Lviv, em 1º de maio de 2022. O segundo, para a cidade industrial de Kryvyi Rih, a 50 km de distância da frente de batalha, no final de setembro.

Ambos levaram 1,8 toneladas em alimentos, medicamentos e geradores de energia, que foram entregues ao sindicato dos mineiros e metalúrgicos de Kryvyi Rih. Viva a solidariedade operária internacional!