Brasília (DF) 10/04/2023 O vice-presidente Geraldo Alckmin e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante reunião de balanço dos 100 dias de governo. Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Redação

Em seu discurso sobre os 100 dias de governo, Lula reivindicou o novo arcabouço fiscal que dá sequência a um regime de austeridade para priorizar o pagamento da dívida aos banqueiros. “Se tem um governo com expertise para fazer responsabilidade fiscal é o meu, perdi muita gente do PT por causa do superávit primário, alguns foram até para o PSB, outros para o PSTU“, disse, referindo-se ao seu primeiro mandato.

O slogan escolhido pela nova gestão tenta passar a ideia de que estamos voltando a uma época em que as coisas supostamente eram boas, ou não tão ruins. Mas, primeiro, será mesmo que o “Brasil voltou”? Segundo, e se voltasse aos tempos do boom das commodities, com medidas compensatórias para os muito pobres e arrocho, retirada de direitos e precarização sobre os remediados para enriquecer os grandes do agro, dos bancos e empreiteiras? Não chegaria de novo onde chegamos? Com a crise capitalista, veio a nu o processo de recolonização. Sem máscara, apareceram a desindustrialização, o empobrecimento e viu-se que a desigualdade nunca retrocedeu.

O governo Bolsonaro botou o país no modo barbárie explícita e ultraliberal. Mas foram os governos do PSDB e do PT que construíram as bases sociais e as decepções políticas que permitiram o surgimento do bolsonarismo.

Os 100 dias de governo Lula, inclusive no que parece acenar aos trabalhadores ou à soberania, esteve a serviço centralmente de pavimentar o caminho para o arcabouço fiscal, de buscar a conciliação para a preservação das cúpulas das Forças Armadas e de garantir, nas relações com a China, EUA e União Europeia, preservar os interesses da classe dominante brasileira submissa ao imperialismo.

Em lugar de um projeto da classe trabalhadora que se apoie em sua mobilização para enfrentar os 1% de capitalistas internacionais e nacionais, o governo de conciliação de classes de Lula se apoia na democracia dos ricos, em Lira, Pacheco, nacos do centrão, e promete governar para todos. Mas não é possível fazer omelete sem quebrar ovos. Os 100 dias de Lula apontam para um social liberalismo, um neoliberalismo com renda mínima.

O programa e as alianças de Lula e do PT se propõem a gerenciar o capitalismo em crise, em conciliação com a burguesia e o imperialismo. Por isso colocamos a necessidade de se construir um projeto da classe trabalhadora para o país, que não esteja atrelado a um projeto da burguesia porque, senão, as mudanças profundas que são necessárias não vão ocorrer. E sem essas mudanças o nosso país seguirá cada vez mais subalterno e decadente, mais pobre e a classe trabalhadora mais precarizada e arrochada. E esses três meses comprovam isso.

A derrota eleitoral de Bolsonaro e também o fracasso da sua tentativa golpista foram sentidas como um alívio por grande parte da classe trabalhadora e os setores mais oprimidos. E é compreensível que tirar Bolsonaro gere alívio, expectativas, esperança e ilusões.

A esperança de que se detenha a entrega do país e as privatizações, de que se revoguem as reformas trabalhista e previdenciária, o Novo Ensino Médio, de que não se dê, mais uma vez, anistia a golpista, tendem a ficar pelo caminho porque não vão caber no figurino do novo arcabouço. Nem mesmo a defesa dos povos indígenas, de negros e negras e das mulheres.

Independência de classe

A tarefa colocada para a classe trabalhadora é a de construir um campo de classe, que possa  fortalecer um projeto seu para o país, que enfrente os capitalistas e o imperialismo e possa efetivamente derrotar também o bolsonarismo.

Lula disse em seu discurso dos 100 dias: “a ultraesquerda presta um papel fundamental, porque tudo o que eles dizem, você não vai fazer, mas eles te impedem que você vá muito à direita“. Na verdade, o papel que a esquerda que está no governo cumpre é o de reforçar as ilusões e impedir que ocorram mobilizações que se enfrentem com esse projeto do governo, com a burguesia e com a extrema direita.

Os trabalhadores precisam exigir de suas organizações que tenham independência política do governo e da burguesia, e que atuem para organizar a classe em defesa de suas reivindicações.

Um programa dos trabalhadores

Precisamos ir à luta para exigir de Lula a revogação por completo da reforma trabalhista, e da Previdência e do novo ensino médio. Exigir emprego com a redução da jornada para 30h semanais, sem redução dos salários. Exigir a duplicação do salário mínimo, tendo como meta o salário mínimo pelo Dieese em 6.571,52 hoje.

Exigir que se detenham todas as privatizações, reestatizando  as estatais entregues, começando pela Eletrobrás, Vale e Petrobras, sob o controle dos trabalhadores. Estatize a Avibras, importante fábrica de defesa que está prestes a ser entregue ao capital estrangeiro.

Para fazer isso o caminho é oposto ao do arcabouço fiscal, que é a manutenção do edifício neoliberal. É necessário acabar com a suposta independência do Banco Central, suspender o pagamento da dívida aos banqueiros, baixar os juros, estatizar o sistema financeiro e acabar com todos os subsídios e isenções bilionárias às grandes empresas e multinacionais.

Esse é também o caminho mais seguro para derrotar o bolsonarismo: com mobilização, auto-defesa e independência de classe. Não com anistia para golpista, aliança com a burguesia e arcabouço fiscal neoliberal. Fazer agora, por exemplo, uma paralisação nacional contra a violência nas escolas, exigindo investigação e prisão dos que ameaçam na internet e, junto com isso, organizar em assembleias a autodefesa com brigadas eleitas por pais, alunos, professores e funcionários, e exigindo dos governos que as financiem.

Esse é o caminho para criarmos as condições para que nós trabalhadores construamos um governo nosso, sem capitalistas, apoiado em conselhos populares.