Hertz Dias
Membro da Secretaria de Negros do PSTU e vocalista do grupo de rap Gíria Vermelha
O casal Paulo Galo e Géssica Barbosa foi preso em São Paulo sob a acusação de atear fogo na estátua do bandeirante Borba Gato, no dia 24 de julho. Géssica, que sequer esteve no local da ação, encontra-se agora em prisão domiciliar. Galo, principal líder dos entregadores de aplicativos, apresentou-se voluntariamente à polícia, mas, mesmo assim, foi preso. Os dois merecem nossa solidariedade e empenho para libertá-los.
Repúdio legítimo
Achamos legítimo o ódio e o repúdio a todos os monumentos que evocam a memória da classe dominante e que exaltam seus heróis. Afinal, os heróis da classe dominante não passam de assassinos e algozes do nosso povo. Bandeirantes como Borba Gato eram homens brancos que capturavam, escravizavam, estupravam e matavam indígenas no período colonial do Brasil. Não passavam de assassinos inescrupulosos.
As cidades brasileiras estão repletas de monumentos, escolas, praças e ruas homenageando bandeirantes, senhores de escravos, políticos corruptos, militares ditadores e, claro, burgueses. E nada disso é acidental, pois monumentos não são construídos aleatoriamente.
Tomemos o caso de São Paulo. A cidade é atravessada por símbolos em homenagem aos bandeirantes que vão desde rodovias, passando por emissora de TV, estátuas até a sede do governo: o “Palácio dos Bandeirantes”. Nessas homenagens, negros e indígenas são considerados “não cidadãos”.
Segundo o Instituto Pólis, dos 367 monumentos oficiais de São Paulo, apenas nove são referentes a negros e indígenas. Uma das poucas imagens negras é a da “Mãe Preta”, no Largo do Paissandú.
Ao ver as chamas sob os pés de Borba Gato, a burguesia e seus órgãos de imprensa trataram de recriminar o ato, apelando para o velho discurso da preservação do patrimônio brasileiro. Ora, se a burguesia realmente tivesse alguma preocupação com o patrimônio histórico, o galpão da Cinemateca brasileira, localizado em São Paulo, não teria sido incinerado. O prédio abrigava um rico acervo composto por filmes, documentos históricos e objetos. Há anos está abandonado, o descaso do governo Bolsonaro foi total, mas ninguém será preso por isso.
Em Brasília, Sérgio Camargo (que seria um típico capitão-do-mato à época dos bandeirantes) está destruindo a Fundação Palmares, eliminando do seu acervo tudo aquilo que não cabe na caixa ideológica de extrema direita do bolsonarismo. E a justiça burguesa finge não ver isso, pois a depuração é seletiva e racista. E foi ciente dessa “vista grossa” que um bando ligado ao PSL do Rio de Janeiro quebrou a placa em homenagem a Marielle Franco e ainda postou isso nas redes sociais, na certeza da impunidade.
Só com revolução
Acerto de contas com os criminosos heróis da burguesia
Ninguém pode optar entre ver ou não a imagem de 13 metros de Borba Gato ao passar pela Praça Augusto Tortorelo de Araújo, no bairro de Santo Amaro, na capital paulista, muito menos os indígenas e seus descendentes. Para a artista e ativista indígena Jessa Calderón, “ver essa estátua é como se um judeu fosse obrigado a passar todos os dias diante de uma estátua de Hitler”.
Esses crimes não ficaram no passado. Ainda temos por aí alguns “Borba Gatos”, como o genocida Jair Bolsonaro, responsável direto pela morte de 550 mil brasileiros – que sabotou a compra de vacinas e boicota as medidas de prevenção à Covid-19.
Por isso, reafirmamos nossa defesa irrestrita da liberdade imediata de Paulo Galo e Géssica, bem como a retirada de todas as acusações que pesem sobre eles.
Defendemos que as ações contra os monumentos da classe dominante precisam ser desempenhadas pelas massas. Por mais legítimas que possam ser, ações isoladas contra esses monumentos são utilizadas para reprimir e criminalizar ativistas e lideranças populares; intimidá-los, prendê-los ou afastá-los das ruas e da organização da classe; justificar a repressão aos atos e às massas.
Por fim, assim como o atentado a um político burguês conduz à sucessão de outro, a derrubada de uma estátua da classe dominante por ações isoladas das massas, via de regra, conduz ao restabelecimento da mesma estátua ou ao erguimento de novas estátuas de inimigos da nossa classe.
Isso coloca a tarefa para cada ativista de debater junto à classe trabalhadora e ao povo pobre sobre a necessidade de se fazer uma revolução socialista no Brasil e tomar o poder com suas próprias mãos. Pois é derrubando a burguesia que a classe trabalhadora terá condições não só de controlar a produção de riqueza deste país, mas de acertar as contas com todos os monumentos erguidos pela burguesia e erguer os seus próprios.