Cyro Garcia, Presidente do PSTU-RJ

A UERJ nunca está completamente fora das notícias. Isso é natural, dado que é uma das maiores referências em universidade pública no país, e como tem algum grau um perfil mais voltado à classe trabalhadora que as demais, vide o pioneirismo na política de cotas raciais, na oferta de cursos noturnos e a quantidade de campi espalhados pelos Estado do RJ, a população em geral se interessa pelo que acontece com a universidade. Com um complexo de saúde que inclui o Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) e a Policlínica Piquet Carneiro (PPC), que são referências no Sistema Único de Saúde (SUS), múltiplos projetos de Extensão e Pesquisa, para além da Graduação e Pós-graduação, algo como 40 mil alunos e em torno de 8 mil trabalhadores (somando professores e técnico-administrativos), seu funcionamento exige uma estrutura maior do que muitas cidades do próprio estado.

No entanto, raramente essas notícias são boas. Todos lembram da crise de 2016/17, em que a Universidade ficou sem recursos até para sua manutenção mínima e chegou às portas de fechar por cauusa de uma política neoliberal corrupta de uma série de governos, culminando com os governos de Cabral e Pezão, presos pelas operações “Lava-Jato” e “Boca do Lobo”. Graças à luta e greve de seus trabalhadores e estudantes, sobreviveu a esse caos deliberadamente produzido pelos governos, fiéis representantes do Capital. Muitos também devem saber que, há cerca de um mês atrás, a Assembleia Legislativa (Alerj) do RJ, presidida por André Ceciliano (PT), aprovou, sob protestos, o novo Regime de Recuperação Fiscal do governo estadual do bolsonarista Cláudio Castro (PL), uma série de leis que impõem um teto de gastos para investimentos públicos e retiram tantos direitos dos servidores e dos serviços que ficou conhecida como “pacote de maldades”, tudo para garantir direito para pagar uma dívida gigantesca e ilegítima com o governo federal.

Portanto, foi uma surpresa quando, logo depois, começaram a surgir várias notícias aparentemente muito positivas sobre a UERJ. Há um novo hospital universitário em Cabo Frio, na região dos Lagos, anúncios de criação de campi em Maricá e no bairro suburbano do Vaz Lobo, na capital, parcerias com prefeituras como Itaguaí e Volta Redonda… além da absorção da Universidade da Zona Oeste (UEZO), localizada em Campo Grande, pela universidade. Também foi anunciado um auxílio-creche para estudantes mães no valor de 900 reais, bem como a distribuição de absorventes às estudantes mulheres. Nada disso é ruim, muito pelo contrário, mas abrem-se uma série de questões que é essencial que debatamos.

Achamos excelente e progressiva a expansão da UERJ pelo estado, mas com quais condições essa expansão se dará? O hospital em Cabo Frio, por exemplo, não tem um único servidor concursado – todos os trabalhadores de lá são ou terceirizados ou, ainda pior, um tipo de contrato ultra-precário conhecido como “projeto”, quebrando a isonomia entre os trabalhadores e o regime estatutário; a UEZO tem apenas 13 funcionários técnicos e cerca de 100 docentes efetivos, além de uma legião de contratados temporários. Se hoje faltam funcionários efetivos de quase todo os perfis (como administrativos, enfermagem e assistentes sociais, para mencionar apenas três) para as diversas Unidades já em funcionamento, serão abertos concursos e feitas convocações em número suficiente para os novos campi? Quais serão as condições de estudo e trabalho nesses locais?

Da mesma forma, achamos progressiva a conquista da histórica pauta do movimento estudantil por creche, agora atendida com um auxílio no valor de 900 reais mensais, bem como a distribuição de absorventes às estudantes, depois do escandaloso veto do governo genocida Bolsonaro para essa pauta. No entanto, não ocorreu em nenhum momento o justo pagamento da insalubridade no valor de 40% sobre o vencimento-base àqueles/as trabalhadores/as que atuam nas Unidades de Saúde e se expuseram presencialmente durante toda a pandemia, para mencionar apenas uma das várias injustiças nesse campo. Há uma seletividade evidente – o que a explica?

A questão mais incômoda, no entanto, é a que trabalhadores e estudantes da UERJ têm perguntado incessantemente nas últimas semanas, sem nenhuma resposta por parte do governo nem da reitoria: de onde vem o dinheiro para tudo isso? Se o Estado tem dinheiro para garantir todas essas expansões e finalmente atender essa parte da pauta estudantil, era mesmo ‘necessário’ aprovar a toque de caixa um pacote de leis tão duro quanto o Regime de Recuperação Fiscal, e ainda usando o argumento de que não haveria dinheiro para pagar sequer salários se não houvesse essa aprovação? E porque é que os principais responsáveis pelo Regime, Cláudio Castro e André Ceciliano, que também privatizaram a CEDAE, a maior, melhor e mais lucrativa empresa de água e esgoto do país, estão andando de braços dados com o reitor Ricardo Lodi em todos os anúncios da universidade? Na semana passada houve inclusive uma cerimônia absurda no principal teatro da UERJ em que Lodi concedeu a medalha de Chanceler para Cláudio Castro e a medalha da Ordem do Mérito Científico José Bonifácio, em seu grau mais elevado, para André Ceciliano. Um verdadeiro tapa na cara dos servidores e da população – não custa lembrar que, durante a aprovação do RRF, Ceciliano disse que não “aceito críticas de servidores públicos, que sequer trabalham”!

Essas e muitas outras questões devem ser pautadas para que a UERJ, grande e importante patrimônio público do estado e referência no país e fora dele, não sirva de instrumento eleitoreiro para manutenção dos mesmos governantes que sempre a atacaram. Nós, do PSTU, queremos que essa expansão seja concretizada com recursos públicos, condições dignas e seguras de trabalho e estudo, e que atenda aos interesses públicos e dos trabalhadores de nosso estado, e não de acordo com o interesse de oportunistas corruptos que, passadas as eleições, irão fazer a universidade voltar a uma condição de abandono e risco. Nos somamos aos trabalhadores e estudantes na defesa de uma UERJ totalmente pública, de qualidade e comprometida com os interesses da classe trabalhadora.