Desde o início da semana, policiais militares e soldados do exército mantém um esquema de guerra, cercando o terreno, revistando e agredindo moradores e invadindo suas casasNa noite de domingo, dia 8, bandidos roubaram sete fuzis no 6º Batalhão do Exército, em Caçapava, no Vale do Paraíba. A resposta dos militares e da autoridade foi a de sempre. Ocuparam uma favela na cidade e mantêm um cerco sobre três bairros pobres de São José dos Campos, a 20 km dali. Entre eles, o acampamento do Pinheirinho, na Zona Sul da cidade, com mais de duas mil famílias.

O tratamento dado aos moradores é o mesmo que a polícia dispensa a população pobre e negra. Pé na porta, gritos, tapas e empurrões. O clima entre os moradores é de pavor. No início da tarde de segunda-feira, oito caminhões do Exército chegaram na comunidade, levando cerca de 90 soldados. Armados, com fuzis, o grupo percorria as ruas da ocupação com motos e revistava todos que entravam e saíam. No alto, dois helicópteros sobrevoavam a área, e um deles voava mais baixa, com rasantes sobre os moradores. Do lado de fora, a Polícia Militar dava cobertura a operação.

Policiais militares já tinham feito uma grande blitz na Zona Sul da cidade na sexta-feira anterior, dia 6, e percorreram o Pinheirinho. Cerca de 100 policiais espalharam o medo pelas ruas de terra e pouco iluminadas do Pinheirinho. Após quatro horas, foram embora, sem explicação.

Já os militares não deixaram o local. Na segunda-feira, invadiram casas e agrediram um senhor dentro de sua própria casa. Desde então, mantiveram o cerco e a intolerância, não respeitando crianças, mulheres e idosos. A revista ostensiva não respeitava as mochilas das crianças, que iam para a escola. O clima era de guerra e todos eram tratados como bandidos. “Eu fui revistado 27 vezes em um mesmo dia. 22 dentro do Pinheirinho e 5 nas ruas próximas. E muitas vezes, eram os mesmos soldados que tinham acabado de parar meu carro”, disse Marrom, uma das lideranças da ocupação e do MUST (Movimento Urbano de Trabalhadores Sem-teto).

O terror continuou nos dias seguintes. Na terça-feira, além do cerco e ações militares, os moradores assistiram a uma “invasão” do Garra, grupo especial da Polícia. Segundo testemunhas, a operação aconteceu a pedido da imprensa, já que as TVs da região não haviam filmado os invasores em ação. Assim, atendendo a pedidos, os homens fardados invadiram casas, abriram portas, revistaram moradores, desrespeitando todos os direitos daquela população.

Na quarta-feira, os soldados do exército começaram o dia com ações ainda mais agressivas. Os helicópteros passaram a sobrevoar cada vez mais baixo, a ponto de um dos rasantes retirar a cobertura de uma casa. O ataque tirou os moradores da cama, às 5h da manhã, e durou até às 8h. Depois disso, se retiraram.

Após dezenas de incursões e de um cerco permanente, nada foi achado. A criminalização feita pelo exército não funcionou. Nenhum fuzil ou arma foi encontrado. Como prova do “perigo” representado pelos moradores, policiais afirmam terem encontrado três “miguelitos”, uma solda com pregos e pedaços de metal, usados para furar pneus. Estas foram as armas encontradas.

Abaixo a criminalização! Fora as tropas do Pinheirinho!
A operação militar trata os trabalhadores e o movimento sem-teto como bandidos. Essa é a resposta clássica da burguesia e de seus aparatos de repressão, criados para reprimir os debaixo. Foi assim no Rio de Janeiro, em 2006, quando 10 fuzis do exército foram roubados. Na ocasião, com o apoio do prefeito César Maia, os militares ocuparam diversos morros do Rio, desrespeitando os moradores e provocando a morte de ao menos um jovem, de 16 anos. Após vários dias, os fuzis apareceram milagrosamente, e a imprensa trouxe entrevistas mostrando o acordo feito entre os militares e os líderes do tráfico, para cessar a ocupação.

A ocupação do Pinheirinho fez com que Marrom recordasse do Haiti, país que visitou em 2007, com uma caravana da Conlutas. “Cheguei no Pinheirinho e vi todos aqueles homens fardados. Imediatamente me veio a lembrança do que vimos no Haiti. De como os soldados tratam os negros haitianos, nas favelas da capital”.

Assim como fazem no Haiti, o os soldados brasileiros tratam a população pobre e negra como inimigos de guerra. A operação causou a reação dos moradores, de grande parte da cidade. As lideranças visitaram as rádios, denunciando o que estava acontecendo e exigindo a saída das tropas. E os moradores, que comemoraram há duas semanas os cinco anos da ocupação, mantêm-se mobilizados, já que, a qualquer momento, uma nova incursão pode ocorrer.