Foto MST
Redação

Na inauguração de sua live “Conversa com o Presidente”, nesta terça-feira, 13, Lula disse que “não precisa mais invadir terra”, referindo-se aos movimentos de luta pela terra e reforma agrária. Não bastasse ser uma fala absurda, ela se deu justamente num momento em que há uma guerra no campo, contra os movimentos de luta pela terra, camponeses pobres, quilombola e indígenas, perpetrada pelo agronegócio e grileiros, diretamente ou por seus testas de ferro.

Parte dessa ofensiva é a própria CPI do MST, imposta pela bancada ruralista para criminalizar o movimento e legitimar as perseguições contra todos os lutadores no campo.

Eu disse para o Paulo Teixeira (ministro do Desenvolvimento Agrário) esses dias: não precisa mais invadir terra“, afirmou Lula. Para ele, o Incra identificaria as propriedades improdutivas, e a partir disso, o governo discutiria a sua ocupação. E continuou: “É simples, não precisa ter barulho, não precisa ter guerra“.

Para além de atribuir o “barulho” e a “guerra” no campo aos sem-terra, e não ao agronegócio que mata, persegue e expulsa camponeses, indígenas, ribeirinhos e quilombolas, Lula deixa de explicar o seguinte: se é tão fácil fazer a reforma agrária, por que, em 14 anos em que o PT esteve à frente do Governo Federal, ela ainda não foi feita? Pelo contrário, nesse período a violência no campo só aumentou, com o avanço do agronegócio contra os sem-terra e o meio ambiente.

Lula repete o que fez lá atrás, antes de sua primeira eleição, quando disse que faria a reforma agrária “numa canetada”. Agora, diz: não “invadam” terras, deixem com o governo que está tudo certo. O problema é que, assim como nesses quatro mandatos de PT não houve reforma agrária, dependendo desse governo e de sua aliança com o agronegócio, incluindo aí a bancada ruralista, nada vai mudar.

E por que Lula não vai fazer a reforma agrária? Porque o seu projeto não comporta o fim do latifúndio e a distribuição de terra a quem precisa. Foi justamente nos seus dois primeiros mandatos que o Brasil deu um salto no processo de reprimarizarização da economia, privilegiando o grande agronegócio e, submisso ao projeto do imperialismo, tornando o país um grande exportador de commodities, em especial as agropecuárias, sob demanda do mercado internacional. Foi uma tendência que se iniciou nos governos Lula e se aprofundou nos seguintes.

Quem não se lembra daquela frase de Lula de que os latifundiários eram os verdadeiros “herois”? O projeto capitalista do governo, submisso à divisão mundial imperialista do trabalho, não rompe com o agronegócio e leva à continuidade do processo de recolonização do país. Foi assim lá atrás, e é assim agora. Recentemente, Lula anunciou a disponibilização de R$ 7,6 bilhões em linhas de crédito ao setor.

E qual o problema disso? Esse projeto leva o Brasil a ser cada vez mais um mero exportador de produtos de baixo valor agregado. É isso o que faz com que o país decaia um degrau a mais na cadeia de produção global, e torne-se ainda mais submisso e produzindo cada vez mais, enquanto 33 milhões de brasileiros passam fome. Significa recolonização, retrocesso e submissão, incluindo a perda da soberania, já que o agronegócio hoje é dominado por um reduzido número de grandes monopólios estrangeiros que, por sua vez, controlam a produção, a distribuição, o comércio e até mesmo o mercado de fertilizantes.

O agronegócio brasileiro é controlado por um capital cada vez mais concentrado em poucos monopólios internacionais que, além de destruírem o meio ambiente, avançarem sobre as terras públicas e impedirem a reforma agrária, ainda ameaçam a nossa segurança alimentar. Além de envenenarem nossos pratos com agrotóxicos, controlam os preços, especulam e remetem bilhões em dividendos para fora.

Tirem as mãos dos sem-terra

Hoje, é tarefa fundamental defender o MST e demais movimentos de luta pela terra contra a criminalização e a ofensiva promovida pelo agronegócio e a ultradireita. Mas é preciso também chamar a atenção que a cooptação da direção do movimento pelo governo também é um entrave à luta pela terra.

Ao contrário do que apregoa a extrema direita, os governos do PT, em geral, não promovem as ocupações de terra, mas o inverso. Durante o governo Lula nos anos 2000, o MST, por exemplo, chegou a realizar um congresso em que decidiu parar de ocupar terras, até então sua principal tática de luta que o tornou internacionalmente reconhecido. Cooptação que forçou diversos rachas com setores que viam a necessidade de se continuar lutando e ocupando áreas improdutivas.

Atacar o latifúndio: reforma e revolução agrária

Não é possível lutar, de forma coerente, pela reforma agrária ao lado de um governo que atua com e para o agronegócio. Inclusive ocupando cargos nesse mesmo governo, como o MST. O dirigente do MST, João Pedro Stédile, inclusive, já elogiou o atual ministro da Agricultura, o ruralista Carlos Fávaro. “Acho que ele é um homem sério, que quer uma agricultura para resolver os problemas do povo”, disse Stédile sobre o ministro, que já se declarou, inclusive, favorável ao famigerado marco temporal.

É necessário ter independência política para se lutar por reforma agrária porque isso, necessariamente, vai de encontro aos interesses do agronegócio, e ao próprio projeto de país que o PT tem.

O Brasil hoje, para ser soberano, precisa enfrentar o agronegócio, nacionalizar e estatizar, sob controle dos trabalhadores do campo e da cidade, essas megas propriedades, empresas e rede de comércio e, junto com isso, fazer também reforma agrária.

As ocupações de terra, assim como as greves e manifestações de ruas, são métodos de luta legítimas e necessárias. Mas é preciso ainda um projeto que mude radicalmente o Brasil, e isso é contraditório em apoiar um governo aliado ao agro. É preciso construir uma oposição de esquerda, socialista, que lute contra a criminalização dos movimentos, pela reforma e a revolução agrária. E que não só impulsione as ocupações, mas a autodefesa no campo para enfrentar os ruralistas, seus jagunços e também a ultradireita bolsonarista.

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