Em uma tentativa de conseguir mais poder para derrotar as intensas mobilizações contra seu governo, o presidente boliviano pede a renúncia do cargo na manhã desta segunda-feira, 7 de marçoUma nova onda de protestos e bloqueios se generaliza nas cidades e estradas da Bolívia. A pressão contra a política neoliberal de Carlos Mesa ocorre principalmente a partir da cidade de El Alto, que iniciou uma greve geral por tempo indeterminado pela expulsão da transnacional Aguas de Illimani, que controla o fornecimento de água na região. Além dessa luta pela estatização da água, por todos os cantos do país há protestos, bloqueios e greves de fome pela estatização de outras áreas que se encontram nas mãos de transnacionais, como os recursos energéticos. A defesa dos recursos naturais e energéticos do país se traduz também na luta contra a implementação Alca, já que o governo de Mesa permanece negociando o tratado. Outras reivindicações mais imediatas se somam à defesa dos recursos nacionais, como a criação de empregos, reajustes de salários e a melhoria nas condições de vida da população. Diversas categorias protagonizam as manifestações, tais como operários, professores, sapateiros, jornalistas, petroleiros, camponeses, produtores de coca e desempregados.

Diante das crescentes mobilizações, o presidente Carlos Mesa fez um discurso emocionado de mais de 40 minutos na televisão, dizendo-se pressionado por “minorias radicais” e que não poderia seguir governando “em respeito aos cidadãos bolivianos”. Ele entregou na manhã deste dia 7 ao Congresso sua carta de renúncia. O Congresso deve se reunir amanhã para definir se aceita ou não o pedido de renúncia. Se for aprovado, a previsão é que o presidente do Senado, Hormando Vaca Diez, assuma a presidência.

Dessa maneira, Mesa jogou a culpa pela crise boliviana nas costas do povo. A declaração que ele fez no dia anterior surtiu alguns efeitos, pois logo em seguida, alguns setores de classes médias e altas foram às praças de La Paz declarar seu apoio ao governo.

Um ano e meio de discursos manipuladores
Carlos Mesa chegou ao poder após a queda de Gonzalo Sanchez de Lozada, com a eclosão de protestos nacionais pelas mesmas reivindicações que mobilizam atualmente a população. Mesa era vice de Lozada e assumiu provocando uma certa esperança no povo boliviano e fazendo promessas de mudar a situação de entrega do país. Na época, ele sustentava um índice de 80% de popularidade.

Durante alguns meses, houve um período de trégua concedida pelo povo à Mesa, postura essa que foi encabeçada pelas direções do movimento. Porém, o discurso não sustentou a trégua por muito tempo, pois o mesmo plano neoliberal continuou sendo aplicado no país. A prova maior disso é que, após 17 meses de governo, as atuais manifestações nada mais são do que a continuidade de outubro de 2003.

Repressão
Uma das promessas feitas por Carlos Mesa ao assumir era a de que não usaria as forças armadas para reprimir manifestações populares. Durante os protestos ocorridos até então não houve uma política de reprimir os atos, apesar de o governo não atender às reivindicações e permanecer defendendo as transnacionais do petróleo e da água.

Entretanto, as mobilizações dessas últimas duas semanas têm sido duramente reprimidas, com a polícia do governo usando desde gás lacrimogêneo até tiros contra a população. Tal postura indignou ainda mais os trabalhadores e fez com que as greves de fome e protestos se intensificassem.

Como se isso não bastasse, o presidente usou esse argumento em seu discurso emocionado na televisão, ao anunciar sua renúncia. Ele afirmou que, como já havia se comprometido com o povo, não vai “usar as Forças Armadas nem a polícia para desbloquear” e que “aqui não haverá mortos”. É mais uma mentira que se soma aos 17 meses de seu governo enganador.

Saídas para a crise
O governo de Carlos Mesa apenas comprovou que as saídas institucionais que surgem para tentar resolver os problemas de um país devastado pela política neoliberal não surtem efeitos. Os mesmos problemas permanecem e se agravam, as negociações da Alca prosseguem e as condições da população trabalhadora e desempregada pioram.

Após 17 meses de uma solução forjada por dentro da democracia burguesa, a Bolívia vê seus problemas agravados e se levanta novamente para lutar em defesa da soberania nacional, de emprego e salário.

As lições são claras. Não adianta o presidente renunciar e assumir em seu lugar um outro neoliberal. Não adianta criar uma saída institucional para enganar mais uma vez o povo. Para resolver a crise, é preciso levar a cabo a revolução boliviana e que os trabalhadores tomem em suas mãos o poder do país.