Às vésperas do referendo revogatório de 10 de agosto, a Bolívia fervia com a greve dos mineiros que exigia de Evo o fim do sistema neoliberal de aposentadoria e uma nova lei mais justa. Também houve ataques da direita, que explodiu o carro de um ministro e realizou protestos impedindo a chegada dos presidentes Hugo Chávez e Cristina Kirchner ao país.

Os trabalhadores realizavam uma justa luta reivindicando do governo o cumprimento de uma promessa eleitoral em 2005, mas foram duramente reprimidos pela polícia de Evo Morales. A direita buscava criar um clima de terror dentro do país e assim fortalecer sua campanha de que o governo Evo é o governo do descontrole e da instabilidade. Contra eles, o presidente reagiu chamando o retorno ao diálogo nacional depois do referendo.

Apesar dos grupos de choque fascistas da burguesia, o referendo ocorreu sem violência, talvez pela forte presença de observadores internacionais e da imprensa mundial. Houve um forte comparecimento da população às urnas.

Os resultados
Ainda não terminou a contagem dos votos dos municípios do interior do país, mas o resultado até agora parece ser irreversível, pois já foi apurada a maioria total dos votos. Evo Morales e os quatro prefeitos da região chamada Meia Lua tiveram uma votação superior à da última eleição em 2005.

Evo havia sido eleito com 53,1% dos votos e agora obteve 63,1%. O prefeito da Meia Lua Ruben Costas de Santa Cruz foi eleito com 47,8% e no referendo obteve 66,6%. Mario Cossio, prefeito de Tarija, havia obtido 45,6% e agora 64,5%. Ernesto Suárez, prefeito de Beni, foi eleito com 44,5% e obteve no referendo 61,2%. O prefeito de Pando, Leopoldo Fernández, eleito com 48%, obteve agora 56,3%.

Das nove regiões do país (departamentos ou estados), Evo perdeu em quatro. Em Beni, Santa Cruz e Tarija, regiões da chamada Meia Lua. Em Chuquisaca, região que oficialmente não pertence à Meia Lua, mas que é do mesmo bloco de oposição a Evo Morales, o presidente perdeu por uma margem muito pequena. No ocidente, em La Paz, em Cochabamba, Oruro e Potosí, Evo aumentou a vitória que já havia obtido em 2005.

Foram-se os prefeitos de La Paz e Cochabamba
La Paz é o departamento de maior população da Bolívia. Cochabamba é o terceiro. Ambos, apesar de não pertencerem oficialmente à Meia Lua, eram administrados por prefeitos de direita que vinham se alinhando com a Meia Lua e já falavam em realizar seus referendos autonômicos para seguir o exemplo da região. No entanto, são regiões de forte apoio a Evo e, portanto, seus prefeitos foram fortemente castigados.

No caso de Cochabamba, já em janeiro de 2007 houve uma rebelião popular exigindo a renúncia do prefeito, fato a que se opôs Evo Morales, que pediu a continuidade de seu mandato junto aos setores populares. Desta vez, a região que concentra a maioria dos cocaleiros do país destituiu o prefeito. Isso significa que, quanto a prefeituras, Evo ganhou duas e se manteve em outras duas que já estavam em mãos de seu partido, o MAS. No entanto, segue em minoria no total. Das nove, cinco seguem em mãos da direita (uma delas, Sucre, não teve referendo revogatório porque houve eleição para prefeito recentemente, em que o candidato de Evo perdeu).

O que virá depois do referendo
É preciso avaliar os próximos dias no país para tirar uma conclusão mais acabada do que vai acontecer depois do referendo revogatório. Desde já, é inegável que Evo cresceu, mas também é verdade que a Meia Lua e principalmente a burguesia de Santa Cruz, que encabeça a oposição no país, também cresceu.

A classe trabalhadora, em especial os mineiros que vinham de uma luta que se chocava fortemente com o governo, afastado o fantasma de Evo ser tirado pela direita, pode sentir vontade de retomar as lutas. As direções são decisivas para isso, principalmente a COB, que recentemente resolveu voltar a dar uma trégua de 45 dias ao governo, depois dos dois mineiros mortos pela repressão de Evo.

Também não se pode descartar que se transforme em frustração a expectativa que uma parcela importante de camponeses e operários tinha no referendo – quer dizer, que fosse um instrumento que pudesse mudar a situação de avanço da direita. É que, passado o referendo, novamente Evo Morales e toda a cúpula de seu partido retomam com força a velha toada da necessidade de um pacto nacional com a direita como única forma de pacificar o país. Isso quando a oligarquia boliviana já demonstrou várias vezes que está disposta a tudo para manter seus interesses de classe, inclusive ir a uma guerra civil.

Evo declarou que o passo seguinte será tentar compatibilizar o projeto de nova constituição com os estatutos autonômicos da oligarquia, o que não é aceito por vários setores camponeses e indígenas. Essas declarações comprovam que aumenta o descompasso entre o desejo de importantes setores da classe trabalhadora e dos camponeses de derrotar a direita no país e o papel de Evo de dar-lhe fôlego com sua política de colaboração de classes, típica de um governo burguês de frente popular.

O futuro da Bolívia dependerá do avanço e da capacidade da classe trabalhadora de construir desde suas bases um terceiro campo com total independência frente a Evo e um claro programa de derrotar a burguesia e construir uma saída operária, camponesa e socialista.

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