Momento da saída do Riquelme do CDP de Vila Independência (Vl. Prudente)
Israel Luz, de São Paulo (SP)

Pouco mais de cinco meses depois de ser preso injustamente, no dia 13 de dezembro, Riquelme finalmente pôde dormir em casa. O caso do jovem negro, morador da periferia de São Paulo, mostra nitidamente o racismo do Estado burguês, mas também a força da luta das famílias trabalhadoras.

Reconhecido pela voz

Riquelme tem só 18 anos e sonha ser jogador de futebol. Mora no Jd. Elisa Maria, na região da Brasilândia, Zona Norte da capital paulista. No dia 6 de julho, ele voltava para casa quando estranhou que o portão do vizinho estava aberto.

Decidiu avisá-lo e, nesse momento, gritaram de dentro da casa para que entrasse. Em vez do amigo, foi recebido por policiais que realizavam operação contra uma quadrilha envolvida no golpe do falso encontro.

Como ele contou ao sair da prisão, um policial disse para ele falar onde morava. “Eu moro do lado”. Em seguida perguntou: “qual o nome da sua mãe?”. Riquelme também respondeu prontamente: “Viviane”, fato também confirmado na hora já que ela estava em casa.

Mesmo o garoto não estando junto com a quadrilha e tendo dito a verdade sobre o que foi perguntado, a polícia resolveu levá-lo “para averiguação”, o que é ilegal.

Na delegacia, outra irregularidade: a vítima do sequestro disse reconhecê-lo pela voz, sem precisar qual a possível participação efetiva do menino no crime. Isso não existe! Ninguém pode ser identificado desse modo e preso.

Mas foi o que aconteceu. Mesmo com tudo isso, o depoimento citado e a palavra dos PMs André Luís Voltan de Andrade e Willian Arimateia da Silva Germano, bastaram para a promotora do Ministério Público Daniele Volpato Sordi de Carvalho Campos pedir a prisão do Riquelme, aceita prontamente pela juíza Gabriela Marques da Silva Bertoli.

O Estado nunca é ausente quando se trata de perseguir um jovem negro. Ao contrário, age rapidamente mesmo contra suas próprias normas.

Ao sair da prisão, Riquelme falou: “Tô um pouco aliviado de poder sentir o ar da rua. Um pouco aliviado que eu vou comer o almoço da mamãe porque eu não tava conseguindo comer a comida de lá de dentro. Comida muito ruim… tava vindo com pedra, vidro, pedaço de madeira, com a gilete solta. Tava vindo tudo pra prejudicar nós”.

O exemplo de luta da mãe e das irmãs

Um fato muito significativo é que durante todo o tempo a família não se calou. Realizaram um primeiro protesto ainda em julho fechando a Av. Cantídio Sampaio. O ato foi reprimido pela tropa de choque.

Dias mais tarde, junto com o coletivo Brasilândia Nossas Vidas Importam, foram às ruas novamente (foto) para explicar à população o que se passava. Repetindo o que já havia sido feito em 2022 por outras famílias da Brasilândia, buscaram conscientizar as pessoas do que estava acontecendo.

Protesto na Av. Cantídio Sampaio no dia 16 de julho. Foi o segundo ato em defesa de Riquelme

Como diz Rodrigo, militante do PSTU da região, casos como esse infelizmente são muito comuns. “O que não é comum são os protestos no próprio bairro”. Daí a grande importância dessas ações.

Na última Marcha da Periferia, no dia 04/12, Viviane falava para emoção de todos: “Meu filho se encontra preso lá na Vila Prudente, inocente por uma coisa que ele não cometeu, reconhecido por voz. Sendo que meu filho nunca roubou. O sonho do meu filho é ser jogador de futebol”.

A luta não pode parar

Esse tipo de injustiça não acontece nos bairros nobres. Mas aqui na periferia o tratamento é diferente. O Estado e a polícia em tese deveriam proteger, mas basta ser negro e morador da periferia para ser tratado como um criminoso.

O Estado é responsável pelas prisões injustas da juventude negra. Antes de perguntar o nome, de pedir o RG, trata jovem da periferia como criminoso”, como diz Flavia Bischain, professora da região e candidata à vice-governadora pelo PSTU nas últimas eleições.

A luta segue até o Riquelme ser totalmente absolvido. É preciso exigir também reparação do Estado por tudo o que ele e sua família têm passado.  O caminho já sabemos. Vamos unir nossas forças e dizer em alto e bom som: chega de prisões injustas e de criminalização da juventude negra!