Redação
Outubro de 1917. O 2° Congresso dos Sovietes está reunido em Petrogrado. Leon Trotsky, líder da Revolução Russa, descreve os delegados: “Rostos rudes, feridos pelo inverno, mãos pesadas e rachadas, dedos amarelados pelo tabaco, botões caindo, cintos frouxos e longas botas rugosas e bolorentas. A nação plebeia, pela primeira vez, enviou uma representação honesta, feita à sua própria imagem e sem retoques”.
Os bolcheviques têm a maioria, 390 do total de 650 delegados, e vota o apoio da classe operária na luta pelo poder. Subitamente, são ouvidos os canhões da batalha decisiva no Palácio de Inverno. Era a insurreição operária que derrubava o Governo Provisório. Lênin, líder dos bolcheviques, sai de seu esconderijo e toma a palavra no Congresso pela primeira vez: “Agora, passemos à edificação da ordem socialista”.
Pela primeira vez na história os debaixo, liderados pela classe operária e organizados nos Sovietes, tomavam o poder e começavam a construir um novo tipo de Estado. A liderança exercida pelo Partido Bolchevique foi essencial. Sem essa direção revolucionária não haveria a Revolução de Outubro. Essa é a primeira lição de uma revolução que completa 105 anos. Outro ensinamento importante é que é possível fazer uma revolução operária e socialista, em aliança com setores oprimidos e pobres da classe trabalhadora. Ou seja, diferente do que nos dizem por aí, os operários podem tomar o poder e fazer uma revolução.
Mesmo sendo minoria na Rússia, a classe operária que tomou o poder liderou uma coalizão que abarcava setores oprimidos, principalmente os camponeses. A classe operária brasileira, para chegar ao poder, terá de liderar outros setores sociais, como os camponeses e as massas desempregadas ou subempregadas. Essa é a terceira lição da Revolução Russa.
A grande transformação
A Revolução de Outubro também provou que uma revolução operária não só é possível como necessária para resolver os gigantescos problemas sociais gerados pelo capitalismo. A Rússia era o mais atrasado país da Europa, mas se transformou em uma potência mundial que se aproximou dos níveis dos EUA em produção. Crescia a taxas duas ou três vezes maiores que as da China capitalista de hoje, mas com um sentido oposto, para resolver problemas sociais nunca resolvidos pelo capitalismo, como o desemprego, que deixou de existir.
Isso porque a expropriação das grandes empresas e a planificação da economia possibilitam produzir para satisfazer as necessidades da população. Sob o capitalismo é diferente, as empresas produzem para conseguir lucros em competição umas com as outras, o que resulta em superexploração, desemprego e miséria. Além disso, os capitalistas produzem aquilo que vai proporcionar mais lucros para eles, e não bens que de fato são úteis a todos seres humanos.
Atualmente, diferente de 1917, a socialização da produção e a alta tecnologia já existente poderia acabar com a fome e a miséria em todo o mundo. Mas para isso é preciso construir o socialismo em escala mundial, colocando toda produção a serviço da humanidade. Por isso, quando os operários tomaram o poder na Rússia, os bolcheviques tinham como obsessão levar a revolução socialista para todo o mundo, principalmente para os países centrais do capitalismo na Europa, como a Alemanha.
Um estado diferente
A revolução aboliu o Estado capitalista, um aparato jurídico-militar que busca defender a propriedade privada e o domínio do capital. Ou seja, uma ditadura da burguesia (da minoria) sobre os operários e oprimidos (a maioria).
Com a Revolução Russa, pela primeira vez na história, a ampla maioria explorada governa e participa da vida política do pais. É o que chamamos de ditadura do proletariado baseado em conselhos populares de operários e camponeses (Sovietes, em russo).
Esse novo Estado é muito mais democrático do que a democracia dos ricos que temos hoje. A ditadura do proletariado se baseia na lógica inversa: na substituição do Congresso burguês por uma rede de conselhos populares, cujos membros são escolhidos nos locais de trabalho e moradia, com mandatos revogáveis a qualquer momento e onde sua remuneração não ultrapassa o salário de um operário qualificado.
Por isso, a ditadura do proletariado, exige uma participação ativa e permanente das grandes massas na vida econômica, política e cultural do país. São os de baixo que definem os rumos da nação, bem diferente da democracia burguesa, onde o povo só é chamado a votar a cada quatro anos em um bando de políticos ladrões financiados pelos capitalistas.
Surgimento do stalinismo
Com o fim da União Soviética, os capitalistas e a grande imprensa repetem à exaustão que o socialismo está morto. Temem que uma nova revolução possa varrê-los do poder e sacudir mundo, como foi em 1917.
No entanto, é preciso discutir o que levou a derrota da Revolução Rússia e o retorno do capitalismo na URSS nos anos 1980.
Após tomarem o poder, os bolcheviques tentaram exportar a revolução socialista para Europa, mas ela foi derrotada pela reação dos capitalistas. Isso deixou a jovem república soviética isolada e tendo que enfrentar a tentativa de invasão organizada pelas potencias capitalistas de então.
Essa situação levou a burocratização da URSS e do partido bolchevique. Começou a surgir uma camada cada vez maior de funcionários oportunistas. Joseph Stalin se apoiou nessas camadas sociais como seu representante e aprofundou a burocratização. Neste momento, lançou a proposta de “socialismo em um só país” como uma forma de assegurar os privilégios que esses setores obtinham. Outro setor do partido, encabeçado por Trotsky, começou seu combate à burocratização do partido e do Estado e em defesa do programa bolchevique.
Stalin precisou implementar uma sangrenta contrarrevolucionário, que assassinou ou encarcerou milhares de dirigentes, quadros e militantes bolcheviques. O último dirigente da revolução assassinado por ele foi Trotsky, morto em 1940 em seu exílio no México por um agente stalinista. O Estado se tornou um aparato burocrático e repressivo que impedia qualquer tipo de democracia para os trabalhadores e o povo.
A burocratização desses estados foi o início de sua própria destruição. Já expulso da URSS, Trotsky já alertava em 1936: ou se produzia uma nova revolução política que, mantendo as bases econômico-sociais do Estado operário, reinstalasse a classe operária no poder e impulsionasse a revolução mundial, ou a burocracia, cedo ou tarde, terminaria conduzindo à restauração capitalista. Lamentavelmente, essa previsão se cumpriu décadas depois e a própria burocracia stalinista encabeçada por Gorbachov restaurou o capitalismo na URSS.
Publicado originalmente em 2016