A presidente do Brasil, Dilma Rousseff, visitou a China por cinco dias, em sua primeira viagem ao exterior para além da América Latina. Um dos dias foi utilizado para participação na reunião de cúpula dos BRIC´s, em Sanya, uma ilha situada no litoral sul chinês. Como ressaltou a imprensa mundial, foi uma “viagem de negócios” onde os aspectos políticos ficaram em segundo plano. Não foi outro o motivo de ter levado, em sua delegação, 250 empresários em busca de novos negócios.

Os resultados, no entanto, foram modestos em ambos os aspectos. De concreto, a permissão para exportação de carne de porco pelo Brasil, sem especificação do volume, e a autorização para a fabricação e venda de aviões da Embraer, que já tem uma fábrica montada na China, com a compra d e35 aeronaves E190 por empresas de aviação chinesas.

A busca da “arca do tesouro” chinesa – sua enorme reserva cambial – para investimentos no Brasil resultou numa comemorada promessa de instalação de uma nova fábrica da Foxconn no interior de São Paulo e em contratos entre a Sinopec, estatal de petróleo chinesa, e a Petrobras e da estatal de energia com a Eletrobras. Além disso, anúncios de investimentos por algumas empresas, mas basicamente para acompanhar o crescimento da economia brasileira.

A política das aparências
Os comunicados dos dois presidentes, Dilma pelo Brasil e Hu Jintao pela China, tradicionais neste tipo de encontro, nunca revelam os acordos reais realizados. Estes ficam em segredo, como os oito acordos de cooperação, entre eles um sobre Defesa, cujos teores não foram divulgados.

Mas o comunicado chinês frustrou a expectativa do governo brasileiro de ganhar mais um aliado em sua pretensão de tornar-se um membro permanente no Conselho de Segurança da ONU. Pequim limitou-se a apoiar “a aspiração brasileira de vir a desempenhar papel mais proeminente nas Nações Unidas”. Somada à declaração parecida de Obama no Brasil, esta é a segunda derrota da diplomacia brasileira.

A China faz parte do Conselho de Segurança, mas seu ingresso se deu quando ainda era um Estado Operário e era preciso levar a política de “coexistência pacífica” entre o imperialismo e a burocracia soviética – de divisão do mundo em esferas de influência – para a própria ONU. Atualmente parece não haver lugar para novos “emergentes” entre as potências nucleares mundiais.

Os comunicados tampouco citaram as violações dos direitos humanos realizadas pelos dois países: centenas de presos políticos na China e condições subumanas nas prisões brasileiras. Mas foi ressaltado o fato dos dois países terem retirado da linha de pobreza milhões de pessoas, esquecendo-se, vergonhosamente, do salário mínimo vigente nos dois países – R$ 540,00 no Brasil e cerca de R$ 200,00 na China. Ou das condições de trabalho nas grandes obras do PAC no Brasil e nas minas de carvão chinesas, onde morrem centenas de trabalhadores todos os anos por falta de segurança no trabalho.

Para os capitalistas e seus representantes, isso pouco importa, ou melhor, importa muito, pois é dessa superexploração que retiram seus lucros e transformam seus países em eternos “emergentes”, sem nunca saírem da condição de semicolônias do imperialismo. É por isso que tais fatos nunca são mencionados em seus comunicados conjuntos.

Mais empregos ou mais exploração?
A maior sensação da viagem foi o anúncio da Foxconn de investir US$ 12 bilhões em cinco anos para construir uma “cidade inteligente” com 100 mil “habitantes” onde seriam fabricadas telas de cristal líquido e outros componentes de computadores. Trata-se do modelo adotado na cidade de Shenzhen, onde vivem mais de 150 mil trabalhadores em regime praticamente fechado, recebendo o salário mínimo regional, com jornadas de trabalho que podem chegar a 16 horas diárias e recentes denúncias de envenenamento por n-hexano, substância manipulada pelos operários para a limpeza de… telas de cristal líquido.

Foi aí que 10 operários cometeram suicídio no início de 2010, motivando Terry Gou, dono do Grupo Foxconn, a anunciar o fechamento da fábrica e sua transferência para o interior do país, onde o salário mínimo é ainda menor.

Foi o mesmo Terry Gou que afirmou, segundo os sites do Wall Street Journal e do Finantial Times, que “os salários no Brasil são altos” e que os operários brasileiros “param de trabalhar assim que ouvem futebol” e que, mais do que “levar uma fábrica à perfeição, é ainda melhor em extrair incentivos de governos”.

Esta afirmação vem bem ao gosto do governo brasileiro, que gosta de incentivar os “empreendedores”, como são chamados os capitalistas na China, com vultosos empréstimos do BNDES, a baixíssimos juros, e incentivos fiscais de todos os tipos. Mas o mais apropriado é dizer que a verdadeira especialidade de Terry Gou é superexplorar os trabalhadores, de qualquer nacionalidade.

Mas não é sua exclusividade. Numa pesquisa da China Labour Watch, uma organização de direitos humanos, em 46 fábricas onde trabalham 92 mil trabalhadores, concluiu-se que em 88% das fábricas não havia representação sindical efetiva; em 87% delas as horas extras diárias excediam 3 horas ou não havia garantia de descanso semanal – as horas extras excediam 100 horas mensais e em algumas fábricas, 200 horas; e 83 % não pagavam salários conforme a legislação, em relação ao salário mínimo e às horas extras.

Estes são os patrões que o governo Dilma está procurando para investir no Brasil. Esta é a aposta dos capitalistas brasileiros para um rebaixamento geral dos salários e direitos trabalhistas no Brasil.

Esta também é a vontade da burocracia sindical instalada na CUT, a julgar pelas declarações de Sérgio Nobre, presidente do Sindicato de Metalúrgicos de São Bernardo do Campo. O sindicalista afirmou ao jornal Valor Econômico que “se ficarmos presos à CLT, travaremos uma série de avanços que são fundamentais para os trabalhadores e para as empresas” , e defende que o negociado entre patrões e trabalhadores prevaleça sobre o legislado pela CLT. Como avanço, para as empresas, significa aumento dos lucros, uma medida deste tipo abriria as portas a todos os tipos de violações trabalhistas. Bem ao gosto dos capitalistas chineses. Ao que parece, com a ajuda da CUT, Terry Gou não terá mais motivos para dizer que os salários no Brasil são altos.