João Antônio**, 42 anos, é servente (ajudante) de pedreiro da construção civil em Belém. Até o ano passado trabalhou na construção de um grande Shopping Center na
cidade. Estudou até a antiga 5ª série. Como mora em outro município da região
metropolitana da capital paraense, tinha que acordar às 4 horas da manhã para que antes das 5 horas estivesse no ponto de ônibus, pegar duas conduções, se deslocar até o centro de Belém e estar trabalhando às 7 horas. Na obra, sua jornada prolongava-se até as 5 horas da tarde.

Por conta da distância, do pouco número de ônibus e dos engarrafamentos, João Antônio chegava em sua residência entre 8 e 9 horas da noite. Perguntado sobre o que dava para fazer, ele responde: “Nada. Não conseguia nem assistir TV. Só pensava em dormir”. Estudar? “Nem pensar!”

Dada a urgência de término da obra, que era construída dia e noite, em alguns
dias ele tinha que cumprir um turno noturno ou mesmo virar 24 horas trabalhando. “Aí é que eu não conseguia fazer nada mesmo”.

O caso de João Antônio reflete a situação do trabalhador brasileiro. É sugado ao máximo pelos patrões, não restando tempo para o estudo, lazer ou mesmo o convívio com a família. Os patrões se utilizam da baixa escolaridade para pagar salários achatados. Segundo a FIESP, do total de trabalhadores da construção no estado de São Paulo,4.554 eram analfabetos em 2010, 63% tinham no máximo o ensino fundamental.
Resultado: um empregado com nível superior (profissionais da administração,
por exemplo), era contratado recebendo o equivalente a cinco salários de
um analfabeto da categoria e 4,34% de um operário com ensino fundamental
incompleto. Do total de analfabetos no Brasil 16,4% vivem com meio salário
mínimo de renda.

No Pará, segundo o IBGE, 1/3 (um terço) das crianças do município de Melgaço são analfabetas. Entre jovens e adultos este percentual sobe a 37%. Infelizmente, esse não é um caso isolado nem no Pará nem no Brasil. O avô João Antônio era analfabeto
e trabalhador rural. O pai era semianalfabeto e trabalhador autônomo da construção civil. João Antônio tem três filhos. O mais novo começou a estudar somente aos seis anos de idade. O mais velho, de 16 anos, já realiza “bicos” na construção civil e, depois de algumas repetências, tenta concluir o ensino fundamental.

São justamente os jovens que mais sofrem com o desemprego no Brasil, pois 42,2% dos desempregados estão nesta faixa etária. Isso poderia ser um bom indicador se eles estivessem apenas estudando, mas não é o que acontece, pois uma parcela significativa está no mercado informal, nas ruas, em subempregos, trabalhos domésticos ou no crime.

O governo Dilma coloca o pagamento da dívida pública aos especuladores acima dos gastos com saúde, educaçãoe demais áreas sociais juntas. Isso se soma ao fato de que a elevada concentração de renda no Brasil provoca a generalização da pobreza e empurra nossos filhos precocemente para o mercado de trabalho, retirando-os da
sala de aula.

Assim como João Antônio, que pensa em voltar a estudar, nós, socialistas, queremos ter de fato a universalização do direito à educação pública de qualidade em todos os níveis. Reivindicamosmais: o lugar de nossas crianças é na escola. Mas, para isso, é preciso reduzir a jornada de trabalho e pagar salário decente aos trabalhadores, garantindo a sobrevivência digna de toda a família.

Sem isso, enquanto os patrões continuarão enriquecerão cada vez mais, nossas crianças permanecerão sendo empurradas a trabalhar muito cedo para complementar a renda de suas famílias.

A escola primeira colocada no questionável Exame Nacional do Ensino Médio foi o Colégio São Bento do Rio de Janeiro, vinculado à igreja católica. Seus estudantes podem enfrentar qualquer vestibular no país, mas, paraisso, pagam mensalidade de R$ 2 mil,quase quatro vezes o salário líquido de um servente de pedreiro da construção
civil de Belém. A realidade do ensino público brasileiro de 1º e 2º graus gera
uma distorção, onde quem tem dinheiro e pode pagar uma “boa” escola tem muito mais chance de ser aprovado no vestibular. O filho do trabalhador também quer o direito efetivo entrar na universidade pública. De imediato,faz-se necessário ampliar os mecanismos de acesso à população pobre e o elevar o investimento a 10% do PIB para
a educação pública. Ao médio e longo é preciso mudar o perfil da universidade
pública para uma universidade voltada aos trabalhadores.

O acesso à educação pública e de qualidade em todos os níveis deve ser efetivamente um dever do Estado e um direito dos trabalhadores e de seus filhos.

* Operário da Construção Cívil em Belém
Post author Cleber Rabelo, de Belém (PA)
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