Redação
Se a divulgação do vídeo da reunião ministerial determinada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, nesta sexta-feira, 22, não trouxe grandes novidades nas denúncias já realizadas pelo ministro demissionário Sérgio Moro, por outro lado ela expôs as vísceras de um governo genocida, pró-ditadura, que odeia pobre, trabalhador, indígena, determinado a arrasar o meio ambiente e os serviços públicos.
Não que fosse algo que já não soubéssemos. Mas ouvir da própria boca de Bolsonaro e seus ministros, e de forma tão escancarada, causa com certeza maior impacto. É como assistir a uma reunião de gângsteres ou milicianos.
Primeiro, sobre a fala denunciada por Moro que provaria a intenção de Bolsonaro de intervir na Polícia Federal para safar seus filhos e a si próprio. “Não vou esperar foder minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança da ponta de linha que pertence à estrutura”, afirmou Bolsonaro, num trecho já divulgado preventivamente pela própria Advocacia Geral da União (AGU) a fim de mitigar o impacto do vídeo. Fica bastante evidente o que Bolsonaro realmente quis dizer. A versão combinada pelo governo de que Bolsonaro se referia à sua segurança pessoal e não à PF é risível, até porque a primeira coisa que ele fez após a saída de Moro foi justamente trocar o comando da polícia no Rio.
Bolsonaro gastou boa parte do seu tempo esbravejando contra as parcas e insuficientes medidas de quarentena tomadas nos estados e municípios, incluindo as do “bosta” do Doria e do “estrume” do Witzel. Bom lembrar que, no dia da reunião, 22 de abril, o país já se aproximava das 3 mil mortes notificadas. Mas para o governo o problema não eram, como não são hoje, as milhares de mortes que se acumulam, mas a sua defesa e autopreservação, às custas de mais vítimas. Uma postura que não pode ser chamada por outro nome que não de genocida.
O presidente confessou ainda possuir um esquema particular de informação, que mais tarde em entrevista à Jovem Pan, disse ser composto por policiais. O que, no caso, reforça também a denúncia do empresário Paulo Marinho de que teria recebido informações sobre a operação da Polícia Federal que atingiria seu filho, Flávio Bolsonaro, poucos dias após as eleições de 2018. Um modus operandi de organização criminosa, como uma verdadeira milícia.
“Granada no bolso do inimigo”
Outro que não economizou no sincericídio foi o ministro da Economia Paulo Guedes. Mostrando que não passa de um Bolsonaro com PHD, Guedes disse coisas que todos sabiam que ele pensava, mas não imaginavam que fosse capaz de falar em público. “E nessa confusão toda, todo mundo achando que estão distraído, abraçaram com a gente (sic), enrolaram, e nós já botamos a granada no bolso do inimigo: dois anos sem aumento de salário“, disse, referindo-se aos servidores públicos e ao plano de ajuda aos estados com os governadores que impõe congelamento salarial.
Sobre o Banco do Brasil, Guedes não é tão fino. “Tem que vender essa porra logo“, disparou, instando o presidente do BB, Rubem Novaes, a “revelar seu sonho”, ou seja, de que também deseja vender o banco. “Faz assim: só em vinte três cê confessa, agora não“, replicou o presidente, às risadas.
Guedes ainda fez questão de demonstrar seu desprezo ao auxílio-emergencial. “A gente aceita, politicamente, a gente aceita, vamos fazer todo o discurso da desigualdade, vamos gastar mais, precisamos eleger o presidente“, disse. Auxílio que, lembremos, o governo queria que não fosse nem a miséria de R$ 600, mas de R$ 200. Para ele, não é um auxílio para que os pobres, desempregados e informais possam ficar em casa e não morrerem de fome, mas “política para eleger o presidente”.
Como se não fosse o bastante, o ministro da Economia mostrou seu desprezo também às pequenas empresas. “Nós vamos ganhar dinheiro usando recursos públicos pra salvar grandes companhias. Agora, nós vamos perder dinheiro salvando empresas pequenininhas”, declarou. Associações de pequenas e médias empresas, que concentram a maior parte dos empregos no país, protestaram contra a postura de Guedes e lembraram ainda que, em plena pandemia, o governo Bolsonaro reduziu os créditos ao setor, o equivalente a 7 bilhões de dólares no mesmo período do ano passado, para 5 bilhões agora.
Ódio a indígenas e ao meio ambiente
As “pérolas” mais expressivas vieram contra aqueles setores que o governo já expressou seu mais profundo ódio: os indígenas e o meio ambiente. “Odeio o termo ‘povos indígenas’, odeio“, repetiu um raivoso Weintraub. O mais interessante nisso é que ele é justamente a pessoa que mais pode se enrolar na divulgação desse vídeo, porque chamou o STF de bandidos e disse que teriam que ser presos.
Já o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, num outro momento espantoso de sincericídio, disse com todas as palavras que o governo deveria se aproveitar da pandemia para arrasar o meio ambiente. “Enquanto estamos neste momento de tranquilidade no aspecto de cobertura da imprensa, porque só se fala de covid, é ir passando a boiada e mudando todo o regramento“, afirmou, causando uma inusitada expressão de espanto no então ministro Teich que estava ao seu lado.
Fora Bolsonaro e Mourão
A reunião ministerial foi, enfim, um verdadeiro resumo do que é o governo Bolsonaro: um governo genocida, corrupto, miliciano, com um projeto ditatorial, inimigo dos servidores e de tudo o que é público. Tudo dito às claras, sem meio termos.
Se, do ponto de vista jurídico, não é ainda uma “bala de prata” contra o mandato de Bolsonaro, reafirma ainda mais a necessidade urgente de tirá-lo de lá o mais rápido possível. Uma questão de vida ou morte de milhões de pessoas, de trabalhadores e do povo pobre, das populações indígenas e do meio ambiente.