LIT-QI

Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional

PST-Peru

Uma canalhice ordinária: somente assim pode ser qualificado o indulto concedido pelo presidente Pedro Pablo Kuczynski (PPK) ao ex-ditador Alberto Fujimori a poucas horas da celebração do Natal.

Assim, agora temos um presidente corrupto que, apesar de ter mentido até o fim para esconder seus negócios milionários com a Odebrecht, não foi afastado pelo Congresso, e um ex-ditador preso por crimes contra a humanidade que foi libertado. Uma total afronta a todos, desde os familiares das vítimas do genocídio do ex-ditador até os trabalhadores e pobres que sofrem as consequências de um plano econômico que só beneficia os capitalistas.

Em um ano e meio de governo, a partir da cúpula da CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru) e da “esquerda” no parlamento agitou-se o discurso de que PPK era o “mal menor” diante da ameaça fujimorista com maioria no Congresso, e com este discurso não só não organizaram nenhuma luta como também traíram as que ocorreram, inclusive a maior de todas: a greve dos professores.

A realidade mostrou que, apesar dos ataques mútuos entre o governo e a maioria do Congresso, havia acordos de fundo, principalmente acordos na continuidade da política de ajuste aos trabalhadores. Apesar disso, essa “esquerda”, e especificamente o Nuevo Perú de Verónika Mendoza, apoiou PPK até o cúmulo de livrá-lo do impeachment com seus10 votos no parlamento, permitindo que ele decretasse o indulto, e não só isso, mas também “enviando flores” ao fujimorismo convidando-o à “reconciliação”.

O ódio que sentimos de Fujimori é legítimo. Além de ter sido responsável pela demissão de meio milhão de trabalhadores, também esteve à frente de uma ditadura que cometeu crimes horríveis e assaltou o país, claro, com a anuência dos empresários. Depois de ser deposto e preso, seus herdeiros políticos ganharam simpatia até se transformarem na primeira força política, porque a “democracia” e seus partidos, incluindo a “esquerda” eleitoreira, mostraram-se tão corruptos como ele e mais ineficientes para atender as necessidades de assistência e segurança da população. Mas, na verdade, o que temos hoje é um descrédito em todos, em todo o regime, e uma grande incerteza entre os trabalhadores sobre a saída que necessitamos,  por causa da política dessas direções de apoio a PPK.

Nosso ódio à ditadura jamais pode nos levar a apoiar outros exploradores e ladrões de colarinho branco, como ocorreu no debate sobre o impeachment. As consequências são evidentes.

Ao contrário do que se tentou mostrar nesses dias com o aval desses mesmos setores políticos, PPK não é um velhinho que não sabe o que faz: é mais esperto que todos eles. Em sua defesa, PPK apelou a todas as armas. Para esse setor, ele agitou o fantasma do “golpe de Estado”, lembrando tudo o que a ditadura fez no passado e a ameaça que significa a concentração de poder em uma só força, no caso de seu impeachment. Para isso, ele não teve vergonha de chantagear com a renúncia dos vice-presidentes e com a convocação de eleições. No entanto, o que realmente aconteceu, como se viu ao final, foi um acordo de impunidade entre PPK e um setor do fujimorismo – ou seja, trocar o  impeachment pelo indulto. Por isso, após a votação, até ensaiou uma dancinha, debochando dessa “esquerda”.

No momento da votação, esses setores também se mostraram triunfantes, como PPK, porque eles haviam derrotado – mais uma vez – o fujimorismo, inclusive disseram que este estava dividido. Mas o que vemos agora é uma celebração ardente do fujimorismo, que, ao invés da derrota, conseguiu um duplo triunfo: aparecer como os firmes defensores da luta contra a corrupção e, ao mesmo tempo, obter a liberdade do ex-ditador em troca de dar alguns votos a PPK para salvá-lo do impeachment. É por isso que, após o “acalorado” debate entre “democratas” e “ditadores”, vemos que, de ambas as partes, não só se congratulam como também falam de “reconciliação”.

Agora ninguém assume a responsabilidade por todo este escândalo que significou a não aprovação do impeachment e a liberdade do ex-ditador. Sem a menor vergonha na cara, todos os que apoiaram PPK, desde a cúpula da CGTP até aqueles que o apoiaram com sua abstenção no parlamento, lavam as mãos e o acusam de “traidor”. PPK não é um traidor. Os traidores são aqueles que apoiaram um banqueiro para presidente vestindo-o de “democrata” e “honesto”, e aqueles que o apoiaram até o último minuto, apesar de todas as evidências postas diante de seus olhos de que ele era corrupto e mentiroso, quando o que tinham que fazer era defender a independência política da juventude e dos trabalhadores, para colocá-lo para fora sem culpa nem remorso.

A “reconciliação” da qual se fala agora significa co-governo. Não o co-governo que de fato existiu durante todo esse tempo, mas um no qual PPK, enfraquecido e desacreditado, governe nos braços do fujimorismo. Foi isso que a CONFIEP (Confederação Nacional das Instituições Empresariais Privadas) há tempos vinha reclamando e agora aprova. Isso é o que eles chamam de “governabilidade”. No entanto, essa “reconciliação”, no contexto de caos que tomou conta do Congresso devido às revelações da Lava Jato, onde cada um faz esforços para se salvar e afundar o outro, ao ser aceita por Keiko Fujimori, na verdade é um chamado a um pacto de impunidade mais amplo, para que PPK, Keiko Fujimori e Alan Garcia se salvem das investigações e da prisão, enquanto continuam apoiando o plano econômico que nos mantém na pobreza. Um pacto com pés de barro, porque as evidências chegam todos os dias e são públicas, e a crise que atinge todos eles é tão grave que hoje PPK aparece sustentado no ar.

O impeachment não ocorreu porque a classe trabalhadora e o povo não estiveram nas ruas. Foram às ruas de maneira parcial, através dos grupos que se mobilizaram, mas, ao estarem atravessados pela confusão do “golpe”, não identificaram com clareza o inimigo. Agora que o panorama está claro, ninguém duvida de que PPK é corrupto e co-governa com o fujimorismo, que ele deve sair, junto com o Congresso, e ser submetido a investigações, assim como Keiko e Alan. Que o decreto de indulto ao ex-ditador deve ser revogado e as eleições gerais devem ser convocadas sob novas regras como uma saída imediata para a atual crise. E que os bens da Odebrecht e de todos os corruptos devem ser confiscados, e que todos eles sejam presos.

A mobilização começou no momento em que o decreto foi publicado e, no dia de Natal, milhares de pessoas se mobilizaram pelas ruas do centro de Lima e em todo o país expressando a sua indignação. Temos memória e dignidade. Nós nunca aceitaremos que um ex-ditador assassino e ladrão seja libertado, e que um presidente corrupto e mentiroso continue no comando do país. As mobilizações continuarão nos próximos dias, mostrando que começou uma nova epopeia histórica do povo peruano. O que precisamos agora é que os trabalhadores se coloquem à frente desta luta com uma greve geral para lutar por uma saída de fundo.

A crise é do sistema em seu conjunto e, diante disso, precisamos revogar a Constituição da ditadura, fazer cumprir as recomendações da Comissão da Verdade, nacionalizar os bancos, a grande mineração e o petróleo, gerar empregos dignos e atender as necessidades de educação e saúde do nosso povo. E isso só será possível conquistando um governo dos trabalhadores.

Tradução: Rosangela Botelho