Entrega do novo arcabouço fiscal ao Congresso Nacional Foto Diogo Zacarias/MF

No último dia 17, Lula, acompanhado dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e da ministra do Planejamento, Simone Tebet, entregou pessoalmente ao Congresso Nacional o texto do novo arcabouço fiscal.

O conjunto de medidas pretende substituir o teto de gastos de Temer por outro mais “flexível”. Por trás de palavras bonitas como “sustentável” ou “responsável”, está um novo teto que, assim como a PEC 95, ou a Lei de Responsabilidade Fiscal de FHC, tem como objetivo restringir ainda mais os gastos públicos para garantir o pagamento dos juros da dívida aos banqueiros.

Se vem sendo chamado de “novo” marco fiscal, o sentido desse conjunto de regras é já bem antigo. Seu ponto principal é o que limita o aumento dos gastos da União em até 70% da arrecadação. Se o governo arrecadar R$ 100 bilhões a mais, poderá aumentar seus gastos em R$ 70 bilhões? Não necessariamente. Isso porque entra um outro limitador: o aumento real dos gastos deve ficar numa estreita faixa entre 0,6% e 2,5%.

Isso praticamente exclui qualquer possibilidade de uma mudança significativa nos serviços públicos, na geração de empregos, em programas sociais como o Bolsa Família, e até no já insuficiente e vergonhoso aumento no salário mínimo. A única coisa que fica de fora no novo teto do governo Lula é o pagamento dos juros da dívida aos banqueiros. Na verdade, o aumento dos gastos pode ficar até menor que o crescimento per capta da população, de 0,7% segundo o IBGE (Instituto Brasileiros de Geografia e Estatística).

Em certos aspectos, o novo teto chega a ser diretamente pior, já que, por exemplo, enfia o BNDES e a Caixa nesse novo marco, algo que nem o teto de Temer fazia.

Ao contrário do que chegam a repetir algumas organizações de esquerda, até críticas ao novo marco, ele não é “menos pior” que o teto, é simplesmente um outro teto, mais crível e projetado a impor um regime de austeridade fiscal a longo prazo e “adaptável” à conjuntura internacional e à submissa economia brasileira. Quando aprovado o teto de Temer, em 2016, poucos achavam realmente que ele se manteria, pois causaria o colapso da própria máquina pública. Tanto que foi reiteradamente furado até se desmoralizar. O teto de Lula, ao contrário, foi desenhado para o longo prazo.

Desvinculações

Arcabouço fiscal coloca Saúde e Educação em cheque

O arcabouço fiscal vem com a promessa da retomada das vinculações constitucionais da Saúde (15%) e da Educação (18%) ao Orçamento da União. O problema é que o limite de crescimento dos gastos totais é de 70% da arrecadação (dentro da faixa de até 2,5% no total). Já a vinculação da Saúde e Educação se dá sobre 100% do Orçamento. Esse desencontro vai provocar a necessidade de se cortar ainda mais das outras áreas, até a inviabilização dessa engrenagem de austeridade.

Na verdade, o próprio Haddad já cantou essa bola, ao defender na apresentação do arcabouço mudanças nessas vinculações. O governo chegou a aventar atrelar esses gastos ao PIB per capta, algo que, se valesse no país hoje, teria tirado 40% da Saúde e Educação desde 1998, segundo projeções.

Só ‘emendas’

Resolução do PSOL não aponta voto contrário ao marco fiscal

O PSOL reuniu sua direção nacional para debater o posicionamento diante do plano de austeridade do governo Lula. O presidente da sigla, Juliano Medeiros, chegou a twittar que “a proposta é muito ruim! Se estivesse valendo desde 2003 o país teria perdido R$ quase 9 trilhões”. Certo, e vão votar contra, então? Não, a resolução aprovada e divulgada junto com a Rede, com a qual formam uma federação, aponta somente a apresentação de emendas.

O deputado Guilherme Boulos, após ter mantido silêncio absoluto sobre o tema, finalmente se pronunciou: “Vários deputados do PT, que é o partido do presidente, têm críticas ao arcabouço. Temos críticas para buscar melhorar os problemas na Câmara, sim. Isso não é incompatível com a composição da base do governo“, afirmou à imprensa. À Folha de S. Paulo, Boulos defendeu somente tirar Saúde e Educação do arcabouço, e manter o restante. “É lógico que você tem que ter um equilíbrio nas contas, mas você precisa compatibilizar esse equilíbrio fiscal com uma responsabilidade social“, defendeu.

Quer dizer, o problema para Boulos não é que o arcabouço fiscal de Haddad seja um regime de austeridade para continuar garantindo bilhões aos banqueiros todos os anos, ao contrário, isso seria “equilíbrio nas contas”. O problema é que precisaria de um pouquinho de “responsabilidade social”. E isso para ele seria tirar Saúde e Educação do arcabouço e continuar do jeito que estamos, com os serviços públicos à míngua.

Não ao teto de Lula e Haddad

É preciso denunciar e lutar contra esse novo teto de gastos, e não desarmar os trabalhadores e dizer que é necessário, apenas com alguns problemas, como faz o PSOL. É necessário ainda acabar com a Lei de Responsabilidade Fiscal e todos os mecanismos que privilegiam os banqueiros em detrimento dos gastos sociais, dos salários e dos empregos. Pela suspensão da dívida aos banqueiros, aumento das verbas da Saúde, Educação e demais serviços públicos. Duplicação do salário mínimo já, rumo ao mínimo do Dieese.