Foto: Alexandre Carvalho/Maquina CW
PSTU-SP

Camilo Martin

A situação na Linha 15 – Prata do Metrô de São Paulo segue caótica. Após mais de uma semana de paralisação do Monotrilho, não existe resposta, muito menos um processo de apuração transparente sobre o que gerou o estouro do pneu de um dos trens, causando graves riscos à população e aos metroviários que trabalham no sistema. Com isso, dezenas de milhares de trabalhadores e trabalhadoras tiveram suas vidas afetadas sendo obrigados a ingressar em filas quilométricas e ônibus lotados da operação PAESE, aumentando o tempo de viagem e diminuindo o seu descanso e lazer. Um completo absurdo que reflete o descaso do governo e das grandes empresas privadas responsáveis por este projeto.

Recorde de falhas

Segundo levantamento, a Linha 15 é a linha que mais tem falhas entre todas as linhas do Metrô de São Paulo. No mês de janeiro, em apenas 76,4% do tempo esta linha teve funcionamento normal, ou seja, 1h em cada 4h teve funcionamento atípico, com problemas. Quem depende do transporte público – e não de helicópteros ou carros oficiais, como governantes e executivos – sabem bem o que significa isso em sua rotina…

Abaixo listamos alguns dos problemas que acompanham a curta vida desta linha e que já causaram grande transtorno à população:

1º de janeiro de 2020: Problema em equipamento de via – fingerplate – causou transtornos para os passageiros por cinco dias consecutivos, devido à restrição de utilização de parte das vigas de operação dos trens.

15 de maio de 2019: Uma das composições se deslocou em um equipamento de mudança de via no pátio Oratório.

29 de janeiro de 2019: No final da noite do dia 29 de janeiro de 2019, duas composições bateram na região da estação Jardim Planalto, na Zona Leste da capital paulista. Ninguém se feriu gravemente. A estação não recebia passageiros.

Uma escolha equivocada para beneficiar as grandes empresas

Esta situação caótica que se arrasta é resultado da opção por um modal que não responde as necessidades colocadas para esta região. Em todo mundo, monotrilho é utilizado para média capacidade e curtas distâncias, indicado para, no máximo, interligar modais de maior capacidade como trens de superfície e metrô. Em 40 dos 50 monotrilhos existentes no mundo, eles são utilizados para interligar áreas turísticas, parques e aeroportos. A linha 15 – Prata (São Matheus até Vila Prudente), entretanto, corta uma das regiões com maior densidade populacional da cidade de São Paulo. Seu projeto inicial, inclusive, se estende de Cidade Tiradentes até Ipiranga, ampliando a expectativa da demanda de passageiros.

Além da Linha 15, a única com monotrilho em operação, ainda existe o projeto da linha 17 – Ouro (Congonhas/Morumbi) e existia o da Linha 18 – Bronze (São Bernardo do Campo/Tamanduateí), recentemente substituído pelo sistema BRT e que também não deve ser capaz de atender a demanda prevista. No caso da Linha 15, a realidade, independentemente de qualquer previsão, deu seu veredito e muito antes de sua conclusão já se mostra saturada.

Já na década de 60, estudo realizado pela HMD (Hochtief-Montreal-Deconsult) projetou demandas a partir da pesquisa “Origem Destino” e levou a prefeitura de São Paulo e da região metropolitana a descartar o Monotrilho como alternativa. Se em 1966 isso era previsível, no fim dos anos 2000, época da opção pelo projeto, isso era muito mais evidente. O especialista inglês em planejamento urbano Lloyd Wright afirmou, em estudo que é referência no setor, que “em vez de iniciar uma nova era de transporte público rápido e limpo, sua história tem sido a de corredores limitados, que se mostram financeiramente insustentáveis”. O exemplo de Seattle materializa essa afirmação. O projeto de monotrilho Linha Verde naquela cidade, aprovado em referendo popular em 1997, foi revogado pela mesma população após os gastos saltarem de US$1,3 bilhões previstos para US$9 bilhões.

Não bastasse a incapacidade para sustentar a demanda prevista, somam-se dois problemas graves. Por um lado, se amplia a dependência do Metrô da tecnologia das empresas privadas já que a adesão a este modal é acompanhada de peças e equipamentos fornecidos exclusivamente pela Bombardier e Michelin, um verdadeiro monopólio que encarece gastos com manutenção e treinamento.

Mais grave ainda é que a Bombardier, empresa canadense responsável por parte do projeto, não tinha a tecnologia para construir um produto que respondesse a demanda prevista que era de 48 mil passageiros por hora/sentido (segundo capacidade projetada inicialmente) e que será facilmente superada. Na realidade, a população da Zona Leste de São Paulo se tornou o laboratório de um monotrilho que a fabricante não possuía e que se aproveitou do aparato técnico do Metrô para viabilizar e desenvolver, tudo isso com o aval do Estado sob comando tucano. Neste caso, socializam-se os custos e privatiza-se o lucro…

Capitalismo é o mundo invertido: ajuste fiscal nos trabalhadores, libera geral para as grandes empresas

Os governos do PSDB prometeram que o monotrilho seria mais rápido e barato. Na prática, não houve nem uma coisa nem outra, justo o contrário. Todas as linhas estão muito atrasadas (deveriam estar operando em 2014). No caso dos gastos, a situação é mais dramática, com exceção da Linha 18 que sequer saiu do papel, tanto a Linha 15 quanto a 17 já estouraram em muito o custo inicial previsto. A primeira ultrapassou os R$ 7 bilhões, superando em mais de R$5 bilhões o gasto inicial de R$2,4 bi, a linha 17, até 2016 já havia saltado de R$ 2,9 bi para R$5,5 bi. Esta tragédia anunciada, alertada por especialistas e pelo próprio Sindicato dos Metroviários, joga luz nas motivações do governo para optar pelo monotrilho. Fica claro que a escolha do projeto operado pelo PSDB se pautou somente pelos interesses privados das grandes empresas.

Os grandes beneficiados foram os participantes do Consórcio Expresso Monotrilho Leste (CEML), Bombardier – há pouco tempo condenada por formação de cartel com diversas outras multinacionais – e as empreiteiras OAS e Queiroz Galvão, velhas conhecidas nos escândalos de corrupção nos mais diferentes governos. Fica evidente mais uma vez o gerenciamento do governo para utilizar a máquina do Estado capitalista para abastecer aos bilhões estas grandes empresas. Dessa forma, seguindo a cartilha das várias formas de privatização, o governo turbina setor privado com dinheiro público, superando muitas vezes os gastos originais previstos e depois cobram a fatura na busca por financiamento de suas campanhas. Um verdadeiro toma lá, da cá!

Ontem e hoje fica claro o caráter de classe das políticas de todos governos de plantão. Para os trabalhadores é ajuste fiscal, para as empresas é um verdadeiro libera geral, uma injeção de ânimo em forma de capital ou entrega do patrimônio nacional, seja por meio de “parcerias” como construção da Linha 15, 17 e 6 nos governos PSDB e nos projetos de infraestrutura do PAC, seja nas chamadas “concessões” (a mesma privatização de sempre) dos portos, aeroportos nos governos do PT e na linha 4 do Metrô de São Paulo, seja no pacotão de privatização das estatais propostos por Bolsonaro e Guedes. Um crime contra a nossa classe.

De certa forma, o caos na Linha 15 do monotrilho é um retrato da situação de um país cada vez mais dependente e explorado. Para o trabalhador a realidade é de caos com insegurança, destruição dos serviços públicos e um dia a dia de tragédias como Brumadinho, enchentes e epidemias. Enquanto isso, ao invés de serem responsabilizadas, as empresas como a Vale e a Bombardier, já condenada por cartel, seguem lucrando e saqueando o país com a ajuda do Estado capitalista.

Abre a caixa preta: Investigação transparente! Prisão e confisco dos bens das empresas responsáveis! A população trabalhadora e os metroviários merecem respeito, qualidade e segurança!

Já se passaram dias desde a paralisação da Linha 15 e o governo e o consórcio são incapazes de dar qualquer tipo de explicação sobre o ocorrido. Os noticiários estão inundados com palavras vazias, frases ocas e evasivas. O problema ocorrido na semana passada é de interesse público. Colocou a vida de milhares de passageiros e metroviários em risco. No entanto, não há divulgação de qualquer informação consistente e inclusive metroviários e seu sindicato são impedidos de entrarem nos blocos de manutenção do Pátio Oratório onde estão sendo feita as apurações.

Como seria de esperar, a maior preocupação demonstrada pelo governo e as empresas do consórcio é garantir uma justificativa plausível para os crimes que cometeram. Foram bilhões de dinheiro público entregue para um projeto falido em sua concepção e que sequer é capaz de funcionar com segurança. Pedidos de desculpas do Secretário Alexandre Baldy se mostram palavras ao vento quando se nega a fazer a constatação pública da inviabilidade deste projeto de monotrilho, e quando diz bravatas como “cobrar o consórcio com os gastos do PAESE”. É o cinismo de quem joga para a platéia, já que é evidente que os gastos com o PAESE nestes dias não chegam próximos dos lucros multibilionários recebidos por estas empresas.

É preciso transparência nas investigações. É necessário a formação de uma comissão de apuração independente custeada pelo consórcio CEML e que seja formada por associações populares dos moradores envolvidos, movimentos sociais e o Sindicato dos Metroviários e de um plano de transporte de emergência para atender a população que está sofrendo com está situação. Além disso, é preciso imediatamente responsabilizar criminalmente os quadros das diversas gestões tucanas, executivos do Metrô e executivos das empresas do consórcio. Mas principalmente, é preciso ressarcir a população a partir do confisco dos bens das empresas que compõe o consórcio CEML. A população trabalhadora de São Paulo não pode arcar com o prejuízo de uma escolha que visou apenas o lucro. Confiscar os bens destas empresas para investir em uma empresa de trens estatal controlada pelos trabalhadores e que desenvolva tecnologia e em um plano integrado de transporte de qualidade e seguro a serviço da população trabalhadora. Que eles paguem a fatura desta vez!

– Plano emergencial de transporte para atender a população afetada

– Abertura da caixa preta! Transparência na apuração do acidente do monotrilho

– Comissão independente para acompanhar a apuração formada por passageiros, associação de moradores, movimentos sociais e sindicato dos Metroviários de São Paulo

– Punição dos executivos do Metrô, das empresas do consórcio e dos políticos responsáveis pelos projetos dos monotrilhos

– Confisco de bens das empresas para ressarcir os prejuízos gerados pelo monotrilho e para investimento em transporte público de qualidade e seguro

– Criação de uma empresa estatal controlada por trabalhadores e a população para produção de tecnologia que desenvolva um sistema de transporte adequados as nossas necessidades